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Crítica

Annahstasia

: "Tether"

Ano: 2025

Selo: Drink Sum Wtr

Gênero: Soul, Folk

Para quem gosta de: Moses Sumney e Kara Jackson

Ouça: Villain, Slow e Believer

8.6
8.6

Annahstasia: “Tether”

Ano: 2025

Selo: Drink Sum Wtr

Gênero: Soul, Folk

Para quem gosta de: Moses Sumney e Kara Jackson

Ouça: Villain, Slow e Believer

/ Por: Cleber Facchi 27/06/2025

Décadas de exploração da imagem negra e imposições da indústria da música sobre o que pode um artista preto talvez levem o ouvinte a imaginar Tether (2025, Drink Sum Wtr) como mais um trabalho de R&B, mas o que Annahstasia propõe no primeiro registro de estúdio transcende gêneros. Como a fotografia de capa logo aponta, com a cantora no centro da tela, a musicista californiana é o objeto central da própria criação.

Feito para ser absorvido aos poucos, sem pressa, como uma manifestação da própria trajetória artística de Annahstasia, Tether é um desses discos que mais ocultam do que necessariamente parecem revelar. Como indicado na própria composição de abertura, a cantora passeia em meio a paisagens minimalistas de fino acabamento acústico, proposta que remete à Kara Jackson, porém, preservando a essência da californiana.

A questão é que isso é apenas uma mostra das possibilidades exploradas por Annahstasia em estúdio. Em Villain, por exemplo, o que se revela como um folk econômico aos poucos se converte em um misto de neo-soul e gospel de acabamento transcendental. Já em Beliver, escolhida para o fechamento do trabalho, são as guitarras ruidosas que falam mais alto, soando como uma canção perdida do Big Thief ou Angel Olsen.

É como se cada nova faixa levasse o trabalho de Annahstasia para um campo diferente, proposta que, em nenhum momento, corrompe a unidade do disco. Acompanhada de nomes experientes como Jason Lader (ANOHNI, Frank Ocean), Andrew Lappin (Cassandra Jenkins, L’Rain) e Aaron Liao (Liv.e, Moses Sumney), a cantora californiana sabe exatamente onde quer chegar, mesmo quando estreita laços com outros artistas.

Convidado a assumir parte dos versos em Slow, o nigeriano Obongjayar deixa de lado a habitual relação com o rap para complementar a artista. Já em All Is. Will Be. As It Was, é a poetisa Aja Monet que aparece para engrandecer a base minimalista da canção. Nada que diminua o impacto de canções assumidas por Annahstasia de maneira integral, como em Overflow, com ares de composição perdida de Tracy Chapman.

Ainda que Tether não traga grandes inovações formais e pareça repousar em estruturas já exploradas por outros artistas, especialmente em discos como My Back Was a Bridge for You to Cross (2023), de ANOHNI and the Johnsons, há um magnetismo silencioso que sustenta o primeiro álbum de Annahstasia. Mesmo nos momentos em que o minimalismo quase camufla a verdadeira potência da musicista, existe algo que pulsa.

Dessa forma, o que falta em reinvenção sobra em entrega emocional, e é justamente essa vulnerabilidade sincera, por vezes brutal e avassaladora, que faz de Tether uma obra digna de atenção. Annahstasia talvez ainda não tenha reescrito as regras, mas deixa claro que está mais interessada em reafirmar sua existência com firmeza e beleza do que em atender a expectativas externas, sejam elas artísticas ou mesmo raciais.

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Jornalista, criador do Música Instantânea e integrante do podcast Vamos Falar Sobre Música. Já passou por diferentes publicações de Editora Abril, foi editor de Cultura e Entretenimento no Huffington Post Brasil, colaborou com a Folha de S. Paulo e trabalhou com Brand Experience e Creative Copywriter em marcas como Itaú e QuintoAndar. Pai do Pudim, “ataca de DJ” nas horas vagas e adora ganhar discos de vinil de presente.

Jornalista, criador do Música Instantânea e integrante do podcast Vamos Falar Sobre Música. Já passou por diferentes publicações de Editora Abril, foi editor de Cultura e Entretenimento no Huffington Post Brasil, colaborou com a Folha de S. Paulo e trabalhou com Brand Experience e Creative Copywriter em marcas como Itaú e QuintoAndar. Pai do Pudim, “ataca de DJ” nas horas vagas e adora ganhar discos de vinil de presente.