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Crítica

Arca

: "KiCk iii"

Ano: 2021

Selo: XL

Gênero: Experimental, Pop, Eletrônica

Para quem gosta de: SOPHIE, Lotic e Björk

Ouça: Incendio, Fiera e Electra Rex

8.2
8.2

Arca: “KiCk iii”

Ano: 2021

Selo: XL

Gênero: Experimental, Pop, Eletrônica

Para quem gosta de: SOPHIE, Lotic e Björk

Ouça: Incendio, Fiera e Electra Rex

/ Por: Cleber Facchi 08/12/2021

Terceiro capítulo da série iniciada no último ano, KiCk iii (2021, XL) mostra a capacidade de Arca em transformar caos em música. E isso fica bastante evidente na introdutória Bruja. São pouco menos de quatro minutos em que a produtora, cantora e compositora venezuelana lida com a fragmentação dos elementos. Ruídos e quebras bruscas que se completam pelo uso torto das vozes. Um misto de canto e rima que ganha ainda mais destaque na canção seguinte, a já conhecida Incendio, composição que sintetiza o que há de mais inventivo e delirante no material que tem sido produzido pela artista nascida em Caracas.

Esse mesmo direcionamento frenético fica ainda mais evidente na composição seguinte, Morbo. São fragmentos de vozes, ruídos e pequenas sobreposições sintéticas que apontam diretamente para o material apresentado nos primeiros trabalhos da artista, Xen (2014) e Mutant (2015). Nada que Fiera, minutos à frente, não dê conta de potencializar. Inaugurada em meio a sintetizadores carregados de efeitos e batidas sempre irregulares, a faixa encanta pela capacidade da artista em tensionar os próprios limites, percepção reforçada no hyperpop de Skullqueen, música que soa como um encontro entre SOPHIE e Aphex Twin.

É justamente essa capacidade de Arca em alternar entre momentos de maior experimentação e faixas deliciosamente acessíveis que torna a experiência de ouvir o trabalho tão satisfatória. Perfeita representação desse resultado acontece Electra Rex. Da construção das batidas ao uso metálico das vozes, tudo parece pensado para seduzir o ouvinte, ainda que de maneira torta. Mesmo quando se entrega à completa corrupção dos elementos, como em Ripples, há sempre um componente de imediata conexão. São vozes cíclicas e retalhos eletrônicos que parecem pensados para grudar em uma primeira audição.

Exemplo disso acontece em Rubberneck, música em que utiliza da repetição das palavras como um precioso componente rítmico. “Meta bem, meta suavemente, meta com força, meta“, canta. Observado atentamente, KiCk iii talvez seja o trabalho em que Arca mais investe na construção dos versos desde o homônimo álbum de 2017. Ainda que isso fique bastante explícito na já citada Incendio, composição que potencializa a formação das rimas, o mesmo tratamento acaba se refletindo em outros momentos ao longo da obra, como na bilíngue Señorita e My 2, faixa que evidencia a completa versatilidade da artista.

E isso pode ser percebido mesmo nos poucos momentos em que o trabalho desacelera. É o caso de Intimate Flesh. Livre da urgência que consome o restante da obra, Arca investe na construção de uma faixa que encanta pelos detalhes. São incontáveis camadas de sintetizadores, texturas e ambientações que parecem envolver o ouvinte lentamente. Mesmo a letra da canção, sempre sensível, potencializa o lado intimista da cantora. “Não sei o que fazer / Estou me sentindo tão quente de dentro para fora / Eu tendo a torcer e gritar“, detalha em meio a fragmentos eletrônicos que se conectam diretamente ao versos.

O mesmo refinamento criativo e entrega no processo de composição acaba se refletindo na música de encerramento, Joya. Por vezes íntima do material apresentado em Utopia (2017),último álbum de Björk, a canção ganha forma em meio a sintetizadores enevoados, batidas calculadas e vozes cuidadosamente trabalhados por Arca. É como se passada a ambientação caótica que orienta parte expressiva da obra, a artista venezuelana mergulhasse em um território de doce acolhimento, estrutura que não apenas garante um fechamento delicado ao disco, como ainda serve de passagem para o capítulo seguinte da série.

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Jornalista, criador do Música Instantânea e integrante do podcast Vamos Falar Sobre Música. Já passou por diferentes publicações de Editora Abril, foi editor de Cultura e Entretenimento no Huffington Post Brasil, colaborou com a Folha de S. Paulo e trabalhou com Brand Experience e Creative Copywriter em marcas como Itaú e QuintoAndar. Pai do Pudim, “ataca de DJ” nas horas vagas e adora ganhar discos de vinil de presente.

Jornalista, criador do Música Instantânea e integrante do podcast Vamos Falar Sobre Música. Já passou por diferentes publicações de Editora Abril, foi editor de Cultura e Entretenimento no Huffington Post Brasil, colaborou com a Folha de S. Paulo e trabalhou com Brand Experience e Creative Copywriter em marcas como Itaú e QuintoAndar. Pai do Pudim, “ataca de DJ” nas horas vagas e adora ganhar discos de vinil de presente.