Image
Crítica

Arca

: "@@@@@"

Ano: 2020

Selo: XL Recordings

Gênero: Experimental, Eletrônica, Art Pop

Para quem gosta de: Oneohtrix Point Never e SOPHIE

Ouça: Chipilina, Predator e Recursion

8.0
8.0

Arca: “@@@@@”

Ano: 2020

Selo: XL Recordings

Gênero: Experimental, Eletrônica, Art Pop

Para quem gosta de: Oneohtrix Point Never e SOPHIE

Ouça: Chipilina, Predator e Recursion

/ Por: Cleber Facchi 27/02/2020

Com o lançamento do terceiro álbum de estúdio e a busca por uma sonoridade minimamente aprazível, conceito reforçado em músicas como Desafío e Sin Rumbo, Alejandra Ghersi, a Arca, passou a dialogar com uma parcela ainda maior do público. Mesmo o encontro com Björk, em Utopia (2017), e Kelela, em Take Me Apart (2017), contribuíram para esse novo direcionamento estético, indicativo do completo desejo da cantora, compositora e produtora venezuelana em se reinventar dentro de estúdio. Entretanto, o que muita gente talvez já tenha esquecido, é que antes de trilhar um caminho marcado pela leveza dos elementos, foi a propositada ruptura criativa que apresentou e fortaleceu o trabalho da artista.

Interessante perceber em @@@@@ (2020, XL Recordings), mais recente criação da produtora venezuelana, um propositado regresso a esse mesmo ambiente criativo. Entregue ao público como uma extensa composição de 62 minutos de duração, a faixa nada mais é do que um compilado delirante de tudo aquilo que Arca tem produzido desde a apresentação do homônimo álbum apresentado há três anos. Retalhes instrumentais, ruídos e vozes trabalhadas de forma inexata, estrutura que orienta a experiência do ouvinte até o último instante da obra.

Livre do caráter homogêneo que marca os antecessores Xen (2014) e Mutant (2015), @@@@@, como o próprio título indica, estabelece um curioso resgate conceitual de tudo aquilo que apresentou o trabalho da artista nos improvisos de &&&&& (2013). São 30 faixas, muitas delas incapazes de dialogar musicalmente, em que a produtora venezuelana parece testar os próprios limites dentro de estúdio. Exemplo disso está na sequência de abertura do álbum, formada por Diva, Construct e Turner. Pouco mais de cinco minutos em que Arca vai da inserção de melodias atmosféricas ao uso de abstrações metálicas, proposta que faz lembrar do som incorporado por Tim Hecker, no ainda recente Konoyo (2018).

É partindo desse mesmo direcionamento que a artista venezuelana orienta a experiência do ouvinte até o último instante do álbum, na curtinha X, com seus três segundos de duração. Trata-se de uma obra concebida a partir da criativa sobreposição de ideias, como esboços conceituais espalhados sem ordem aparente. Perfeita representação desse resultado está em Recursion, sexta composição do disco. São vozes trabalhadas de forma instrumental, torta, conceito que se reflete na forma como Arca parece brincar com a desconstrução dos elementos, acrescentando sintetizadores e maquiagens eletrônicas que refletem o que há de mais insano na obra da produtora.

Mesmo dentro desse cenário marcado pela colisão das ideias, interessante perceber em Dysphoria, Form e Travesti a passagem para o lado mais contemplativo da obra. Instante sem que Arca utiliza do próprio processo de transição de gênero como estímulo para a composição das melodias e fragmentos de vozes que se revelam ao público de forma parcialmente contida. São batidas e ambientações etéreas que preservam a essência diminuta do material apresentado no disco anterior, porém, resgatam o mesmo experimentalismo que embala o trabalho da venezuelana desde a entrega de &&&&&.

Com base nessa estrutura, @@@@@ encanta não somente pela forma como Arca assume diferentes identidades criativas no decorrer da obra, mas, principalmente, pelo esmero da artista na composição de cada fragmento do registro, mesmo as mais inofensivas. São canções marcadas pelo mais completo delírio, refúgios conceituais e instantes em que a artista venezuelana utiliza das próprias vivências como estímulo para a composição dos elementos. Um precioso exercício de criação que vai da força das batidas ao uso calculado da voz, do minimalismo das fórmulas eletrônicas às imagens cíclicas que Frederik Heyman apresenta como complemento direto ao trabalho.



Jornalista, criador do Música Instantânea e integrante do podcast Vamos Falar Sobre Música. Já passou por diferentes publicações de Editora Abril, foi editor de Cultura e Entretenimento no Huffington Post Brasil, colaborou com a Folha de S. Paulo e trabalhou com Brand Experience e Creative Copywriter em marcas como Itaú e QuintoAndar. Pai do Pudim, “ataca de DJ” nas horas vagas e adora ganhar discos de vinil de presente.

Jornalista, criador do Música Instantânea e integrante do podcast Vamos Falar Sobre Música. Já passou por diferentes publicações de Editora Abril, foi editor de Cultura e Entretenimento no Huffington Post Brasil, colaborou com a Folha de S. Paulo e trabalhou com Brand Experience e Creative Copywriter em marcas como Itaú e QuintoAndar. Pai do Pudim, “ataca de DJ” nas horas vagas e adora ganhar discos de vinil de presente.