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Crítica

Armand Hammer

: "We Buy Diabetic Test Strips"

Ano: 2023

Selo: Backwoodz Studioz / Fat Possum

Gênero: Hip-Hop, Rap, Experimental

Para quem gosta de: MF DOOM e JPEGMAFIA

Ouça: The Gods Must Be Crazy e Trauma Mic

8.0
8.0

Armand Hammer: “We Buy Diabetic Test Strips”

Ano: 2023

Selo: Backwoodz Studioz / Fat Possum

Gênero: Hip-Hop, Rap, Experimental

Para quem gosta de: MF DOOM e JPEGMAFIA

Ouça: The Gods Must Be Crazy e Trauma Mic

/ Por: Cleber Facchi 19/10/2023

Em um universo regido por regras próprias, Billy Woods e Elucid fazem de We Buy Diabetic Test Strips (2023, Backwoodz Studioz / Fat Possum), novo álbum como Armand Hammer, um campo totalmente aberto às possibilidades. Entre fragmentos de batidas e bases incorporadas de maneira retorcida, cada nova composição sustenta nos versos um ambiente marcado pela decadência mortal. São personagens esquecidos pelo sistema, narrativas urbanas e conflitos pessoais que ganham forma em um cenário tão perturbador quanto estranhamente atrativo, típico das criações assinadas em conjunto pelos dois artistas.

Não, eu ainda não vi o fundo / Arraste o chicote em seu pescoço / Euforia, efeito colateral do bumerangue / Estou mentindo como se fosse apenas um homem“, rima Elucid na já conhecida Woke Up And Asked Siri How I’m Gonna Die, música que sintetiza parte do lirismo atormentado que serve de sustento ao disco. São desconcertantes fluxos de pensamento e inquietações transformadas em músicas. Canções que partem de observações mundanas, porém, crescem a partir da combinação de ideias e experiências compartilhadas pela dupla, conceito que tem sido incorporado desde a formação do projeto, no início da década passada.

Entretanto, diferente do material entregue em trabalhos como Race Music (2013), primeiro registro da parceria entre os dois artistas, We Buy Diabetic Test Strips começa e termina da mesma maneira: livre de possíveis respostas. São composições que mudam de direção bruscamente, fazem citações a nomes como Harry Belafonte, tratam sobre mulheres brancas “interpolando Beyoncé” e assumem percursos sempre imprevisíveis. É como uma interpretação ainda mais insana e abstrata de tudo aquilo que a dupla havia testado em alguns de seus lançamentos mais recentes, como Paraffin (2018) e o provocativo Haram (2021).

Ainda que parte desse resultado venha diretamente da colaboração entre os dois artistas, We Buy Diabetic Test Strips utiliza de uma abordagem pouco usual justamente por servir de passagem para a chegada de diferentes nomes da cena norte-americana conhecidos pelo experimentalismo de suas criações. Completa pela participação de Junglepussy e Money Nicca, Y’all Can’t Stand Right Here funciona como uma boa representação desse resultado. São pouco mais de três minutos em que o ouvinte é arremessado de um canto a outro da canção que se espalha de forma irregular em meio a retalhos de batidas, bases e vozes.

Claro que essa convulsão poética e instrumental nunca foge ao controle da dupla. São experimentações conscientes que naturalmente destacam o domínio criativo de Woods e Elucid em relação ao próprio trabalho. Perfeita representação desse resultado pode ser percebida em Trauma Mic, composição que parte de uma base espancada, por vezes íntima do mesmo som industrial do Death Grips, porém, carrega nos versos uma importante reflexão sobre fé e genocídio negro. O mesmo controle pode ser percebido em The Gods Must Be Crazy, brilhante criação que se completa pela produção sempre caprichada de EL-P.

Toda essa confluência de ideias, diferentes ritmos, produtores e vozes resulta no que talvez seja o disco mais diverso já produzido por Armand Hammer. Enquanto Woods e Elucid assumem a função de guiar a narrativa construída dentro de cada canção, nomes como JPEGMAFIA, Moor Mother e Pink Siifu surgem e desaparecem durante toda a execução da obra, jogando com a interpretação do ouvinte. Composições marcadas pela permanente corrupção dos elementos, conceito reforçado no próprio esquema detalhado no título do material, mas que acaba se refletindo em cada mínimo fragmento poético e sonoro do registro.

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Jornalista, criador do Música Instantânea e integrante do podcast Vamos Falar Sobre Música. Já passou por diferentes publicações de Editora Abril, foi editor de Cultura e Entretenimento no Huffington Post Brasil, colaborou com a Folha de S. Paulo e trabalhou com Brand Experience e Creative Copywriter em marcas como Itaú e QuintoAndar. Pai do Pudim, “ataca de DJ” nas horas vagas e adora ganhar discos de vinil de presente.

Jornalista, criador do Música Instantânea e integrante do podcast Vamos Falar Sobre Música. Já passou por diferentes publicações de Editora Abril, foi editor de Cultura e Entretenimento no Huffington Post Brasil, colaborou com a Folha de S. Paulo e trabalhou com Brand Experience e Creative Copywriter em marcas como Itaú e QuintoAndar. Pai do Pudim, “ataca de DJ” nas horas vagas e adora ganhar discos de vinil de presente.