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Crítica

Brian Eno

: "FOREVERANDEVERNOMORE"

Ano: 2022

Selo: UMO / Verve

Gênero: Experimental, Art Pop

Para quem gosta de: John Cale e David Bowie

Ouça: We Let It In e There Were Bells

8.0
8.0

Brian Eno: “ForEverAndEverNoMore”

Ano: 2022

Selo: UMO / Verve

Gênero: Experimental, Art Pop

Para quem gosta de: John Cale e David Bowie

Ouça: We Let It In e There Were Bells

/ Por: Cleber Facchi 01/11/2022

A última vez que ouvimos a voz de Brian Eno em estúdio foi há 17 anos, durante o lançamento do álbum Another Day on Earth (2005). De lá pra cá, sempre que precisou expressar suas inquietações, o cantor, compositor e produtor britânico utilizou de colaboradores como o músico norte-americano David Byrne e o poeta britânico Rick Holland. Entretanto, ao mergulhar nas canções de FOREVERANDEVERNOMORE (2022, UMO / Verve), Eno não apenas rompe com o próprio silêncio, como potencializa o uso dos vocais. É como um instrumento complementar que assume diferentes rumos e formatações nas mão do artista inglês.

Primeiro trabalho de Eno em carreira solo desde o soturno Reflection (2017), o registro de dez faixas utiliza de pequenas observações do artista sobre o ambiente que o cerca para mergulhar em reflexões sobre a nossa sociedade e decadência estimulada pelo capitalismo. A própria composição de abertura, Who Gives a Thought, funciona como uma boa representação desse resultado. Instantes em que o músico parte de nematóides e vagalumes para mergulhar em questionamentos ainda mais profundos. “E quem pensa nos trabalhadores / Os que cavam e aram / Quem solda e colhe e semeia / Quem trança e corta e tritura / Quem divide e junta e venta“, canta em meio a camadas de guitarras, ruídos e bases sintéticas, sempre sufocantes.

É partindo dessa abordagem labiríntica que o músico, mais uma vez acompanhado por Leo Abrahams, Jon Hopkins e Peter Chilvers, orienta a experiência do ouvinte durante toda a execução do trabalho. São canções que começam pequenas, por vezes excessivamente discretas, porém, marcadas pelo constante atravessamento de informações e acréscimos que ampliam os limites da obra. Sexta composição do disco, There Were Bells funciona como uma boa representação desse resultado. Pouco menos de cinco minutos em que o artista vai do canto de pássaros para detalhar camadas de sintetizadores e melodias cósmicas que contrastam com a poesia ambientalista que trata sobre degradação e extinção de diferentes espécies.

De fato, esse talvez seja o trabalho que Eno melhor desenvolve seu pensamento político para além de textos acadêmicos e reflexões publicadas em diferentes veículos de mídia. Observado atentamente, muitas das composições em FOREVERANDEVERNOMORE se articulam como anti-mantras. Canções que funcionam como uma resposta ao público que sempre encontrou nas ambientações sutis e temas contemplativos do artista uma fuga da realidade. Exemplo disso fica bastante evidente em We Let It In, música em que parte de um delicado espaço de meditação para tratar sobre aquecimento global e a força devastadora do Sol.

E Eno não está sozinho nessa empreitada. Durante toda a execução do trabalho, diferentes parceiros surgem e desaparecem de forma a amplificar os temas levantados pelo artista. Além do já citado time de instrumentistas e co-produtores que há mais de uma década interferem criativamente em suas obras, vozes ocasionais brilham em momentos estratégicos do registro. É o caso da irlandesa Clodagh Simonds, com quem divide These Small Noises, e a japonesa Kyoko Inatome, colaboradora em Making Gardens Out of Silence. A própria filha do músico, Daria Eno, contribui em diversas composições, como em I’m Hardly Me.

Dessa forma, Eno não apenas potencializa o próprio trabalho, como rompe com qualquer traço de conforto evidente em algumas de suas criações mais recentes, caso do colaborativo Mixing Colours (2020), ao lado do irmão, Roger Eno. São canções talvez consumidas pelo inevitável pessimismo dos versos, porém, dotadas de uma beleza rara. É o que acontece na própria música de encerramento, com suas vozes carregadas de efeitos. Composições que rompem com os temas reducionistas dos antigos registros de forma a transportar o som produzido pelo artista para um novo e sempre inusitado território criativo.

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Jornalista, criador do Música Instantânea e integrante do podcast Vamos Falar Sobre Música. Já passou por diferentes publicações de Editora Abril, foi editor de Cultura e Entretenimento no Huffington Post Brasil, colaborou com a Folha de S. Paulo e trabalhou com Brand Experience e Creative Copywriter em marcas como Itaú e QuintoAndar. Pai do Pudim, “ataca de DJ” nas horas vagas e adora ganhar discos de vinil de presente.

Jornalista, criador do Música Instantânea e integrante do podcast Vamos Falar Sobre Música. Já passou por diferentes publicações de Editora Abril, foi editor de Cultura e Entretenimento no Huffington Post Brasil, colaborou com a Folha de S. Paulo e trabalhou com Brand Experience e Creative Copywriter em marcas como Itaú e QuintoAndar. Pai do Pudim, “ataca de DJ” nas horas vagas e adora ganhar discos de vinil de presente.