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Crítica

Bully

: "Lucky For You"

Ano: 2023

Selo: Sub Pop

Gênero: Indie Rock

Para quem gosta de: Soccer Mommy e Charly Bliss

Ouça: Lose You e Days Move Slow

7.8
7.8

Bully: “Lucky For You”

Ano: 2023

Selo: Sub Pop

Gênero: Indie Rock

Para quem gosta de: Soccer Mommy e Charly Bliss

Ouça: Lose You e Days Move Slow

/ Por: Cleber Facchi 12/06/2023

Enquanto se preparava para entrar em estúdio e dar vida a um novo disco de inéditas, Alicia Bognanno teve de lidar com a partida de uma velha companheira: sua cadela Mezzi. “Eu a tive por 13 anos”, disse em entrevista ao site Flood Magazine. “Aprendi mais com ela do que com qualquer outra pessoa. Nós éramos completamente inseparáveis“, revelou a artista. Vem justamente desse doloroso processo de luto e da relação com a morte o estímulo para o repertório de Lucky For You (2023, Sub Pop), quarto álbum da guitarrista como Bully e um exercício de vulnerabilidade emocional que embala a construção dos versos.

Estar aqui de volta me lembra de quando / Eu estava feliz comigo mesma e então / Memórias pesadas afundam“, canta na introdutória All I Do, composição de essência melancólica que busca inspiração em memórias de um passado ainda recente, estímulo para parte expressiva do trabalho. São canções que tratam sobre rompimentos, saudade e a sensação de abandono, conceitos que há tempos orientam as criações de Bognanno em estúdio, mas que ganham novo significado em Lucky For You. Um doloroso exercício de exposição sentimental que conduz a experiência do ouvinte até os minutos finais do álbum.

Tão urgente e intenso quanto qualquer outro trabalho já apresentado por Bognanno, Lucky For You empilha uma sequência de faixas que mais uma vez destacam a força do som produzido pela artista. Em Days Move Slow, são camadas de guitarras e batidas fluidas que apontam para o mesmo território criativo de nomes como The Breeders. Em Change Your Mind, por sua vez, a artista desenvolve tudo em uma medida própria de tempo, costurando momentos de calmaria e caos que se completam pela base ruidosa. Na derradeira All This Noise, um som sujo, quase punk, lembrando as criações mais furiosas do Bikini Kill.

É como se tudo fosse despejado em cima do ouvinte. Uma combinação de vozes berradas e guitarras altamente ruidosas que traduzem as angústias vividas por Bognanno durante o processo de criação do trabalho. Mesmo quando desacelera momentaneamente, como em A Love Profound, tudo é tratado de forma sempre avassaladora e expositiva, potencializando a forte carga emocional do disco. “Eu estive procurando por você em todos os lugares“, confessa logo nos minutos iniciais da faixa que parte do período de adaptação vivido após a partida de Mezzi, mas que ganha diferentes significados a cada nova audição.

Embora parta de um contexto bastante singular, Lucky For You em nenhum momento ecoa de maneira inacessível. Tão logo tem início, na já citada All I Do, Bognanno investe no uso de temas e sentimentos universais, tornando composição talvez herméticas capazes de dialogar com qualquer ouvinte. Não por acaso, a colaborativa Lose You foi a primeira faixa do disco a ser apresentada ao público. Completa pela participação de Soccer Mommy, a canção sintetiza de forma eficiente tudo aquilo que a cantora busca desenvolver ao longo da obra, direcionamento que vai da construção dos versos à força das guitarras.

Testemunho da fragilidade emocional de Bognanno, Lucky For You nasce como a expressão catártica de uma jornada pessoal, mas que encontra eco nas experiências de qualquer ouvinte. Claro que tamanha força no processo de criação da obra em nenhum momento oculta o uso de componentes instrumentais há muito incorporados e talvez desgastados dentro da discografia da artista. Observado atentamente, parte expressiva do repertório se apoia em estruturas bastante similares ao material entregue no trabalho anterior, o barulhento Sugaregg (2020), resultando em uma proximidade limitante, mas que em nenhum momento oculta a riqueza dos sentimentos dolorosamente manifestos do primeiro ao último instante do registro.

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Jornalista, criador do Música Instantânea e integrante do podcast Vamos Falar Sobre Música. Já passou por diferentes publicações de Editora Abril, foi editor de Cultura e Entretenimento no Huffington Post Brasil, colaborou com a Folha de S. Paulo e trabalhou com Brand Experience e Creative Copywriter em marcas como Itaú e QuintoAndar. Pai do Pudim, “ataca de DJ” nas horas vagas e adora ganhar discos de vinil de presente.

Jornalista, criador do Música Instantânea e integrante do podcast Vamos Falar Sobre Música. Já passou por diferentes publicações de Editora Abril, foi editor de Cultura e Entretenimento no Huffington Post Brasil, colaborou com a Folha de S. Paulo e trabalhou com Brand Experience e Creative Copywriter em marcas como Itaú e QuintoAndar. Pai do Pudim, “ataca de DJ” nas horas vagas e adora ganhar discos de vinil de presente.