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Crítica

Dry Cleaning

: "Stumpwork"

Ano: 2022

Selo: 4AD

Gênero: Indie Rock, Pós-Punk, Art Rock

Para quem gosta de: Porridge Radio e Sonic Youth

Ouça: Hot Penny Day e No Decent Shoes For Rain

8.3
8.3

Dry Cleaning: “Stumpwork”

Ano: 2022

Selo: 4AD

Gênero: Indie Rock, Pós-Punk, Art Rock

Para quem gosta de: Porridge Radio e Sonic Youth

Ouça: Hot Penny Day e No Decent Shoes For Rain

/ Por: Cleber Facchi 31/10/2022

Uma tartaruga desaparecida, fragmentos de conversas com uma amiga que trabalha no Ártico, moedas quentes sendo jogadas para uma multidão em uma estranha cerimônia local. Em Stumpwork (2022, 4AD), segundo álbum de estúdio do Dry Cleaning, cada composição detalha um universo de pequenas histórias, narrativas e personagens tão ordinários quanto encantadores. É como um minucioso exercício criativo que segue de onde Florence Shaw (voz), Nick Buxton (bateria), Tom Dowse (guitarra) e Lewis Maynard (baixo) pararam há poucos meses, no introdutório New Long Leg (2021), porém, de forma ainda mais interessante.

A exemplo do material entregue no disco anterior, Stumpwork se projeta em um espaço em branco, frio. São estruturas minimalistas, sempre calculadas, porém, entrecortadas pela poesia descritiva de Shaw. À medida que as composições avançam, blocos de ruídos e momentos de maior experimentação rompem com qualquer traço de linearidade, tornando a experiência de ouvir o trabalho bastante imprevisível. A própria faixa de abertura, Anna Calls From the Arctic, com suas guitarras labirínticas e versos que mais parecem pequenos fluxos de pensamento, funcionam como uma boa representação desse resultado.

Entretanto, enquanto o disco anterior parecia seguir até determinado ponto e parar, Stumpwork continua a reverberar na cabeça do ouvinte mesmo após o encerramento. Acompanhados pelo produtor e multi-instrumentista John Parish (PJ Harvey, Aldous Harding), os integrantes da banda se aprofundam na construção de faixas que mais ocultam do que necessariamente revelam informações. Com quase sete minutos de duração, Liberty Log é um bom exemplo desse resultado. Enquanto os versos se aprofundam na mente inquieta de Shaw, camadas de guitarras surgem e desaparecem durante toda a execução do material, proposta que alcança um resultado quase transcendental, talvez impensável em New Long Leg.

Mesmo a poesia de Shaw, sempre ancorada em cenas e acontecimentos mundanos, ganha novo significado ao longo da obra. “Você poderia assumir o controle da minha mente ou corpo a qualquer momento / Por que eu confio em você? / A resposta é que eu não confio e nunca vou confiar“, canta na já conhecida No Decent Shoes For Rain, música que sintetiza parte dos conflitos internos detalhados pela artista. O mesmo caráter emocional volta a se repetir na curtinha Don’t Press Me. Pouco menos de dois minutos em que a compositora inglesa convida o ouvinte a se perder em um território bastante particular, por vezes doloroso.

Com todas essas oscilações, momentos de maior urgência e faixas marcadas pela contemplação, fica bastante evidente o quanto Stumpwork, diferente de New Long Leg, ganha forma e cresce em uma medida própria de tempo. Enquanto no trabalho anterior músicas como Scratchcard Lanyard pareciam capazes de estreitar relações com o ouvinte logo em uma primeira audição, o presente disco utiliza de uma abordagem um pouco mais contida, por vezes arrastada, mas não menos interessante. São canções que se revelam aos poucos, sem pressa, arrastando o ouvinte para dentro de um verdadeiro turbilhão instrumental e poético.

Claro que esse parcial hermetismo não interfere na construção de faixas deliciosamente acessíveis, íntimas do ouvinte. É o caso de Hot Penny Day. Da linha de baixo funkeada, passando pelo uso das vozes e guitarras sempre destacadas, cada fragmento parece pensado para capturar a atenção do ouvinte. E ela não é a única. São composições como Gary Ashby e Liberty Log que não apenas seduzem, como destacam a capacidade do Dry Cleaning em jogar com os instantes. Um ziguezaguear de ideias, ritmos e informações que vai de um canto a outro de forma a brincar com a interpretação do público. Canções talvez instáveis nas mãos de outros artistas, porém, perfeitamente adaptadas ao estranho universo da banda inglesa.

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Jornalista, criador do Música Instantânea e integrante do podcast Vamos Falar Sobre Música. Já passou por diferentes publicações de Editora Abril, foi editor de Cultura e Entretenimento no Huffington Post Brasil, colaborou com a Folha de S. Paulo e trabalhou com Brand Experience e Creative Copywriter em marcas como Itaú e QuintoAndar. Pai do Pudim, “ataca de DJ” nas horas vagas e adora ganhar discos de vinil de presente.

Jornalista, criador do Música Instantânea e integrante do podcast Vamos Falar Sobre Música. Já passou por diferentes publicações de Editora Abril, foi editor de Cultura e Entretenimento no Huffington Post Brasil, colaborou com a Folha de S. Paulo e trabalhou com Brand Experience e Creative Copywriter em marcas como Itaú e QuintoAndar. Pai do Pudim, “ataca de DJ” nas horas vagas e adora ganhar discos de vinil de presente.