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Crítica

Ema Stoned

: "Devaneio"

Ano: 2023

Selo: Before Sunrise Records

Gênero: Rock Psicodélico

Para quem gosta de: Bike, Mahmed e Kalouv

Ouça: Spirulina, Vale da Lua e Caminhada

8.0
8.0

Ema Stoned: “Devaneio”

Ano: 2023

Selo: Before Sunrise Records

Gênero: Rock Psicodélico

Para quem gosta de: Bike, Mahmed e Kalouv

Ouça: Spirulina, Vale da Lua e Caminhada

/ Por: Cleber Facchi 01/08/2023

Uma viagem aos campos mais profundos da mente humana. Assim pode ser interpretado o terceiro e mais recente trabalho de estúdio do trio paulistano Ema Stoned, Devaneio (2023, Before Sunrise Records). Sequência ao material entregue no colaborativo Phenomena (2019), o registro de nove faixas diz a que veio e abre passagem para um universo de novas possibilidades logo na canção de abertura, Spirulina. São pouco mais de quatro minutos em que captações de campo delicadamente dão lugar ao uso labiríntico das guitarras, batidas e linha de baixo sempre destacada, como um convite a se perder em um mundo mágico orquestrado em conjunto por Alessandra Duarte (guitarra), Elke Lamers (baixo) e Theo Charbel (bateria).

Uma vez transportado para dentro desse cenário de formas flutuantes, texturas e melodias inebriantes, cada composição evidencia o esforço do trio em perverter todo e qualquer traço de conforto. Exemplo disso fica bastante explícito em Caminhada, música que segue de onde o grupo parou na já citada faixa de abertura, porém, reforçada pelas guitarras complementares de Sue-Elie Andrade Dé. São arranjos sempre marcados pela fluidez dos arranjos e uso de efeitos que significativamente ampliam os limites do registro, tratamento que ainda abre caminho para Curva do Sonho, uma das primeiras criações do disco a serem reveladas ao público, mas que ganha novo significada quando observada como parte de uma obra viva.

Nada que dê conta de preparar o ouvinte para a estrutura colossal que se ergue em Vale da Lua. Completa pela participação da multi-instrumentista Dharma Jhaz, que se reveza no uso da voz, flauta e saxofone, a música de onze minutos ganha forma e cresce em uma medida própria de tempo. São incontáveis camadas instrumentais, diferentes costuras rítmicas e sobreposições de ideias que refletem o lado transcendental do trio. Tudo é tratado de maneira tão arrebatadora que Fumacinha, vinda logo em seguida, acaba passando quase despercebida frente ao direcionamento grandioso e riqueza de detalhes da canção que a antecede.

Na verdade, passado esse intenso movimento explícito em Vale da Lua, Devaneio perde muito de seu impacto e passa a utilizar de uma abordagem contida, o que não necessariamente distancia o ouvinte de algumas boas surpresas. E isso fica bastante evidente em Geni Caju. Já conhecida das apresentações ao vivo da banda, a faixa se projeta como rock típico da década de 1970, porém, inesperadamente muda de direção e flerta com o uso de ritmos regionais em uma estrutura que tanto preserva a identidade criativa do trio, como faz lembrar da sempre inusitada combinação de elementos de nomes como Macaco Bong.

Passada essa curva breve, Muito Além traz o disco de volta aos eixos e resgata a essência psicodélica que marca os minutos iniciais do trabalho. É como uma interpretação talvez formulaica daquilo que se revela em Spirulina e Caminhada, mas não menos interessante, efeito do minucioso processo de criação adotado pela banda. Felizmente, sempre que o registro começa a se repetir, surge um componente de ruptura que transporta o ouvinte paras um novo território criativo. É o caso de Sete Quedas, música que preserva e perverte o caráter meditativo da material na mesma proporção, destacando o uso ruidoso as guitarras.

Vem justamente dessa aspereza que ecoa nos minutos finais o estímulo para a derradeira, Bico do Corvo. Acompanhado pelas vozes, corneta e barulhos de Paula Rebellato, o trio mais uma vez se aventura na construção de uma faixa em que cada novo movimento aponta a direção para um cenário totalmente reformulado. A diferença em relação a outras composições que abastecem o disco, como Vale da Lua, está no caráter sombrio, por vezes sufocante, adotado pelo grupo. É como um retorno à realidade após a jornada contemplativa que se inicia em Spirulina, direcionamento que funciona como um fechamento temporário, mas que aponta direções e deixa o caminho aberto para os futuros lançamentos da banda.

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Jornalista, criador do Música Instantânea e integrante do podcast Vamos Falar Sobre Música. Já passou por diferentes publicações de Editora Abril, foi editor de Cultura e Entretenimento no Huffington Post Brasil, colaborou com a Folha de S. Paulo e trabalhou com Brand Experience e Creative Copywriter em marcas como Itaú e QuintoAndar. Pai do Pudim, “ataca de DJ” nas horas vagas e adora ganhar discos de vinil de presente.

Jornalista, criador do Música Instantânea e integrante do podcast Vamos Falar Sobre Música. Já passou por diferentes publicações de Editora Abril, foi editor de Cultura e Entretenimento no Huffington Post Brasil, colaborou com a Folha de S. Paulo e trabalhou com Brand Experience e Creative Copywriter em marcas como Itaú e QuintoAndar. Pai do Pudim, “ataca de DJ” nas horas vagas e adora ganhar discos de vinil de presente.