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Crítica

Fábio de Carvalho

: "Anjo Pornográfico"

Ano: 2021

Selo: Rubedo Discos

Gênero: Pós-Punk, Experimental

Para quem gosta de: Lupe de Lupe e Jair Naves

Ouça: O Amor É, Obsessor e Passagem

8.0
8.0

Fábio de Carvalho: “Anjo Pornográfico”

Ano: 2021

Selo: Rubedo Discos

Gênero: Pós-Punk, Experimental

Para quem gosta de: Lupe de Lupe e Jair Naves

Ouça: O Amor É, Obsessor e Passagem

/ Por: Cleber Facchi 18/10/2021

Não espere por respostas fáceis e composições imediatas ao mergulhar no trabalho de Fábio de Carvalho. Como indicado desde o primeiro álbum de estúdio, Tudo em Vão (2016), sobrevive na obra do compositor mineiro um delirante exercício criativo regido em essência pelo forte caráter exploratório. Canções que confessam sentimentos, medos e angústias vividas pelo artista, porém, partindo de um desenho torto, sempre fragmentado. São ideias e atravessamentos rítmicos que parecem pensados para bagunçar a interpretação do ouvinte, conceito reforçado nas músicas de Anjo Pornográfico (2021, Rubedo Discos).

Concebido em um intervalo de quase dois anos, o álbum que contou com a colaboração de Bruno Carlos (bateria), Fernando Bones (baixo), Marcus Vinícius Evaristo (guitarra) e Tiago Sales Gomes (guitarra), todos integrantes do Aldan, mostra Carvalho em sua melhor forma. São canções marcadas pelo permanente cruzamento de informações e quebras conceituais que tingem com incerteza o processo de escuta. Um misto de canto e rima, delírios poéticos, batidas e ruídos cacofônico que confessam algumas das principais referências do artista, porém, preservando a estranha identidade criativa do músico de Belo Horizonte.

E isso fica bastante evidente logo nos primeiros minutos do trabalho, na introdutória O Amor É. Enquanto os versos fatiados de forma silábica discutem a essência caótico do amor (“Amar é / Um enxame / Na sua língua“), vozes sobrepostas se espalham em meio a guitarras e batidas ritualísticas que apontam para as criações do Swans em obras como The Seer (2012) e To Be Kind (2014). A mesma estrutura, porém, partindo de uma abordagem ainda mais urgente e instável acaba se refletindo em O Amor Está Aqui, registro que encanta pela completa fluidez dos arranjos e elementos sedimentados ao fundo da canção.

De fato, são esses pequenos detalhes e interferências ocasionais que tornam a experiência de ouvir o registro tão satisfatória. Canções que partem de uma estrutura pré-definida, mas que ganham novos contornos e mudam de direção à medida em que o trabalho avança. É o caso de Um Poço Sem Fundo. Pouco menos de dois minutos em que Carvalho brinca com a fragmentação dos elementos, batidas e vozes, arrastando o ouvinte para dentro de um território caótico. Mesmo quando utiliza de uma estrutura tradicional, como nos pianos de Passagem, há sempre um componente de quebra e imprevisível mudança.

Interessante notar que mesmo marcado pelo forte caráter experimental, Anjo Pornográfico mantém firme a consistência dos elementos. É como se o registro em nenhum momento ultrapassasse o que parece ser um cercado conceitual bastante específico. E isso se reflete não apenas no timbre das guitarras, efeitos e na arquitetura da bateria, mas nos temas incorporados ao longo da obra. Composições ancoradas em emoções primárias, como raiva, tristeza, medo e amor, porém, sempre potencializadas. Exemplo disso acontece em Obsessor, música em que explora os sentimentos de forma totalmente doentia. “Eu não queria que você tivesse / Qualquer memória antes de me conhecer … Eu te engoli / Como uma hóstia“, detalha.

O resultado desse processo está na entrega de uma obra que parece pensada para sufocar o ouvinte. Canções que partem de uma base opressiva e claustrofóbica, produto da permanente sobreposição de vozes, batidas e guitarras cíclicas que servem de complemento aos versos sempre consumidos pelas emoções. Instantes em que o artista e seus parceiros de banda vão de encontro ao mesmo território criativo Jair Naves e outros compositores também viscerais da música brasileira, colidem ideias e sentimentos de forma a produzir um registros que amplia tudo aquilo que Carvalho havia testado anteriormente.

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Jornalista, criador do Música Instantânea e integrante do podcast Vamos Falar Sobre Música. Já passou por diferentes publicações de Editora Abril, foi editor de Cultura e Entretenimento no Huffington Post Brasil, colaborou com a Folha de S. Paulo e trabalhou com Brand Experience e Creative Copywriter em marcas como Itaú e QuintoAndar. Pai do Pudim, “ataca de DJ” nas horas vagas e adora ganhar discos de vinil de presente.

Jornalista, criador do Música Instantânea e integrante do podcast Vamos Falar Sobre Música. Já passou por diferentes publicações de Editora Abril, foi editor de Cultura e Entretenimento no Huffington Post Brasil, colaborou com a Folha de S. Paulo e trabalhou com Brand Experience e Creative Copywriter em marcas como Itaú e QuintoAndar. Pai do Pudim, “ataca de DJ” nas horas vagas e adora ganhar discos de vinil de presente.