Image
Crítica

Glue Trip

: "Nada Tropical"

Ano: 2022

Selo: Independente

Gênero: Pop Psicodélico

Para quem gosta de: Tagua Tagua e Boogarins

Ouça: Marcos Valle e Lazy Dayz

7.5
7.5

Glue Trip: “Nada Tropical”

Ano: 2022

Selo: Independente

Gênero: Pop Psicodélico

Para quem gosta de: Tagua Tagua e Boogarins

Ouça: Marcos Valle e Lazy Dayz

/ Por: Cleber Facchi 09/08/2022

A colorida mistura de ritmos que embala Tempo Presente, música de abertura em Nada Tropical (2022, Independente), funciona como uma boa representação de tudo aquilo que os membros da Glue Trip buscam desenvolver no terceiro e mais recente trabalho de estúdio. Da fluidez das guitarras, passando pelo uso destacado dos sintetizadores e harmonias de vozes, cada mínimo fragmento da canção costura passado e presente de forma tão referencial quanto íntima do grupo paraibano. Um misto de reverência e reinterpretação, conceito adotado por Lucas Moura e seus parceiros durante toda a execução do material.

E isso fica ainda mais evidente com a chegada de Marcos Valle, um misto de homenagem ao compositor carioca e criativa reciclagem de tendências que aponta para a produção brasileira entre o final dos anos 1970 e início da década de 1980. São ecos de Jorge Ben Jor, Lincoln Olivetti, João Donato, Caetano Veloso e outros nomes importantes do período. A própria Le Voyage, completa pela participação da cantora YMA, reforça essa permanente sobreposição de elementos e refinamento dado aos arranjos, estrutura que ganha ainda mais destaque pela interferência dos músicos João Boaventura, Thiago Leal e Pedro Lacerda.

Nada que se compare ao material entregue em Lazy Dayz. Inaugurada em meio a orquestrações que contam com a sublime regência de Arthur Verocai, a faixa pouco a pouco convida o ouvinte a se perder em um labirinto de sons e sensações lisérgicas. É como um acumulo natural de tudo aquilo que Moura tem produzido desde os primeiros registros de inéditas, estrutura que peca pela ausência de novidade, porém, encanta pelo refinamento dado aos arranjos. São inserções minuciosas, costuras e harmonias sempre inebriantes, direcionamento que quase acaba engolindo a canção seguinte, Bessa Beat, parceria com Otto.

Passado esse momento de breve agitação, Nada Tropical desacelera para revelar ao público a enevoada Levinha. Do uso calculado das batidas, passando pelos sintetizadores cósmicos, tudo parece pensado para transportar o ouvinte para um mundo mágico. “E os teus pés nem tocam no chão / Nem tocam no chão / Nem tocam no chão / São feitos de algodão“, cresce a letra da canção, como um mantra. Esse mesmo recolhimento, porém, partindo de um direcionamento criativo diferente, acaba se refletindo na composição seguinte, Relax Man, música que dialoga com a atmosfera soturna do disco anterior, Sea at Night (2018).

De fato, difícil não pensar no repertório de Nada Tropical como uma soma de tudo aquilo que existe de mais característico no som produzido pelo grupo paraibano. São versos bilíngues, ambientações delirantes e temas instrumentais que oscilam entre a produção brasileira e música psicodélica. Exemplo disso fica ainda mais evidente com a chegada de Gergelim. Pouco mais de três minutos em que a banda, agora acompanhada de Felipe S, um dos integrantes da Mombojó, combina parte desses elementos de forma bastante destacada, como uma síntese criativa que ainda abre passagem para o fechamento do trabalho.

Com a faixa-título como música de encerramento, Moura preserva parte dos elementos incorporados ao longo do trabalho, porém, sustenta na construção dos versos um precioso componente criativo. Trata-se de uma delicada reflexão sobre o atual cenário político do país e força da arte como importante ferramenta de ruptura e transformação. “O único Brasil possível é o musical“, canta. O resultado desse processo está na entrega de um repertório marcado pela atmosfera lisérgica, porém, dotado de uma sobriedade necessária. Um misto de realidade e delírio que conduz a experiência do ouvinte durante toda a execução do material.

Ouça também:

Jornalista, criador do Música Instantânea e integrante do podcast Vamos Falar Sobre Música. Já passou por diferentes publicações de Editora Abril, foi editor de Cultura e Entretenimento no Huffington Post Brasil, colaborou com a Folha de S. Paulo e trabalhou com Brand Experience e Creative Copywriter em marcas como Itaú e QuintoAndar. Pai do Pudim, “ataca de DJ” nas horas vagas e adora ganhar discos de vinil de presente.

Jornalista, criador do Música Instantânea e integrante do podcast Vamos Falar Sobre Música. Já passou por diferentes publicações de Editora Abril, foi editor de Cultura e Entretenimento no Huffington Post Brasil, colaborou com a Folha de S. Paulo e trabalhou com Brand Experience e Creative Copywriter em marcas como Itaú e QuintoAndar. Pai do Pudim, “ataca de DJ” nas horas vagas e adora ganhar discos de vinil de presente.