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Crítica

Iara Rennó

: "Oríkì"

Ano: 2022

Selo: Independente

Gênero: MPB

Para quem gosta de: Serena Assumpção e Josyara

Ouça: Patakori O e Uma Flecha (Òkè Aró)

8.0
8.0

Iara Rennó: “Oríkì”

Ano: 2022

Selo: Independente

Gênero: MPB

Para quem gosta de: Serena Assumpção e Josyara

Ouça: Patakori O e Uma Flecha (Òkè Aró)

/ Por: Cleber Facchi 20/06/2022

Em meados de 2009, a cantora, compositora, produtora e multi-instrumentista Iara Rennó recebeu um convite do Museu Afro Brasil, localizado na cidade de São Paulo, para produzir uma instalação sonora. Intitulada Oríkì in Corpore, a exposição apresentava 12 obras, cada uma destinada a um orixá diferente, que foi homenageado com uma composição. Partindo desse processo de criação, Rennó deu vida ao álbum Oríkì (2022, Independente), registro que permaneceu inédito durante mais de uma década e só foi finalizado após um processo de iniciação no candomblé vivido pela artista há pouco mais de dois anos.

De essência ritualística, conceito reforçado logo na introdutória Àgò Mo Júbà Orí Ọkàn Oríkì, completa pela participação do cornetista norte-americano Rob Mazurek, Oríkì parte de um exercício particular de Rennó, porém, cresce no permanente diálogo da artista com diferentes colaboradores. A exemplo de Serena Assumpção, em Ascensão (2016), o registro funciona como um precioso ponto de encontro e criativa combinação de ideias. Canções que começam pequenas, ganham forma e crescem em uma medida própria de tempo, transportando o ouvinte para dentro de um universo mágico, em constante expansão.

Exemplo disso fica bastante evidente em Laròyé L’Ọ̀nà. Última composição do disco a ser finalizada pela artista, a faixa que funciona como uma saudação a Exu, orixá do movimento e da abertura de caminhos, se espalha em meio a ambientações, vozes e entalhes percussivos que tendem ao transe. É como um espaço permanentemente aberto às possibilidades, estrutura que se completa pela presença de Kiko Dinucci, responsável pelos sintetizadores e calimbas eletrônicas que crescem ao fundo da canção. São pequenos detalhes e sobreposições que se refletem até a derradeira Babá Ori, parceria com Thalma de Freitas.

Dentro desse espaço marcado pela combinação de elementos e colaborações que parecem dançar pelo tempo, determinadas composições assumem um caráter quase documental. É o caso de Feito Chuva (Arroboboi), parceria com Tulipa Ruiz que antecede o lançamento de Efêmera (2010), primeiro álbum de estúdio da cantora e compositora paulista. Outra que costura passado e presente é Patakorí O, terceira faixa do disco. Com bases originalmente gravadas em 2009, para a exposição Oríkì in Corpore, a saudação a Ogum se completa pelas vozes de Criolo, com quem Rennó se encontrou há poucos meses em estúdio.

O resultado desse processo está na entrega de uma obra conceitualmente diversa e que exige uma audição atenta durante toda sua execução. São pequenos atravessamentos, instrumentistas e vozes, muitas vezes não anunciadas, que garantem maior profundidade ao material. Instantes em que Rennó estreita a relação com velhos colaboradores, caso de Curumin, na conhecida UmaFlecha (Òkè Aró), e Anelis Assumpção, em Éèpà Ripá Ọya O, dedicada à Iansã, mas que em nenhum momento deixa de dialogar com outros nomes importantes da música brasileira, como Carlinhos Brown, na extensa Pedra de Raio (Káwo Kábiyèsí Ilè).

Embora se resolva por completo, Oríkì é apenas o primeiro de dois discos irmãos que Rennó deve revelar até o próximo ano. Como indicado logo na canção de abertura, trata-se de uma obra marcada pelo forte aspecto imersivo. São incontáveis camadas instrumentais, batidas, vozes e texturas que se revelam em pequenas doses. Um lento desvendar de informações, proposta que tende ao excesso, principalmente na segunda metade do álbum, quando parte dos conceitos e estruturas reveladas no bloco inicial parecem desvendados, mas que em nenhum momento perdem o refinamento ou deixam de surpreender o ouvinte.

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Jornalista, criador do Música Instantânea e integrante do podcast Vamos Falar Sobre Música. Já passou por diferentes publicações de Editora Abril, foi editor de Cultura e Entretenimento no Huffington Post Brasil, colaborou com a Folha de S. Paulo e trabalhou com Brand Experience e Creative Copywriter em marcas como Itaú e QuintoAndar. Pai do Pudim, “ataca de DJ” nas horas vagas e adora ganhar discos de vinil de presente.

Jornalista, criador do Música Instantânea e integrante do podcast Vamos Falar Sobre Música. Já passou por diferentes publicações de Editora Abril, foi editor de Cultura e Entretenimento no Huffington Post Brasil, colaborou com a Folha de S. Paulo e trabalhou com Brand Experience e Creative Copywriter em marcas como Itaú e QuintoAndar. Pai do Pudim, “ataca de DJ” nas horas vagas e adora ganhar discos de vinil de presente.