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Crítica

Josyara

: "ÀdeusdarÁ"

Ano: 2022

Selo: DeckDisc

Gênero: MPB

Para quem gosta de: Jadsa e Xênia França

Ouça: ladoAlado, Bilhetinho e Essa Cobiça

8.0
8.0

Josyara: “ÀdeusdarÁ”

Ano: 2022

Selo: DeckDisc

Gênero: MPB

Para quem gosta de: Jadsa e Xênia França

Ouça: ladoAlado, Bilhetinho e Essa Cobiça

/ Por: Cleber Facchi 31/08/2022

A primeira coisa que ouvimos em ÀdeusdarÁ (2022, DeckDisc) é o som da percussão. Em seguida, a voz forte de Josyara ganha forma em meio a efeitos e bases eletroacústicas, estrutura que se completa pela pela poesia contestadora e participação de Margareth Menezes. “Quem sustentará o meu sofrimento? / Quem se importará com a minha dor? / Quem suportará quem eu sou?“, questiona a artista de Juazeiro. Com pouco mais de três minutos de duração, a introdutória ladoAlado sintetiza de forma representativa tudo aquilo que a compositora baiana busca desenvolver no mais recente trabalho em carreira solo.

Na contramão do repertório entregue no disco anterior, o reducionista Mansa Fúria (2018), Josyara se concentra na formação de um material marcado pela força dos elementos. São batidas, arranjos e vozes sempre destacadas, estrutura que fortalece cada mínimo fragmento poético detalhado pela artista ao longo da obra. A própria escolha dos temas, conceitualmente ancorados em questões políticas e reflexões sobre a sociedade brasileira, contribui ainda mais para esse resultado. Instantes em que a artista potencializa tudo aquilo que tem sido testado e incorporado criativamente em estúdio desde os primeiros registros autorais.

Segunda faixa do disco, Ouro&Lama funciona como uma boa representação desse resultado. Enquanto os versos alternam entre questões ecológicas (“Quanto vale ter que exterminar os povos, as matas?“) e reflexões sobre desigualdade social (“Com sorriso sem dentes / Com estômago a roncar“), violões furiosos se espalham em meio a batidas e bases quase ritualísticas. A mesma potência no processo de criação, porém, partindo de uma abordagem distinta, acaba se refletindo na canção seguinte, Mama, composição que evidencia a completa entrega de Josyara e ainda serve de passagem para a faixa-título do trabalho.

Claro que essa busca por novas possibilidades não interfere na construção de faixas ainda íntimas dos antigos trabalhos da cantora. Exemplo disso acontece na própria música de encerramento do disco, Canto à Liberdade. Regida em essência pelos violões que evocam Baden Powell e a voz de Josyara, a canção segue de onde a artista parou em Mansa Fúria, porém, de forma ainda mais sensível e detalhista. O mesmo acontece no som econômico que embala a romântica Bilhetinho, faixa que destaca a coprodução de SekoBass e evidencia o uso de componentes sintéticos, elemento que surge e desaparece ao longo da obra.

Independente da direção percorrida em estúdio, prevalece nas canções de ÀdeusdarÁ a força dos versos. Da mesma forma que no álbum anterior, Josyara utiliza de jogos de palavras e metáforas para expressar sentimentos, desejos e momentos de maior vulnerabilidade. “Melei minha boca de mel / Quando chupei / A melancia madura do teu quintal“, canta na provocativa Melancia, composição que sintetiza parte dos temas explorados pela artista. Nada que prejudique a entrega de músicas marcadas pela clareza dos elementos, vide o romantismo expresso na já conhecida Essa Cobiça e na libertação que marca a própria faixa-título.

Com todos esses elementos em mãos, Josyara revela ao público um trabalho marcado pelo equilíbrio. Enquanto parte do repertório busca dar continuidade ao material entregue em Mansa Fúria, momentos de sutil experimentação tensionam a experiência do ouvinte e distanciam o registro de um resultado previsível. Mais do que isso, ÀdeusdarÁ evidencia o domínio criativo da artista que assume de maneira quase integral a produção, composição e direção do álbum. Um minucioso processo de criação que vai da construção dos arranjos à potência dos versos que mostram a compositora baiana em sua melhor forma.

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Jornalista, criador do Música Instantânea e integrante do podcast Vamos Falar Sobre Música. Já passou por diferentes publicações de Editora Abril, foi editor de Cultura e Entretenimento no Huffington Post Brasil, colaborou com a Folha de S. Paulo e trabalhou com Brand Experience e Creative Copywriter em marcas como Itaú e QuintoAndar. Pai do Pudim, “ataca de DJ” nas horas vagas e adora ganhar discos de vinil de presente.

Jornalista, criador do Música Instantânea e integrante do podcast Vamos Falar Sobre Música. Já passou por diferentes publicações de Editora Abril, foi editor de Cultura e Entretenimento no Huffington Post Brasil, colaborou com a Folha de S. Paulo e trabalhou com Brand Experience e Creative Copywriter em marcas como Itaú e QuintoAndar. Pai do Pudim, “ataca de DJ” nas horas vagas e adora ganhar discos de vinil de presente.