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Crítica

JPEGMAFIA / Danny Brown

: "Scaring The Hoes"

Ano: 2023

Selo: AWAL / Peggy

Gênero: Hip-Hop, Rap, Experimental

Para quem gosta de: Death Grips e Billy Wood

Ouça: Kingdom Hearts Key e God Loves You

8.0
8.0

JPEGMAFIA & Danny Brown: “Scaring The Hoes”

Ano: 2023

Selo: AWAL / Peggy

Gênero: Hip-Hop, Rap, Experimental

Para quem gosta de: Death Grips e Billy Wood

Ouça: Kingdom Hearts Key e God Loves You

/ Por: Cleber Facchi 10/04/2023

O caos reina em Scaring The Hoes (2023, AWAL / Peggy). Primeiro registro da parceria entre os rappers JPEGMAFIA e Danny Brown, o trabalho marcado pelo delirante atravessamento de informações, vozes e quebras instrumentais é exatamente o que você poderia esperar de uma colaboração entre os dois artistas. São canções essencialmente curtas e urgentes, porém, marcadas pela inusitada combinação de elementos e riqueza de ideias, como um fluxo de pensamento quase torrencial que vai da sobreposição de ritmos aos versos que transitam por diferentes temáticas e mergulham na mente inquieta dos próprios realizadores.

Parte desse processo vem da escolha de JPEGMAFIA, responsável pela produção de Scaring The Hoes, em organizar tudo em uma única estação de trabalho, uma Roland SP-404. Dessa forma, sem grandes edições, os artistas se concentram na construção das rimas que, na maioria das vezes, contrastam com a direção apontada pelas bases. Música de abertura e composição escolhida para anunciar a chegada do disco, Lean Beef Patty funciona como uma boa representação dessa imprevisível combinação de elementos que vai de um canto a outro de maneira a estimular e tensionar a experiência do ouvinte ao longo de todo o registro.

Dentro desse ambiente marcado pelas possibilidades, a dupla esbarra em questionamentos sobre a cultura de internet, o comportamento no mundo digital, personagens dúbios e reflexões sobre o atual panorama do rap norte-americano. “Bem-vindo à grande liga, esse é um esporte para jovens / Foda-se aquele hip-hop e aquele fluxo de velho / Onde está o Auto-Tune? Dê a mínima para o trap“, provoca Brown na faixa-título do disco. Pouco mais de dois minutos em que o rapper de Detroit e seu parceiro de estúdio vão de um canto a outro enquanto bases irregulares, palmas e sintetizadores acinzentados se erguem ao fundo da canção.

É como um regresso ao mesmo cenário caótico de obras como Exmilitary (2011), do Death Grips, porém, partindo de um evidente senso de atualização e anarquia que dialoga com outros registros produzidos por JPEGMAFIA nos últimos anos, como o inventivo All My Heroes Are Cornballs (2019). Uma estranha costura de elementos que convence na maior parte do tempo, porém, tende aos excessos e canções que parecem não finalizadas, como esboços que atendem ao desejo do artista em simplificar o processo de produção do material, marca de Run The Jewels e parte do repertório entregue pela dupla na segunda metade do disco.

Esses momentos de maior desequilíbrio ficam ainda mais evidentes quando somos presenteados por algumas das principais composições do disco, como Kingdom Hearts Key. Completa pela participação do rapper Redveil, a faixa ainda chama a atenção pela forma como JPEGMAFIA desenvolve a base da canção a partir de trechos de Yakusoku Wa Iranai, parte do primeiro álbum de estúdio da cantora e compositora japonesa Maaya Sakamoto, Grapefruit (1997). Essa mesma riqueza de detalhes ecoa durante toda a execução de God Loves You, curiosa criação que trata sobre sexo em meio a fragmentos de música gospel.

São justamente essas contradições, quebras e momentos de maior instabilidade que tornam a experiência de ouvir o trabalho tão satisfatória. É como um produto natural das inquietações e ideias contrastantes de cada colaborador em estúdio, conceito que se reflete na própria imagem de capa do disco, uma releitura do filme Sweet Jesus Preacher Man (1973). Embora marcado pelo direcionamento caótico, Scaring The Hoes cresce como um registro que evidencia o domínio criativo dupla durante toda sua execução. Canções marcadas pelo insano cruzamento de informações, ritmos e vozes, mas que em nenhum momento ecoam de forma aleatória, como um convite a se perder em um estranho universo comandado pelos dois artistas.

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Jornalista, criador do Música Instantânea e integrante do podcast Vamos Falar Sobre Música. Já passou por diferentes publicações de Editora Abril, foi editor de Cultura e Entretenimento no Huffington Post Brasil, colaborou com a Folha de S. Paulo e trabalhou com Brand Experience e Creative Copywriter em marcas como Itaú e QuintoAndar. Pai do Pudim, “ataca de DJ” nas horas vagas e adora ganhar discos de vinil de presente.

Jornalista, criador do Música Instantânea e integrante do podcast Vamos Falar Sobre Música. Já passou por diferentes publicações de Editora Abril, foi editor de Cultura e Entretenimento no Huffington Post Brasil, colaborou com a Folha de S. Paulo e trabalhou com Brand Experience e Creative Copywriter em marcas como Itaú e QuintoAndar. Pai do Pudim, “ataca de DJ” nas horas vagas e adora ganhar discos de vinil de presente.