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Crítica

Julia Jacklin

: "Crushing"

Ano: 2019

Selo: Polyvinyl / Transgressive / Liberation

Gênero: Indie Rock, Rock Alternativo

Para quem gosta de: Lucy Dacus e Angel Olsen

Ouça: Don't Know How to Keep Loving You

8.0
8.0

Julia Jacklin: “Crushing”

Ano: 2019

Selo: Polyvinyl / Transgressive / Liberation

Gênero: Indie Rock, Rock Alternativo

Para quem gosta de: Lucy Dacus e Angel Olsen

Ouça: Don't Know How to Keep Loving You

/ Por: Cleber Facchi 09/12/2019

A dualidade explícita logo nos primeiros minutos de Crushing (2019, Polyvinyl / Transgressive / Liberation), segundo e mais recente álbum de estúdio de Julia Jacklin, funciona como um indicativo claro do material que orienta a experiência do ouvinte até o último instante da obra. De um lado, a melancolia e lenta composição dos arranjos explícitos na inaugural Body, no outro, a atmosfera ensolarada e riqueza na construção das guitarras, marca da crescente Head Above. Dois extremos de um trabalho que encontra na força dos sentimentos compartilhados pela artista um precioso elemento de aproximação entre as faixas.

Concebido em um intervalo de quase dois anos, o trabalho que conta com produção assinada por Burke Reid (Courtney Barnett, The Drones), parte do isolamento, separação e conflitos sentimentais vividos pela própria artista como um estímulo para a composição dos versos. Instantes de doce melancolia, conceito que tem sido aprimorado pela cantora e compositora australiana desde o lançamento do álbum anterior, o também confessional Don’t Let The Kids Win (2016), mas que ganha ainda mais destaque nas canções do presente disco.

Eu gravei a maioria das vozes entre 1h00 e 4h00, então eu estava realmente cansada a maior parte do tempo. E estava escuro. Era muito estranho ter certeza de que estava bem escuro lá dentro, exceto talvez por uma lâmpada muito distante no canto. Eu realmente queria que você ouvisse tudo e não se escondesse atrás de nada“, respondeu em entrevista à Dork Magazine. De fato, tão logo tem início, até alcançar a derradeira Comfort, tudo gira em torno do lirismo intimista da cantora. Frações poéticas que não apenas revelam a dor da artista australiana, como estabelecem um diálogo quase imediato com ouvinte.

Exemplo disso está na dolorosa Don’t Know How to Keep Loving You, quarta faixa do disco. “Eu quero que esse sentimento resista ao tempo / Mas você conhece meu corpo agora e eu conheço o seu … Não sei como continuar te amando / Agora que te conheço tão bem“, canta em uma delicada reflexão sobre o lento distanciamento de um casal. São versos sempre confessionais, precisos, estrutura que se reflete durante toda a execução da obra, como em Turn Me Down. “É pedir muito de mim / Para acreditar em você / Quando eu não sei se você vai me amar / Do jeito que eu quero que você“, desaba.

Dos poucos momentos em que perverte o lirismo agridoce que orienta o disco, Jacklin mergulha na composição de músicas marcadas pelo forte discurso político, como em Convention, ou mesmo faixas em que trata sobre o peso do machismo. É o caso da intensa You Were Right. Regida pela força dos arranjos, estrutura que naturalmente aponta para o trabalho da conterrânea Courtney Barnett, a canção utiliza do sufocamento vivido pela artista como um estímulo para a composição dos versos. “Comecei a comer no seu lugar favorito / Na noite em que parei de comer com você / Você estava sempre tentando forçar meu gosto / Mas agora eu estou comendo lá porque eu quero“, canta em um evidente exercício de libertação sentimental.

Por vezes íntimo de outros exemplares recentes também marcados pela força dos sentimentos, como Are We There (2014), de Sharon Van Etten, e My Woman (2016), de Angel Olsen, o presente álbum se destaca pela forma como Julia Jacklin entrega ao público uma obra puramente confessional e sensível, porém, nunca dramática. Há sempre um fino toque de humor e ironia na forma como a cantora australiana transforma os próprios conflitos no principal componente criativo da obra, proposta que naturalmente faz de Crushing um dos registros mais preciosos e honestos do ano.


Jornalista, criador do Música Instantânea e integrante do podcast Vamos Falar Sobre Música. Já passou por diferentes publicações de Editora Abril, foi editor de Cultura e Entretenimento no Huffington Post Brasil, colaborou com a Folha de S. Paulo e trabalhou com Brand Experience e Creative Copywriter em marcas como Itaú e QuintoAndar. Pai do Pudim, “ataca de DJ” nas horas vagas e adora ganhar discos de vinil de presente.

Jornalista, criador do Música Instantânea e integrante do podcast Vamos Falar Sobre Música. Já passou por diferentes publicações de Editora Abril, foi editor de Cultura e Entretenimento no Huffington Post Brasil, colaborou com a Folha de S. Paulo e trabalhou com Brand Experience e Creative Copywriter em marcas como Itaú e QuintoAndar. Pai do Pudim, “ataca de DJ” nas horas vagas e adora ganhar discos de vinil de presente.