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Crítica

Juliano Gauche

: "Tenho Acordado Dentro Dos Sonhos"

Ano: 2023

Selo: Índigo Azul

Gênero: Indie

Para quem gosta de: Pélico e Gui Amabis

Ouça: Ondas Que Acordam e Desde Quando Eu Te Vi

7.8
7.8

Juliano Gauche: “Tenho Acordado Dentro Dos Sonhos”

Ano: 2023

Selo: Índigo Azul

Gênero: Indie

Para quem gosta de: Pélico e Gui Amabis

Ouça: Ondas Que Acordam e Desde Quando Eu Te Vi

/ Por: Cleber Facchi 13/04/2023

Os versos encaixados logo nos minutos iniciais de Tenho Acordado Dentro Dos Sonhos (2023, Índigo Azul), quinto e mais recente trabalho de estúdio de Juliano Gauche, funcionam como uma boa representação de tudo aquilo que o cantor e compositor capixaba busca desenvolver ao longo da obra. “Horas que vem / Horas que vão / Passam por mim / Vão me levar“, canta em uma delicada reflexão sobre a morosidade e as pequenas angústias experienciadas durante o período pandêmico, quando o músico, isolado na praia de Manguinhos, no Espírito Santo, desenvolveu o econômico repertório do sucessor de Afastamento (2018).

De essência intimista, como tudo aquilo que Gauche tem desenvolvido desde as primeiras empreitadas em estúdio, o registro de sete faixas contrasta a economia dos arranjos com a profundidade dos versos que funcionam como um mergulho na mente do próprio compositor. São delicadas criações que tratam sobre a impossibilidade de controlar o mundo ao redor, resgatam lembranças empoeiradas e estabelecem no forte interesse do artista por temas metafísicos uma importante fonte de inspiração para o curto repertório arranjado em parceria com Sérgio Benvenuto e produzido pelo músico em colaboração com Klaus Sena.

Tamanha sutileza no processo de criação resulta na construção de faixas como Desde Quando Eu Te Vi. Enquanto os versos se aprofundam em recordações entristecidas de um antigo amor (“Tenho as costas pra cidade / Que quebrou meu coração / Cada pedra que levei / Foi pra te afastar de mim“), cada mínimo componente instrumental parece trabalhado em uma medida própria de tempo. Do movimento calculado do violão e seus ruídos ocasionais, passando pelo lento acréscimo dos sintetizadores e pianos elétricos, tudo parece pensado de forma a potencializar, mesmo de maneira econômica, os sentimentos de Gauche.

E isso acaba se refletindo durante toda a execução do trabalho. Do momento em que tem início, na já citada Horas Que Vem, Horas Que Vão, Gauche e seus parceiros de estúdio se distanciam de possíveis excessos de forma a estimular um material que se revela aos poucos, sem pressa. São canções que partem de uma base acústica, mas que se completam pelo lento desvendar de informações, ritmos e pequenos acréscimos. Faixa mais extensa do disco e a única composição que destaca o uso da batera eletrônica, Nos Cânticos de Lá sintetiza esse resultado de maneira bastante explícita, detalhando meticulosas pinceladas instrumentais.

Mesmo quando estreita relações com outros colaboradores, como em Ondas Que Acordam, Gauche em nenhum momento rompe com o enquadramento reducionista que orienta o desenvolvimento das faixas durante toda a execução do trabalho. Completa pela participação do cantor e compositor mineiro André Travassos, da Moons, a canção de letra bilíngue mais oculta do que necessariamente revela qualquer informação ao ouvinte. São ambientações labirínticas e delicadas camadas instrumentais que funcionam como um cama para os versos que tratam sobre abandono, dor e solidão de forma sempre contemplativa.

Claro que tamanho reducionismo no processo de criação resulta na formação de um repertório marcado pelo uso de pequenas repetições estruturais e canções que, embora curtas, custam a avançar. Mesmo os versos partilham de temáticas bastante similares, como uma manifestação da ausência de perspectiva vivida durante o período de isolamento social. São composições talvez indigestas e dolorosas, porém, necessárias, como uma manifestação quase documental dos tormentos vividos pelo compositor durante o processo de criação do trabalho, mas que parece sobreviver para além de um espaço de tempo específico.

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Jornalista, criador do Música Instantânea e integrante do podcast Vamos Falar Sobre Música. Já passou por diferentes publicações de Editora Abril, foi editor de Cultura e Entretenimento no Huffington Post Brasil, colaborou com a Folha de S. Paulo e trabalhou com Brand Experience e Creative Copywriter em marcas como Itaú e QuintoAndar. Pai do Pudim, “ataca de DJ” nas horas vagas e adora ganhar discos de vinil de presente.

Jornalista, criador do Música Instantânea e integrante do podcast Vamos Falar Sobre Música. Já passou por diferentes publicações de Editora Abril, foi editor de Cultura e Entretenimento no Huffington Post Brasil, colaborou com a Folha de S. Paulo e trabalhou com Brand Experience e Creative Copywriter em marcas como Itaú e QuintoAndar. Pai do Pudim, “ataca de DJ” nas horas vagas e adora ganhar discos de vinil de presente.