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Crítica

Kate NV

: "Room For The Moon"

Ano: 2020

Selo: RVNG Intl.

Gênero: Art Pop, Art Rock, Experimental

Para quem gosta de: Cate Le Bon, Jenny Hval e Grimes

Ouça: Plans, Telefon e Not Not Not

8.5
8.5

Kate NV: “Room For The Moon”

Ano: 2020

Selo: RVNG Intl.

Gênero: Art Pop, Art Rock, Experimental

Para quem gosta de: Cate Le Bon, Jenny Hval e Grimes

Ouça: Plans, Telefon e Not Not Not

/ Por: Cleber Facchi 22/06/2020

Kate Shilonosova nunca pareceu seguir uma estrutura linear dentro dos próprios trabalhos. Seja no pop empoeirado que marca as canções de Binasu (2016), registro em que dialoga com o som dos anos 1980, ou nas experimentações eletrônicas de для FOR (2018), cada novo álbum entregue pela cantora, compositora e produtora de Moscow parece transportar o ouvinte para um território completamente distinto. Composições que se espalham de maneira inexata, torta, como se diferentes obras fossem condensadas dentro de um único disco, conceito que ganha ainda mais destaque no material apresentado em Room For The Moon (2020, RVNG Intl).

Terceiro e mais recente álbum de estúdio da artista russa, o registro gravado durante um período de “enorme solidão“, amplia de forma significativa tudo aquilo que a cantora tem produzido sob o título de Kate NV. São canções que se relacionam de maneira confessa com a produção russa e japonesa dos anos 1970, evocam o trabalho de veteranos como Laurie Anderson e David Byrne, porém, estabelecem no uso incerto dos elementos a passagem para um universo próprio da musicista. “Eu sempre deixo a música se expressar“, respondeu no texto de apresentação da obra, indicando a fluidez e riqueza de detalhes que serve de sustento ao disco.

Não por acaso, Shilonosova inaugura o trabalho com a crescente Not Not Not. São pouco mais de cinco minutos em que a artista russa conduz a experiência do ouvinte em um labirinto de pequenas possibilidades. São camadas de sintetizadores que se espalham em meio a batidas inexatas, o uso destacado da marimba, metais e a linha de baixo sempre ritmada, como um complemento aos versos lançados pela cantora. Instantes em que a musicista vai do pop empoeirado ao uso de abstrações jazzísticas e ruídos sintéticos, como uma propositada fuga do minimalismo incorporado durante a produção do álbum anterior, для FOR.

Com base nessa estrutura, Kate NV divide o trabalho em duas porções bastante distintas. Na primeira metade do álbum, a artista concentra o que há de mais experimental no interior da obra. São faixas como Sayonara – Full Moon Version e Du Na em que a cantora parece brincar com a repetição dos elementos. São versos cíclicos, a percussão sempre marcada e o uso atmosférico dos arranjos e metais, conceito que tem sido explorado desde a estreia com Binasu, mas que alcança novo resultado com o presente disco. Exemplo disso está em Marafoon 15, música fatiada em diferentes blocos instrumentais, lembrando as criações de Cate Le Bon, no ainda recente Reward (2019).

Entretanto, é justamente quando prova de uma sonoridade mais acessível, apontando a direção para a segunda metade do trabalho, que as canções de Shilonosova alcançam melhor resultado. São faixas como Ça Commence Par, com seus versos cantados em francês e instrumentos de sopro que parecem dançar na cabeça do ouvinte. Na derradeira Telefon, o uso calculado dos sintetizadores, batidas e vozes, emulando uma canção esquecida dos anos 1980. Mesmo a já conhecida Plans, uma das primeiras composições do disco a serem apresentadas ao público, ganha novo significado dentro do álbum, lembrando uma estranha canção de Madonna no começo da carreira.

Conceitualmente diverso, Room For The Moon reflete a capacidade de Kate NV em se reinventar dentro de estúdio. Longe de uma estrutura previsível, cada composição do disco parece jogar com a interpretação do ouvinte, convidado a se perder em um universo marcado pelas possibilidades, criativa colagem de ritmos e referências que apontam para os mais variados campos da música. Um olhar curioso para o passado, como se Shilonosova confessasse ao público algumas de suas principais influências, porém, de forma sempre provocativa, direcionamento que vai do experimentalismo, em Not Not Not, ao estranho diálogo com a música pop, na derradeira Telefon.


Jornalista, criador do Música Instantânea e integrante do podcast Vamos Falar Sobre Música. Já passou por diferentes publicações de Editora Abril, foi editor de Cultura e Entretenimento no Huffington Post Brasil, colaborou com a Folha de S. Paulo e trabalhou com Brand Experience e Creative Copywriter em marcas como Itaú e QuintoAndar. Pai do Pudim, “ataca de DJ” nas horas vagas e adora ganhar discos de vinil de presente.

Jornalista, criador do Música Instantânea e integrante do podcast Vamos Falar Sobre Música. Já passou por diferentes publicações de Editora Abril, foi editor de Cultura e Entretenimento no Huffington Post Brasil, colaborou com a Folha de S. Paulo e trabalhou com Brand Experience e Creative Copywriter em marcas como Itaú e QuintoAndar. Pai do Pudim, “ataca de DJ” nas horas vagas e adora ganhar discos de vinil de presente.