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Crítica

LEALL

: "Eu Ainda Tenho Coração"

Ano: 2023

Selo: Rock Danger

Gênero: Hip-Hop, Rap

Para quem gosta de: SD9 e Sain

Ouça: Vivência Maldita e Sensação de Liberdade

8.2
8.2

LEALL: “Eu Ainda Tenho Coração”

Ano: 2023

Selo: Rock Danger

Gênero: Hip-Hop, Rap

Para quem gosta de: SD9 e Sain

Ouça: Vivência Maldita e Sensação de Liberdade

/ Por: Cleber Facchi 19/12/2023

Mesmo esculpido a machado, LEALL ainda tem um coração. E isso fica bastante evidente com a entrega do segundo e mais recente trabalho de estúdio do rapper fluminense. Sequência ao material revelado há dois anos, o novo disco segue a cartilha de outros exemplares do gênero, mergulhando nas conquistas e nas transformações experienciadas pelo artista desde a apresentação do registro anterior, porém, livre da ostentação barata que tradicionalmente corrompe outros exemplares do gênero. São composições que tratam sobre dinheiro, consumo e excessos, porém, entrecortadas por momentos de maior vulnerabilidade.

Claro que essa mudança de postura não se dá por acaso. Para além da transformação financeira vivida pelo rapper desde o lançamento de Esculpido a Machado (2021), o artista vindo da Zona Norte do Rio de Janeiro passou por outra mudança bastante significativa nos últimos anos: o processo de paternidade. “Deus mandou meu filho / Pra me lembrar que eu tenho coração“, rima na faixa-título do disco, canção que não apenas sintetiza parte dos elementos incorporados no decorrer da obra, como preserva a mesma lírica afiada e capacidade de LEALL em transitar por entre temáticas com a mesma fluidez do registro anterior.

Assim como o trabalho que o antecede, Eu Ainda Tenho Coração se sustenta na entrega de composições essencialmente curtas, porém, complexas. São canções resolvidas em um intervalo de um a dois minutos, mas que combinam diferentes abordagens e colaboradores com uma densidade única. Exemplo disso fica bastante evidente em Vivência Maldita. Completa pela participação do conterrâneo Sain, a faixa parte do cenário ao redor (“Porra, guerra é uma pedofilia / Fodendo com a nossa infância“) para mergulhar nas dores e inquietações do próprio artista (“E meu ego alimentício te contando mentiras depois da transa“).

Essa mesma força no processo de composição acaba se refletindo em diversos momentos ao longo da obra. São versos marcados pelo lirismo agridoce e tormentos pessoais do artista. Instantes em que LEALL reflete e celebra tudo aquilo que conquistou, como em Onde Que Nós Taria?, porém, sempre acompanhado de uma sequência de outras faixas consumidas pela realidade dura e o impacto da violência racial, marca de Sensação de Liberdade, música que se completa pela participação de BK. Nada que prejudique a entrega de canções que funcionam como respiros momentâneos, levando o repertório do disco para outra direção.

Nona faixa do álbum, Besteiras funciona como uma boa representação desse resultado. Enquanto a base da canção destaca a produção caprichada de Babidi, parceiro de longa data do rapper, fragmentos de Preciso Dizer Que Te Amo, colaboração entre Cazuza e Bebel Gilberto, se conectam diretamente aos versos que destacam o lado sentimental do artista. A própria composição de encerramento, Julho de 2001, é outra que chama a atenção pela sensibilidade poética de LEALL. É como um delicado exercício criativo que se conecta aos principais temas do trabalho, porém, partindo de uma abordagem existencial e transformada.

Sobrevive justamente nesse forte aspecto sentimental a beleza do trabalho. São canções que preservam a crueza das rimas, porém, sempre pontuadas por pequenos acréscimos emocionais que levam o disco para outras direções. Não por acaso, quanto mais se distancia desse resultado, como em O Crime e a Música, menos interessante o registro acaba se revelando. Ainda assim, prevalece em Eu Ainda Tenho Coração a sensação de uma obra equilibrada. Composições que seguem de onde LEALL parou no álbum anterior, mas que a todo momento trilham novos percursos e incorporam diferentes temáticas de forma impactante.

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Jornalista, criador do Música Instantânea e integrante do podcast Vamos Falar Sobre Música. Já passou por diferentes publicações de Editora Abril, foi editor de Cultura e Entretenimento no Huffington Post Brasil, colaborou com a Folha de S. Paulo e trabalhou com Brand Experience e Creative Copywriter em marcas como Itaú e QuintoAndar. Pai do Pudim, “ataca de DJ” nas horas vagas e adora ganhar discos de vinil de presente.

Jornalista, criador do Música Instantânea e integrante do podcast Vamos Falar Sobre Música. Já passou por diferentes publicações de Editora Abril, foi editor de Cultura e Entretenimento no Huffington Post Brasil, colaborou com a Folha de S. Paulo e trabalhou com Brand Experience e Creative Copywriter em marcas como Itaú e QuintoAndar. Pai do Pudim, “ataca de DJ” nas horas vagas e adora ganhar discos de vinil de presente.