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Crítica

Leto

: "Sugar Mama"

Ano: 2019

Selo: Freak

Gênero: Pop, R&B, Eletrônica

Para quem gosta de: Letrux e Duda Beat

Ouça: Por Isso, Ego e 100 =

7.8
7.8

Leto: “Sugar Mama”

Ano: 2019

Selo: Freak

Gênero: Pop, R&B, Eletrônica

Para quem gosta de: Letrux e Duda Beat

Ouça: Por Isso, Ego e 100 =

/ Por: Cleber Facchi 03/10/2019

Canções de amor, conflitos sentimentais e instantes de necessária reflexão política. Em Sugar Mama (2019, Freak), primeiro álbum de estúdio da cantora, compositora e produtora Leticia Cury, a Leto, cada fragmento do disco reflete a capacidade da artista paulistana em transformar as próprias desilusões em um importante componente criativo para a formação dos versos. Um lento desvendar de ideias e experiências intimistas que se revela por completo tão logo o registro tem início, em 100 = (“Mas comigo não vai ser assim / Você vai ter que me engolir / Não vai cuspir no prato que comeu / Acha que eu tô emocionada / Mas eu sou mais eu“), mas que ganha novos contornos a medida em que o ouvinte avança pela obra.

De essência provocativa, conceito reforçado logo na imagem de capa do disco, o trabalho dominado pelo uso de batidas eletrônicas ganha forma aos poucos, sem pressa, detalhando texturas minimalistas e bases econômicas que se conectam diretamente aos versos lançados pela cantora. “Não vem trazendo coisas do passado / Não tem nem discussão, se tava errado / Mas pode relaxar, tá perdoado / Hoje eu tô tão bem“, anuncia em Nem Vem, composição que sintetiza parte da atmosfera concebida para o trabalho.

São fragmentos eletrônicos que vão das pistas ao reducionismo do R&B em uma estrutura deliciosamente convidativa, por vezes labiríntica, como um convite de Leto a se perder em um território dominado pelas emoções. “Você nunca me amou / Você amava o seu próprio prazer / Mas para entrar em mim / É necessário sair de você“, canta em Ego, música que reflete parte do lirismo agridoce que ganha forma no decorrer da obra. Canções consumidas pela saudade (Interestelar), dor (Gravidade) e busca declarada por um novo amor (Elefante Branco), porém, sempre enquadradas dentro da atmosfera compacta que serve de sustento ao disco.

É como se do pop eletrônico detalhado em Afim, primeiro grande lançamento da cantora, Leto fosse além, revisitando diferentes variações melódicas e propostas de forma tão referencial quanto íntima da identidade estética concebida pela própria artista. Frações minimalistas, sintetizadores e vozes estilizadas que vão techno empoeirado de novatas como Yaeji e Peggy Gou à obra de veteranas da cena eletrônica, como Robyn e todo um universo de vozes femininas que surgiram na segunda metade dos anos 1990. Passado e presente, descoberta e amadurecimento artístico, cuidado que se reflete até o último instante da obra.

Perfeita representação desse continuo processo de amadurecimento da artista se reflete próximo ao fechamento do disco, na já conhecida Por Isso. São pouco menos de três minutos em que Leto parte de inquietações particulares para discutir o peso do machismo e a postura retrógrada de uma série de personagens políticos recentes. “Eu não sou recatada / Eu não sou do lar / Não sou uma fraquejada, como eu ouvi falar / E eu sinto muito, e por isso eu canto / Por isso te assusta tanto“, canta enquanto sintetizadores e batidas ganham forma aos poucos, como um complemento direto aos versos lançados pela artista.

Conceitualmente restrito, ancorado em um bem resolvido conjunto de experiências sonoras, Sugar Mama talvez custe a impressionar o ouvinte mais apressado, efeito direto da base minimalista e propositadamente contida que serve de sustento ao trabalho. Entretanto, uma vez seduzido pela poesia intimista da cantora e o precioso cruzamento entre batidas, ruídos eletrônicos e sintetizadores que se espalham pelo interior da obra, difícil escapar do material entregue pela artista paulistana. Um delirante universo de sensações que faz da estreia de Leto um dos projetos mais curiosos do ano.


Jornalista, criador do Música Instantânea e integrante do podcast Vamos Falar Sobre Música. Já passou por diferentes publicações de Editora Abril, foi editor de Cultura e Entretenimento no Huffington Post Brasil, colaborou com a Folha de S. Paulo e trabalhou com Brand Experience e Creative Copywriter em marcas como Itaú e QuintoAndar. Pai do Pudim, “ataca de DJ” nas horas vagas e adora ganhar discos de vinil de presente.

Jornalista, criador do Música Instantânea e integrante do podcast Vamos Falar Sobre Música. Já passou por diferentes publicações de Editora Abril, foi editor de Cultura e Entretenimento no Huffington Post Brasil, colaborou com a Folha de S. Paulo e trabalhou com Brand Experience e Creative Copywriter em marcas como Itaú e QuintoAndar. Pai do Pudim, “ataca de DJ” nas horas vagas e adora ganhar discos de vinil de presente.