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Crítica

Letrux

: "Letrux Aos Prantos"

Ano: 2020

Selo: Independente

Gênero: Rock, MPB, Pop Rock

Para quem gosta de: Alice Caymmi e Johnny Hooker

Ouça: Eu Estou Aos Prantos e Déjà-vu Frenesi

6.5
6.5

Letrux: “Letrux Aos Prantos”

Ano: 2020

Selo: Independente

Gênero: Rock, MPB, Pop Rock

Para quem gosta de: Alice Caymmi e Johnny Hooker

Ouça: Eu Estou Aos Prantos e Déjà-vu Frenesi

/ Por: Cleber Facchi 17/03/2020

Depois da noite de festa, é hora da ressaca. Três anos após o lançamento de Letrux Em Noite De Climão (2017), obra em que passeia em meio a relacionamentos fracassados, romances lésbicos e instantes de doce libertação, Letícia Novaes está de volta com um novo trabalho de estúdio: Letrux Aos Prantos (2020, Independente). Como indicado logo no título do álbum, trata-se de um registro marcado pela força dos sentimentos, dores e conflitos existencialistas da cantora e compositora carioca. Frações poéticas consumidas pela necessidade da artista em seguir em frente, mesmo regidas pelo peso da memória e pequenos traumas que parecem acumular desde o disco anterior.

Se organizar direito, todo mundo chora / Se organizar direito, todo mundo cansa / Mas nem todo mundo transa / Nem todo mundo goza“, canta na introdutória Déjà-vu Frenesi, canção que reflete o lirismo angustiado da artista carioca. São pouco mais de quatro minutos em que a cantora resgata a poesia tragicômica do álbum anterior, porém, estabelece pequenos diálogos com o último trabalho de estúdio no extinto Letuce, Estilhaça (2015), obra assinada em parceria com o ex-marido, o multi-instrumentista Lucas Vasconcellos. Um misto de rock e pop decadente, proposta que orienta a experiência do ouvinte até a derradeira Cry Something Awkward.

É partindo desse mesmo direcionamento melancólico que Novaes e seus parceiros de banda, Lourenço Vasconcellos (bateria), Martha V. (teclados) e Thiago Rebello (baixo), Natália Carrera (guitarras) e Arthur Braganti (teclados), os dois últimos, também produtores do disco, orientam parte expressiva do álbum. São canções como Eu Estou aos Prantos (“Mentira te esquecer / Eu não sou você … Eu estou aos prantos / Quem não“) e Dorme Com Essa (“Dorme com essa / Dorme com ela / Dorme comigo / Pinta o cabelo vai pra Lisboa / Some da minha vida“), em que a cantora se revela por completo, fazendo da própria dor um importante componente de diálogo com o ouvinte. São respiros angustiados, cenas e fragmentos do cotidiano que parecem invadir a cabeça de Novaes, mas que aqui são prontamente expostos, transformados em música.

Claro que isso não interfere na produção de faixas puramente dançantes e cômicas, ainda íntimas do material apresentado no disco anterior. Exemplo disso está na sequência formada por Contanto Até Que e Vai Brotar. Da construção dos versos (“Eu vim pra Botafogo no teu bairro / Eu vim pra botar fogo no teu quarto / No teu porto, no teu carro com cigarro“), à composição dos arranjos, tudo soa como uma extensão do repertório entregue em Letrux Em Noite De Climão. Mesmo o encontro com Luísa Lovefoxxx, na nostálgica Fora da Foda, parece preservar um pouco dessa essência. “De fora da foda, fiz por merecer / De fora da foda, meu anti prazer / De fora da foda, só vim por você“, confessa enquanto sintetizadores e batidas eletrônicas se revelam ao público em pequenas doses, sem pressa.

O grande problema em Letrux Aos Prantos acaba ficando na segunda metade do trabalho. Com exceção do sambinha, em Cuidado, Paixão, e da divertida Salve Poseidon, com seus versos declamados (“Eu queria estar lá / Na hora em que a Shakira disse / Que nasceu dia 2 de fevereiro / E o marido disse: ‘Eu também!’ / Eu queria estar em todas as coincidências do mundo“), não são poucos os momentos em que Novaes parece brincar com a repetição dos temas, tornando a experiência do ouvinte arrastada. Canções como Abalos Sísmicos, Esse Filme que Passou Foi Bom e a previsível Sente o Drama, colaboração com Liniker, que pouco avança em relação ao material entregue em Noite de Climão.

Com base nessa estrutura, o presente álbum se revela muito mais como um complemento ao disco anterior do que o indicativo de uma nova fase na carreira da artista. Canções de essência introspectiva (Déjà-vu Frenesi, Eu Estou aos Prantos), pontuadas por temas dançantes (Vai brotar, Fora da Foda), ou mesmo momentos de breve transformação, como na latinidade de El Dia Que no Me Quieras, porém, tratados de forma quase burocrática, como se Letrux Aos Prantos dependesse em excesso do registro que o antecede para funcionar. Um misto de passado e presente que sobrevive da propositada reciclagem de antigos conceitos, mas que dificilmente deve desagradar aos ouvintes mais fiéis da cantora.


Jornalista, criador do Música Instantânea e integrante do podcast Vamos Falar Sobre Música. Já passou por diferentes publicações de Editora Abril, foi editor de Cultura e Entretenimento no Huffington Post Brasil, colaborou com a Folha de S. Paulo e trabalhou com Brand Experience e Creative Copywriter em marcas como Itaú e QuintoAndar. Pai do Pudim, “ataca de DJ” nas horas vagas e adora ganhar discos de vinil de presente.

Jornalista, criador do Música Instantânea e integrante do podcast Vamos Falar Sobre Música. Já passou por diferentes publicações de Editora Abril, foi editor de Cultura e Entretenimento no Huffington Post Brasil, colaborou com a Folha de S. Paulo e trabalhou com Brand Experience e Creative Copywriter em marcas como Itaú e QuintoAndar. Pai do Pudim, “ataca de DJ” nas horas vagas e adora ganhar discos de vinil de presente.