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Crítica

Loraine James

: "Reflection"

Ano: 2021

Selo: Hyperdub

Gênero: Eletrônica, Experimental, R&B

Para quem gosta de: Kelela, Mr. Mitch e Machinedrum

Ouça: Running Like That e Let's Go

7.8
7.8

Loraine James: “Reflection”

Ano: 2021

Selo: Hyperdub

Gênero: Eletrônica, Experimental, R&B

Para quem gosta de: Kelela, Mr. Mitch e Machinedrum

Ouça: Running Like That e Let's Go

/ Por: Cleber Facchi 17/06/2021

Produtora britânica, Loraine James passou os últimos anos testando diferentes possibilidades criativas de forma pouco usual. São trabalhos que transitam por entre ritmos, prestam homenagens ao som produzido por veteranos da cena inglesa e, a todo momento, estreitam a relação com novos campos da música. Exemplo disso acontece em toda a série de obras apresentadas pela artista ao longo da última década, como nas sobreposições sintéticas de Detail (2018), de onde vieram composições como Late Night Traffic Lights e To The Left, To The West, ou no também diverso For You and I (2019), registro em se entrega ao uso de diferentes estilos de forma deliciosamente inexata, estrutura que vai do experimentalismo jazzístico ao diálogo com elementos do grime/techno.

Entretanto, é com a chegada de Reflection (2021, Hyperdub), terceiro e mais recente álbum de inéditas da carreira, que James realmente diz a que veio. Sem necessariamente se fixar a um gênero ou conceito específico, a produtora londrina vai de um canto a outro de forma sempre provocativa. São ambientações inexatas, ruídos e vozes que ora assumem uma função harmônia, ora se compram como um instrumento delirante nas mãos da artista. É como se a produtora resgatasse tudo aquilo que foi apresentado nos dois últimos trabalhos de estúdio, porém, partindo de uma interpretação totalmente ampliada do próprio território criativo, proposta que tanto esbarra em momentos de maior abstração, como revela faixas capazes de estreitar a relação com uma parcela maior do público.

Uma vez dentro desse cenário marcado pelas possibilidades, James divide o disco em dois blocos específicos de composições. O primeiro deles, reforçado logo na introdutória Built to Last, parceria com Xzavier Stone, diz respeito ao esforço da artista em adaptar a própria sonoridade ao time seleto de colaboradores que a cercam. São canções que preservam o caráter anárquico da produtora, porém, pontuadas por momentos de menor hermetismo, estrutura que vai do uso das vozes ao maior refinamento das batidas. É o caso da já conhecida Running Like That, bem-sucedido encontro com a canadense Eden Samara, mas que parece dialogar com o mesmo R&B eletrônico adotado por nomes como Kelela e Jessy Lanza, indicando uma passagem para o lado mais acessível e convidativo da obra.

Claro que isso não impede James de mergulhar em momentos de maior experimentação. E isso fica bastante evidente no encontro com Will Wiesenfeld, o Baths, em On The Lake Outside. Enquanto a voz do artista californiano garante à faixa uma evidente sensação de conforto, batidas inexatas e sobreposições etéreas tingem com incerteza os rumos da artista inglesa ao longo da obra. São pouco menos de cinco minutos em que os dois artistas mudam de direção a todo instante, jogando com a interpretação do público. A própria faixa de encerramento do disco, We’re Building Something New, parceria com Iceboy Violet, parte de uma estrutura linear, porém, muda de direção e cresce à medida em que as rimas lançadas pelo convidado incorporam uma capa sintética e pouco usual.

Esse mesmo direcionamento torto ganha ainda mais destaque nas canções assumidas por James individualmente. Não por acaso, a produtora fez de Simple Stuff e Let’s Go as primeiras composições do disco a serem apresentadas ao público. Seguindo a trilha apresentada em Detail e For You and I, a artista utiliza de uma abordagem nada usual, colidindo ideias e formas instrumentais que transitam por diferentes campos da música. Instantes em que a britânica vai de encontro ao mesmo som fragmentado de nomes como Jlin, porém, preservando o forte caráter autoral, conceito que se reflete no uso ruidoso das batidas e micro-ambientações que rompem com qualquer traço de linearidade, conceito que se reflete em maior ou menor escala em outros momentos ao longo do álbum.

Conceitualmente amplo e feito para ser revisitado, Reflection segue como o trabalho mais complexo de toda a curta discografia de James. Do momento em que tem início, em Built to Last, até alcançar a derradeira We’re Building Something New, cada composição do disco reflete a busca da produtora inglesa em transitar por diferentes abordagens criativas, porém, solucionando na crueza das batidas um precioso elemento de amarra estrutural. São canções que encolhem e crescem a todo instante, estreitam a relação com diferentes parceiros e potencializam parte do repertório apresentado nos dois primeiros discos da artista, porém, deixando o caminho abertura para os futuros lançamentos e novas colaborações, como uma obra viva e em constante processo de transformação.

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Jornalista, criador do Música Instantânea e integrante do podcast Vamos Falar Sobre Música. Já passou por diferentes publicações de Editora Abril, foi editor de Cultura e Entretenimento no Huffington Post Brasil, colaborou com a Folha de S. Paulo e trabalhou com Brand Experience e Creative Copywriter em marcas como Itaú e QuintoAndar. Pai do Pudim, “ataca de DJ” nas horas vagas e adora ganhar discos de vinil de presente.

Jornalista, criador do Música Instantânea e integrante do podcast Vamos Falar Sobre Música. Já passou por diferentes publicações de Editora Abril, foi editor de Cultura e Entretenimento no Huffington Post Brasil, colaborou com a Folha de S. Paulo e trabalhou com Brand Experience e Creative Copywriter em marcas como Itaú e QuintoAndar. Pai do Pudim, “ataca de DJ” nas horas vagas e adora ganhar discos de vinil de presente.