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Crítica

Marina Herlop

: "Nekkuja"

Ano: 2023

Selo: Pan

Gênero: Art Pop

Para quem gosta de: Björk e Lucrecia Dalt

Ouça: La Alhambra e Reina Mora

8.0
8.0

Marina Herlop: “Nekkuja”

Ano: 2023

Selo: Pan

Gênero: Art Pop

Para quem gosta de: Björk e Lucrecia Dalt

Ouça: La Alhambra e Reina Mora

/ Por: Cleber Facchi 12/01/2024

Incerta sobre a própria trajetória artística e emocionalmente abalada por conta do período de isolamento vivido durante a pandemia de Covid-19, Marina Herlop começou a se imaginar como uma jardineira. Em casa, fechava os olhos e se via arrancando ervas daninhas em uma representação metafórica sobre as lembranças dolorosas que buscava expurgar. O resultado desse curioso processo de contemplação está na entrega de Nekkuja (2023, Pan), obra em que passeia por entre as flores e paisagens esverdeadas de um jardim conceitual que serve de passagem para um território criativo íntimo da compositora espanhola.

Ponto de partida para esse mundo mágico, Busa funciona como uma eficiente composição de abertura. São pouco mais de três minutos em que Herlop se aprofunda no uso de ambientações sutis, texturas e vozes que se revelam ao público em uma medida particular de tempo. Um delicado exercício criativo que acolhe e provoca na mesma proporção, vide o uso de ruídos ocasionais que rompem com esse conceito idílico e trazem o trabalho de volta à realidade. É como uma manifestação do refúgio conceitual montado pela artista dentro da própria cabeça. Um misto de calmaria e caos que tinge com incerteza os rumos da obra.

Dado esse primeiro passo dentro do trabalho, Cosset, vinda logo em seguida, se projeta de forma ainda mais decidida. Ainda que as ambientações etéreas de Herlop corram ao fundo da composição, o que se percebe é uma maior imposição no uso das vozes e na construção das batidas. “Eu tenho um pedaço de luz em minhas mãos“, repete a artista, reforçando o direcionamento esperançoso que serve de sustento ao registro. Oscilações poéticas e instrumentais que pouco avançam criativamente quando próximas do material entregue no lançamento anterior, Pripyat (2022), porém, fascinantes durante toda sua execução.

Em Karada, por exemplo, Herlop parece jogar com os instantes, investindo na construção de uma faixa que muda de direção a todo momento. Uma excitante combinação de estilos que evoca nomes como Björk e Joanna Newsom, brinca com a interpretação do ouvinte e abre passagem para o que talvez seja uma das principais músicas do álbum, La Alhambra. Do uso das vozes, passando pela formatação das batidas, tudo parece convergir para esse ponto do trabalho. “Não os deixe adormecer / Cante alto para que eles não adormeçam“, estimula a artista que ainda articula uma verdadeira explosão de sons, ritmos e sensações.

Embora seja o ápice do trabalho, La Alhambra está longe de parecer a única faixa de enorme impacto em Nekkuja. Exemplo disso fica evidente com a chegada da composição seguinte, Reina Mora, música que segue a trilha apontada pela artista logo nos minutos iniciais do registro, porém, destaca a relação com a produção eletrônica. É como um remix torto de tudo aquilo que a cantora havia testado no disco anterior. Batidas e vozes fragmentadas que se completam pela chegada da canção seguinte, um interlúdio que destaca o uso de captações de campo sem necessariamente romper com o experimentalismo do álbum.

Mais do que uma inserção aleatória, esse respiro momentâneo assume a função de encaminhar o disco para a derradeira Babel. Talvez contida quando próxima das músicas que a antecedem, a faixa de três minutos mais uma vez destaca o lado contemplativo do material, repetindo parte dos versos explícitos na introdutória Busa. “Acima de você apenas as flores“, canta a artista. Todo esse comprometimento estético por parte de Herlop resulta na formação de um repertório que dá voltas em torno de um mesmo território conceitual, porém, nunca previsível, efeito direto da potência criativa que move as canções da musicista.

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Jornalista, criador do Música Instantânea e integrante do podcast Vamos Falar Sobre Música. Já passou por diferentes publicações de Editora Abril, foi editor de Cultura e Entretenimento no Huffington Post Brasil, colaborou com a Folha de S. Paulo e trabalhou com Brand Experience e Creative Copywriter em marcas como Itaú e QuintoAndar. Pai do Pudim, “ataca de DJ” nas horas vagas e adora ganhar discos de vinil de presente.

Jornalista, criador do Música Instantânea e integrante do podcast Vamos Falar Sobre Música. Já passou por diferentes publicações de Editora Abril, foi editor de Cultura e Entretenimento no Huffington Post Brasil, colaborou com a Folha de S. Paulo e trabalhou com Brand Experience e Creative Copywriter em marcas como Itaú e QuintoAndar. Pai do Pudim, “ataca de DJ” nas horas vagas e adora ganhar discos de vinil de presente.