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Crítica

Mdou Moctar

: "Funeral For Justice"

Ano: 2024

Selo: Matador

Gênero: Rock

Para quem gosta de: Bombino e Tinariwen

Ouça: Imouhar e Sousoume Tamacheq

8.3
8.3

Mdou Moctar: “Funeral For Justice”

Ano: 2024

Selo: Matador

Gênero: Rock

Para quem gosta de: Bombino e Tinariwen

Ouça: Imouhar e Sousoume Tamacheq

/ Por: Cleber Facchi 21/05/2024

Em meados de 2023, enquanto excursionavam pelos Estados Unidos para promover o elogiado Afrique Victime (2021), Mahamadou Souleymane e seus parceiros no Mdou Moctar foram surpreendidos com a notícia de que não poderiam regressar ao país de origem, Níger, na região Oeste do continente africano, por conta de um golpe de estado. Longe de casa e inspirados pelos recentes acontecimentos, o quarteto encontrou o estímulo que faltava para trabalhar no repertório de Funeral For Justice (2024, Matador).

De forte caráter político, como tudo aquilo que a banda tem incorporado desde as primeiras empreitadas em estúdio, Funeral For Justice sustenta na construção dos versos uma reflexão atenta sobre o impacto do colonialismo europeu no continente africano e a herança do domínio francês em Níger. Em geral, são letras curtas e cíclicas, porém, sempre impactantes, como uma potencialização das temáticas que embalam as criações do grupo desde o amadurecimento artístico e consolidação explícita em Ilana: The Creator (2019).

A diferença em relação aos trabalhos mais recentes do quarteto, como o já citado Afrique Victime, está na maior ferocidade explícita no tratamento dado aos arranjos. A própria faixa-título do disco, posicionada na abertura do álbum, funciona como uma boa representação desse resultado adotado pela banda. São pouco mais de três minutos em que as guitarras de Souleymane se completam pela bateria marcada de Ibrahim, estrutura que ainda abre passagem para o inflamado coro de vozes que parece avançar sobre o ouvinte.

Claro que essa maior crueza no uso dos instrumentos não diminui a riqueza de ideias e sempre meticuloso processo de criação que vem sendo aprimorado desde Ilana: The Creator. Exemplo disso fica mais do que evidente em Imouhar. Originalmente lançada como parte do EP Niger Vol. 1 (2022), a canção foi aos poucos sendo lapidada pela banda em cima dos palcos, destacando as guitarras de Souleymane que se completam pela base rítmica de Ahmoudou Madassane e refinada pela produção caprichada do baixista Mikey Coltun.

Vem justamente dessa atmosfera ao vivo o estímulo para algumas das principais faixas do trabalho. Em Sousoume Tamacheq, por exemplo, o acompanhamento das palmas e vozes em coro transporta para dentro de estúdio a mesma potência explícita nas performances do grupo em cima do palco. O mesmo pode ser percebido em Tchinta, canção que ganha forma e cresce aos poucos, seguida pelo interlúdio de Djallo #1 e a força avassaladora de Oh France, composição que destaca o discurso político do quarteto.

É como se cada composição abrisse passagem para a música seguinte, proposta que vez ou outra tende ao uso de pequenas repetições e estruturas bastante similares, mas que oferece ao público boas surpresas. A própria música de encerramento, Modern Slaves, com vozes e guitarras comportadas levam o disco para direções totalmente improváveis. Um espaço permanentemente aberto às possibilidades, como um refúgio criativo compartilhado pelo quarteto em um dos momentos mais delicados da carreira do Mdou Moctar.

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Jornalista, criador do Música Instantânea e integrante do podcast Vamos Falar Sobre Música. Já passou por diferentes publicações de Editora Abril, foi editor de Cultura e Entretenimento no Huffington Post Brasil, colaborou com a Folha de S. Paulo e trabalhou com Brand Experience e Creative Copywriter em marcas como Itaú e QuintoAndar. Pai do Pudim, “ataca de DJ” nas horas vagas e adora ganhar discos de vinil de presente.

Jornalista, criador do Música Instantânea e integrante do podcast Vamos Falar Sobre Música. Já passou por diferentes publicações de Editora Abril, foi editor de Cultura e Entretenimento no Huffington Post Brasil, colaborou com a Folha de S. Paulo e trabalhou com Brand Experience e Creative Copywriter em marcas como Itaú e QuintoAndar. Pai do Pudim, “ataca de DJ” nas horas vagas e adora ganhar discos de vinil de presente.