Image
Crítica

NoPorn

: "Sim"

Ano: 2021

Selo: Independente

Gênero: Eletrônica, Electropop, Synthpop

Para quem gosta de: Letrux, Teto Preto e Zopelar

Ouça: Festa no Meu Quarto e Geleia de Morango

7.5
7.5

NoPorn: “Sim”

Ano: 2021

Selo: Independente

Gênero: Eletrônica, Electropop, Synthpop

Para quem gosta de: Letrux, Teto Preto e Zopelar

Ouça: Festa no Meu Quarto e Geleia de Morango

/ Por: Cleber Facchi 30/04/2021

“Vou te chamar pra uma festa. Você vem?”

O convite lançado por Liana Padilha logo nos primeiros minutos de Festa no Meu Quarto, música de abertura do atmosférico Sim (2021, Independente), funciona como um delicioso exercício de preparação para material entregue no terceiro e mais recente trabalho de estúdio do NoPorn. São jogos de palavras, narrativas noturnas e versos sempre descritivos que se espalham em meio a camadas de sintetizadores e batidas cuidadosamente encaixadas, efeito direto de produção atenta de Lucas Freire, ocupando o espaço antes assumido por Luca Lauri, ainda parceiro de Padilha em parte expressiva das composições. Um lento desvendar de ideias e experiências sensoriais, como uma parcial fuga da agitação explícita em algumas das principais criações da artista, como Baile de Peruas.

E essa mesma abordagem criativa, sempre econômica, fica bastante evidente durante toda a porção inicial do registro. São músicas como Enfeite de Cabelo e Leis da Física em que a voz declamada de Padilha funciona como um elemento de condução para o ouvinte, convidado a se perder em meio a versos provocativos (“Disse assim / Mais tarde / Quero ver você nua“) e momentos de maior entrega sentimental (“Eu vou colar em você / Tudo pode acontecer / Eu e você / No mesmo lugar“). Canções que passeiam em meio a reverberações nostálgicas, batidas e ambientações sintéticas que não necessariamente apontam para as pistas, mas convidam o ouvinte a dançar, como se pensadas para os momentos de maior solidão e isolamento forçado por conta da pandemia de Covid-19.

Entretanto, a grande beleza de Sim está justamente na capacidade da dupla paulistana em transportar a mente do ouvinte para fora desse ambiente de caos pandêmico. E isso fica bastante evidente no que talvez seja a principal faixa do disco, Praia de Artista. Uma das composições que mais se aproximam dos primeiros registros do NoPorn, a música parte da mesma base atmosférica presente no restante da obra, porém, estabelece na construção de cenas e acontecimentos quase descritivos a passagem para um ambiente de maior euforia. “Eles vão chegando / Eu chego / Conheço desde o começo“, canta Padilha, narradora e protagonista desse cenário dominado por personagens vazios que surgem e desaparecem enquanto Freire brinca com a construção ritmada das batidas.

Não por acaso, Praia de Artista serve de passagem para o lado menos contido do álbum. E isso fica bastante evidente na dobradinha composta por Pérola Suja e Slow Sex. Enquanto a poesia de Padilha ganha novo fôlego – “Quem nos visse ali, não conseguiria ver nada / Além de sexo” –, Freire parece jogar com as possibilidades, fazendo da criativa colisão de ritmos um componente de estímulo para a porção seguinte do trabalho. São batidas que abandonam a atmosfera contida da club house para mergulhar no som abrasivo do funk carioca, conceito reforçado pelo uso de samples e sintetizadores cada vez mais inexatos. Instantes em que a dupla esbarra no mesmo território versátil de obras como Sla Radical Dance Disco Club (1990), de Fernanda Abreu, porém, preservando a própria identidade.

Uma vez imerso nesse cenário, Sim costura passado e presente em uma criativa combinação de ritmos que rompe com a base minimalista do bloco inicial. Mesmo a voz da cantora surge como um importante componente rítmico, conceito reforçado em músicas como Baba Bombom (“Pele, perna, puta, porra, poro, pelo, pau duro“), mas que ganha ainda mais destaque em Geleia de Morango, faixa que rapidamente convida o ouvinte a dançar. Claro que isso não interfere na produção de composições talvez menores, como Butterfly, registro que tropeça na nas nas limitações vocais de Padilha e letra excessivamente simples. A própria canção de encerramento, Noites Longe do Mar, nasce como uma fuga do restante do álbum, lembrando os momentos mais sensíveis de Marina Lima.

Tamanha riqueza de detalhes e busca por novas possibilidades faz de Sim uma obra ainda mais interessante do que o material entregue no antecessor Boca (2016). Trata-se de registro essencialmente contido quando próximo do trabalho apresentado há cinco anos, mas não menos expressivo. São ambientações minimalistas, ruídos sintéticos e incontáveis camadas instrumentais que, pouco a pouco, capturam atenção do ouvinte. Canções que passeiam pela noite paulistana, resgatando experiências sentimentais vividas por Padilha, mas que a todo momento revelam momentos de maior conexão com o público, efeito direto da poesia delirante que flutua em meio a paisagens urbanas e personagens ambíguos, como uma extensão natural de tudo aquilo que o NoPorn tem produzido desde o início da carreira.

Ouça também:

Jornalista, criador do Música Instantânea e integrante do podcast Vamos Falar Sobre Música. Já passou por diferentes publicações de Editora Abril, foi editor de Cultura e Entretenimento no Huffington Post Brasil, colaborou com a Folha de S. Paulo e trabalhou com Brand Experience e Creative Copywriter em marcas como Itaú e QuintoAndar. Pai do Pudim, “ataca de DJ” nas horas vagas e adora ganhar discos de vinil de presente.

Jornalista, criador do Música Instantânea e integrante do podcast Vamos Falar Sobre Música. Já passou por diferentes publicações de Editora Abril, foi editor de Cultura e Entretenimento no Huffington Post Brasil, colaborou com a Folha de S. Paulo e trabalhou com Brand Experience e Creative Copywriter em marcas como Itaú e QuintoAndar. Pai do Pudim, “ataca de DJ” nas horas vagas e adora ganhar discos de vinil de presente.