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Crítica

Os Amantes

: "Os Amantes"

Ano: 2021

Selo: Independente

Gênero: Pop Rock, MPB

Para quem gosta de: Gaby Amarantos e MC Tha

Ouça: Linda, Ninguém e Bye!

7.5
7.5

Os Amantes: “Os Amantes”

Ano: 2021

Selo: Independente

Gênero: Pop Rock, MPB

Para quem gosta de: Gaby Amarantos e MC Tha

Ouça: Linda, Ninguém e Bye!

/ Por: Cleber Facchi 21/06/2021

Mesmo que de forma torta, a música de Jaloo sempre funcionou como uma celebração à cultura paraense. Da estreia com #1 (2015), de onde vieram composições como Pa Parará, passando pelo encontro com conterrâneos como Gaby Amarantos, sobram momentos em que o cantor, compositor e produtor incorpora ritmos locais e confessa o fascínio pela região em que nasceu de maneira sensível. E isso fica ainda mais evidente com a chegada de Os Amantes (2021, Independente), primeiro registro da parceria com Léo Chermont (guitarra e efeitos) e Arthur Kunz (bateria e programações), da Strobo, e um precioso exercício criativo que utiliza de cenários, memórias e sensações que parecem apontar para o norte do país em uma abordagem tão referencial quanto intimista e autoral.

Perfeita combinação entre o que há de melhor na obra de cada colaborador, como o lirismo agridoce de Jaloo e as estruturas melódicas de Kunz e Chermont, o trabalho de dez faixas se revela aos poucos, em pequenas doses. São mordidas suculentas, bem representadas pela imagem de capa do disco, com a fotografia de um jambo, fruto típico da região norte. “Amante: ama e trai / Chega e sai / Instiga e afasta / Cúmplice de nada“, declama o cantor, logo nos primeiros minutos do álbum, na introdutória Batismo, apontando a direção seguida pelo trio ao longo do trabalho. Confissões e versos sensíveis, direcionamento reforçado no encaixe com Linda, segunda faixa do disco, minutos à frente. “Linda, te amo hoje mais ainda / E eu tô desesperado / Querendo você, vem“, cresce a letra da canção, sempre adornada pelo uso de guitarras regionais e fino toque de dramaticidade, típico do brega paraense.

Esse mesmo direcionamento, porém, partindo de uma abordagem ensolarada, acaba se refletindo na composição seguinte, Colchão. Enquanto as guitarras evocam Preta Pretinha, dos Novos Baianos, Jaloo utiliza da letra como um delicioso convite. “Não se avexe não / Tem o meu colchão“, provoca. São versos sempre acolhedores, proposta que ganha ainda mais destaque na música seguinte, Cotijuba. Passeio sonoro por diferentes paisagens paraenses (“Lá, no meu Pará / Tem tanta coisa pra desbravar / Meu bem, lá em Santarém / Nem de carro ou trem dá pra chegar“), a canção mostra a capacidade do trio em capturar a atenção do ouvinte em uma criativa combinação de ritmos e formas cantaroláveis, tratamento que respinga no registro seguinte, a também acessível Undererê.

Passado o breve respiro em Preceito, canção regida pelos sentimentos e versos intimistas de Jaloo (“Não fazer nada / Pode ser libertador / E foi com você / Que eu aprendi essa lição“), o trio paraense abre passagem para o lado mais sensível e inventivo da obra. Exemplo disso acontece na já conhecida Ninguém. Primeira composição do disco a ser apresentada ao público, a faixa imersa em sintetizadores mostra a capacidade do grupo em transformar as próprias emoções em um importante componente de diálogo com o ouvinte. “Assim curado desse fardo eu penso / ‘Amor também é se encontrar’ / Em ninguém“, canta. Fragmentos poéticos em que a vulnerabilidade transborda, como um contraponto à crueza exposta na faixa seguinte, Bye, com menos de dois minutos de duração.

Com a chegada de Penúltima, nona composição do disco, o trio exclui completamente o uso das vozes, porém, preserva a forte carga emocional. São delicadas camadas instrumentais, guitarras que apontam para o pós-rock de nomes como Explosions in the Sky e Mogwai, e sintetizadores delirantes, como uma interpretação ainda mais complexa do material entregue Ninguém. Essa mesma atmosfera densa encaminha o ouvinte para a canção seguinte, Livre. Faixa de encerramento do trabalho, a música que evoca Radiohead rompe com qualquer direção criativa previamente explorada pelo trio, sufocando o pop ensolarado que embala o bloco inicial do disco. “Dá pra se divertir sem mergulhar demais / Você merece sentir sem se doar demais“, reflete em um misto de dor e libertação.

Nesse sentido, a homônima estreia d’Os Amantes funciona muito mais como um exercício criativo do que uma obra fechada. Enquanto os minutos iniciais do álbum potencializam, por vezes de forma previsível, tudo aquilo que Jaloo e Strobo tem realizado em seus registros autorais, o bloco seguinte mostra a capacidade do trio em se reinventar dentro de estúdio. Utilizando do lirismo sentimental como um precioso componente de amarra, a banda vai de um canto a outro sem necessariamente fazer disso o estímulo para um trabalho confuso. São costuras e sobreposições estéticas que mudam de direção sem ordem aparente. Instantes de maior euforia que antecedem momentos de evidente angústia e recolhimento, como um caminho aberto para futuros lançamentos e possíveis reencontros.

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Jornalista, criador do Música Instantânea e integrante do podcast Vamos Falar Sobre Música. Já passou por diferentes publicações de Editora Abril, foi editor de Cultura e Entretenimento no Huffington Post Brasil, colaborou com a Folha de S. Paulo e trabalhou com Brand Experience e Creative Copywriter em marcas como Itaú e QuintoAndar. Pai do Pudim, “ataca de DJ” nas horas vagas e adora ganhar discos de vinil de presente.

Jornalista, criador do Música Instantânea e integrante do podcast Vamos Falar Sobre Música. Já passou por diferentes publicações de Editora Abril, foi editor de Cultura e Entretenimento no Huffington Post Brasil, colaborou com a Folha de S. Paulo e trabalhou com Brand Experience e Creative Copywriter em marcas como Itaú e QuintoAndar. Pai do Pudim, “ataca de DJ” nas horas vagas e adora ganhar discos de vinil de presente.