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Crítica

PJ Harvey

: "I Inside the Old Year Dying"

Ano: 2023

Selo: Partisan

Gênero: Rock

Para quem gosta de: Patti Smith e Cat Power

Ouça: I Inside the Old I Dying e Prayer at the Gate

8.0
8.0

PJ Harvey: “I Inside the Old Year Dying”

Ano: 2023

Selo: Partisan

Gênero: Rock

Para quem gosta de: Patti Smith e Cat Power

Ouça: I Inside the Old I Dying e Prayer at the Gate

/ Por: Cleber Facchi 17/07/2023

Uma vez que você adentra o ambiente enigmático apresentado por PJ Harvey em I Inside the Old Year Dying (2023, Partisan), difícil querer sair. Livre da urgência que marca os trabalhos mais conhecidos e talvez imediatos da cantora e compositora britânica, como Rid of Me (1993) e Stories from the City, Stories from the Sea (2000), o registro produzido em parceria com Flood e John Parish, com quem a artista tem colaborado desde a década de 1990, segue uma trilha bastante particular. São canções que avançam em uma medida própria de tempo, fazendo da atmosfera misteriosa um precioso atrativo para o ouvinte.

Próximo e ao mesmo tempo distante de outros trabalhos que refletem o lado contemplativo de Harvey, como White Chalk (2007) e A Woman a Man Walked By (2009), esse último, assinado em parceria com Parish, I Inside the Old Year Dying utiliza de uma abordagem singular, talvez única, dentro da extensa discografia da cantora. Seja pela escolha em investir na construção de um repertório marcado pelo reducionismo dos elementos, ou pelo hermetismo dado aos versos, cada fragmento do registro de doze composições parece pensado para ser desvendado pelo ouvinte. E as “pistas” estão por todas as partes.

São espelhamentos com passagens bíblicas, fragmentos extraídos da obra de poetas ingleses, diálogos com a própria produção literária da artista e cenas paisagísticas que percorrem as florestas mais densas da Inglaterra. É como uma representação poética e instrumental do refúgio criado por Harvey durante o período pandêmico, o que explica parte do caráter abstrato e delirante atravessamentos de informações durante toda a execução do material. Um espaço de imersão que acaba se refletindo no direcionamento dado aos arranjos, vide o uso sempre retorcido dos instrumentos que se comportam de forma pouco usual.

Música escolhida para anunciar a chegada do disco, A Child’s Question, August funciona como uma boa representação desse resultado. Enquanto os versos tratam sobre a passagem do tempo e a relação com o amor a partir de observações sobre os pássaros e a natureza, musicalmente, Harvey e seus parceiros de produção se aventuram na construção de uma base ausente de forma, como uma textura expandida. Surgem ainda captações de campo, vozes submersas e pequenas experimentações, como em The Nether-Edge, que fazem lembrar das criações que Parish tem desenvolvido em estúdio com Aldous Harding.

Mesmo quando rompe com essa abordagem e utiliza de uma estrutura próxima do convencional, Harvey continua a testar os próprios limites e a interpretação do ouvinte. Exemplo disso fica bastante evidente em I Inside The Old I Dying, composição de base acústica que trilha o caminho soturno de White Chalk, porém, de forma sempre inexata, torta, e que ainda chama a atenção pelos versos trabalhados no dialeto de Dorset. Nada que prepare o público para o material entregue na derradeira A Noiseless Noise, faixa em que utiliza trechos da obra do poeta romântico John Keats e, pela primeira vez dentro do disco, destaca o uso ruidoso das guitarras, como um aceno para alguns de seus principais registros, como To Bring You My Love (1995).

Obra de digestão difícil, como tudo aquilo que a cantora tem explorado desde a entrega do denso Let England Shake (2011), I Inside the Old Year Dying é um trabalho que recompensa na mesma medida em que exige do ouvinte. Mesmo que muitas das composições utilizem de uma abordagem excessivamente reducionista e partilhem de pequenas repetições estruturais que vão do uso das vozes ao tratamento dado aos arranjos, difícil não se deixar conduzir pelo lento desvendar de informações que move o registro. São criações talvez impensadas quando voltamos os ouvidos para os primeiros e sempre enérgicos discos da artista, porém, consistentes com tudo aquilo que Harvey tem se aventurado ao longo da última década.

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Jornalista, criador do Música Instantânea e integrante do podcast Vamos Falar Sobre Música. Já passou por diferentes publicações de Editora Abril, foi editor de Cultura e Entretenimento no Huffington Post Brasil, colaborou com a Folha de S. Paulo e trabalhou com Brand Experience e Creative Copywriter em marcas como Itaú e QuintoAndar. Pai do Pudim, “ataca de DJ” nas horas vagas e adora ganhar discos de vinil de presente.

Jornalista, criador do Música Instantânea e integrante do podcast Vamos Falar Sobre Música. Já passou por diferentes publicações de Editora Abril, foi editor de Cultura e Entretenimento no Huffington Post Brasil, colaborou com a Folha de S. Paulo e trabalhou com Brand Experience e Creative Copywriter em marcas como Itaú e QuintoAndar. Pai do Pudim, “ataca de DJ” nas horas vagas e adora ganhar discos de vinil de presente.