Image
Crítica

Sampha

: "Lahai"

Ano: 2023

Selo: Young

Gênero: R&B

Para quem gosta de: James Blake e Blood Orange

Ouça: Spirit 2.0, Jonathan L. Seagull e Only

7.6
7.6

Sampha: “Lahai”

Ano: 2023

Selo: Young

Gênero: R&B

Para quem gosta de: James Blake e Blood Orange

Ouça: Spirit 2.0, Jonathan L. Seagull e Only

/ Por: Cleber Facchi 30/10/2023

Seis longos anos se passaram desde que Sampha deu vida ao último trabalho de estúdio, Process (2017). Entretanto, o cantor, compositor e produtor britânico nunca pareceu pressionado por isso. Do momento em que foi revelado ao público, em colaborações com Jessie Ware e SBTRKT no começo da década passada, até apresentar oficialmente o primeiro registro autoral, o instrumentista levou ainda mais tempo do que isso. Como indicado no título da obra que revelou faixas como Blood On Me e (No One Knows Me) Like the Piano, o artista inglês é um homem muito mais interessado pelo processo do que pelo resultado final em si.

Essa ausência de pressa e olhar sempre atento às possibilidades em estúdio fica ainda mais evidente com a chegada de Lahai (2023, Young). Segundo e mais recente álbum de estúdio do artista, o registro não apenas segue em uma medida própria de tempo, como estabelece na fragmentação instrumental e rítmica de cada composição um curioso direcionamento criativo. Longe da linearidade imposta pela indústria, Sampha se concentra nos instantes. São retalhos de vozes, bases detalhistas e batidas que se entrelaçam de maneira sempre inexata, como se partilhassem do mesmo R&B torto de nomes como Blood Orange e Frank Ocean.

Primeira composição do disco a ser entregue ao público, em junho deste ano, Spirit 2.0 funciona como uma clara representação desse resultado. Enquanto os versos funcionam como um bálsamo para os momentos de maior melancolia (“O amor vai te tocar, o espírito vai te tocar / A fé vai te tocar, os amigos vão te tocar“), Sampha vai de um canto à outro da canção enquanto estreita laços com nomes como o produtor espanhol El Guincho, a cantora norte-americana Yaeji e o baterista inglês Yussef Dayes. São ideias, ritmos e propostas criativas talvez divergentes, porém, estranhamente coesas ao serem organizadas pelo artista em estúdio.

Observado atentamente, Lahai soa muito mais como um remix dos conceitos apresentados em Process do que necessariamente o princípio de uma nova fase na carreira do artista inglês. São texturas eletrônicas e processamentos sintéticos que garantem outro significado ao som produzido pelo músico. Claro que essa permanente corrupção dos elementos em nenhum momento interfere no caráter emocional do disco. Com o título da obra inspirada pelo nome do próprio avô, Sampha se aventura na construção de um repertório marcado por questões existenciais e conflitos internos, porém, de forma sempre esperançosa e acolhedora.

Mesmo que tenhamos passado pelas mesmas coisas / Nem sempre significa que sentimos o mesmo“, reflete em Jonathan L. Seagull, música inspirada pelo livro Fernão Capelo Gaivota (1970), do escritor norte-americano Richard Bach, e uma delicada representação da poética contemplativa que o artista busca desenvolver ao longo da obra. São composições que funcionam como um mergulho na mente do próprio compositor, mas que em nenhum momento deixam de dialogar com o ouvinte, direcionamento reforçado principalmente nas faixas mais acessíveis do disco, como Suspended, Can’t Go Back e na crescente Only.

Embora pontuado pela entrega de faixas capazes de dialogar com uma parcela ainda maior de ouvintes, Lahai é o tipo de material que cresce quando nos debruçamos sobre ele, prestando atenção aos mínimos detalhes. São vozes sempre iluminadas, camadas de pianos e encontros que vão do arranjador canadense Owen Pallett à cantora Lisa-Kaindé Diaz, do Ibeyi. Claro que isso não isenta o artista de criações menos expressivas, como a arrastada Evidence e Inclination Compass (Tenderness). Oscilações sutis, mas que, de um jeito ou de outro, compõem o universo sentimental, poético e instrumental detalhado por Sampha.

Ouça também:

Jornalista, criador do Música Instantânea e integrante do podcast Vamos Falar Sobre Música. Já passou por diferentes publicações de Editora Abril, foi editor de Cultura e Entretenimento no Huffington Post Brasil, colaborou com a Folha de S. Paulo e trabalhou com Brand Experience e Creative Copywriter em marcas como Itaú e QuintoAndar. Pai do Pudim, “ataca de DJ” nas horas vagas e adora ganhar discos de vinil de presente.

Jornalista, criador do Música Instantânea e integrante do podcast Vamos Falar Sobre Música. Já passou por diferentes publicações de Editora Abril, foi editor de Cultura e Entretenimento no Huffington Post Brasil, colaborou com a Folha de S. Paulo e trabalhou com Brand Experience e Creative Copywriter em marcas como Itaú e QuintoAndar. Pai do Pudim, “ataca de DJ” nas horas vagas e adora ganhar discos de vinil de presente.