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Ano: 2023

Selo: Ninja Tune

Gênero: Eletrônica, House

Para quem gosta de: DJ Koze e Kelly Lee Owens

Ouça: Si Te Portas Bonito e Estación Esperanza

8.5
8.5

Sofia Kourtesis: “Madres”

Ano: 2023

Selo: Ninja Tune

Gênero: Eletrônica, House

Para quem gosta de: DJ Koze e Kelly Lee Owens

Ouça: Si Te Portas Bonito e Estación Esperanza

/ Por: Cleber Facchi 03/11/2023

Uma celebração à vida. Assim pode ser definido o primeiro trabalho de estúdio da cantora, compositora e produtora peruana Sofia Kourtesis, Madres (Ninja Tune). Concebido em um processo de dor, durante o período em que a mãe da artista passou por um tratamento experimental para se tratar de um câncer, o registro parte desse momento de forte vulnerabilidade emocional, porém, vai além de um único tema. “É sobre minha mãe, a mãe dela, minhas irmãs que são mães, meus irmãos que são mães e todas as pessoas LGBTQIA+ que são mães em suas comunidades“, revelou Kourtesis, no texto que acompanha o material.

Vem justamente desse intenso cruzamento de informações, angústias e conquistas pessoais o estímulo para a montagem de um repertório marcado pela riqueza dos elementos. São composições que apontam para as pistas, como uma extensão natural daquilo a produtora havia incorporado em registros como o EP Fresia Magdalena (2021), porém, partindo de uma abordagem ainda mais sensível e detalhista. Exemplo disso pode ser percebido na autointitulada canção de abertura. Enquanto os versos funcionam como um doce convite ao regresso (“Venha, criança, você que está aí, volte para casa“), camadas de sintetizadores, batidas e texturas ocasionais ampliam os horizontes do álbum que encanta pelo uso de pequenas sobreposições.

É como se Kourtesis partilhasse do mesmo refinamento estético de artistas como DJ Koze e Four Tet, porém, utilizando da própria relação com a cultura latina de forma a favorecer a entrega de um material marcado pelo aspecto radiante. Já conhecida do público, Estación Esperanza funciona como uma boa representação desse resultado. Completa pela participação de Manu Chao, a canção destaca a completa versatilidade da produtora. São pouco mais de cinco minutos em que cantos de pássaros exóticos, captações de campo, uso picotado de vozes e elementos percussivos parecem pensados de forma a estimular os sentidos do ouvinte.

Esse mesma pluralidade de elementos, diferentes andamentos rítmicos e costuras instrumentais acaba se refletindo durante toda a execução do material. Na verdade, é possível passar horas dentro de cada canção a fim de perceber todas as nuances e uso de pequenas acréscimos que marcam o trabalho. Em Si Te Portas Bonito, por exemplo, são vozes que ora servem de base, ora detalham o aspecto lírico da canção. Já em Vajkoczy, inspirada pelo médico Peter Vajkoczy, que operou a mãe da artista, chama a atenção a forma como microambientações e texturas sintéticas ampliam consideravelmente os limites da composição.

Tudo é desenvolvido de forma tão meticulosa e diversa que é praticamente impossível prever qualquer movimento de Kourtesis. O resultado desse processo está na entrega de faixas que começam pequenas, porém, delicadamente conduzem o ouvinte para um mundo mágico, como na transcendental How Music Makes You Feel Better. Mais do que garantir possíveis respostas ou mesmo estabelecer a formação de um repertório padrão, a artista peruana parece interessada em brincar com as possibilidades. Canções que mudam de direção a todo momento, proposta que torna a audição de Madres naturalmente fascinante.

Claro que esse esforço de Kourtesis em testar os limites da própria criação tem seus riscos. Músicas como Moving Houses, por exemplo, se afastam tanto do restante do material que é difícil estabelecer qualquer relação com o ouvinte. É como se Madres assumisse a função de apresentar e ao mesmo tempo ampliar o campo de atuação da produtora. Um corajoso exercício criativo que se conecta diretamente ao período de forte instabilidade experienciado pela peruana nos últimos anos, como se da relação com a morte vivida ao lado da mãe, a artista encontrasse uma delicada fonte de inspiração e estímulo para seguir em frente.

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Jornalista, criador do Música Instantânea e integrante do podcast Vamos Falar Sobre Música. Já passou por diferentes publicações de Editora Abril, foi editor de Cultura e Entretenimento no Huffington Post Brasil, colaborou com a Folha de S. Paulo e trabalhou com Brand Experience e Creative Copywriter em marcas como Itaú e QuintoAndar. Pai do Pudim, “ataca de DJ” nas horas vagas e adora ganhar discos de vinil de presente.

Jornalista, criador do Música Instantânea e integrante do podcast Vamos Falar Sobre Música. Já passou por diferentes publicações de Editora Abril, foi editor de Cultura e Entretenimento no Huffington Post Brasil, colaborou com a Folha de S. Paulo e trabalhou com Brand Experience e Creative Copywriter em marcas como Itaú e QuintoAndar. Pai do Pudim, “ataca de DJ” nas horas vagas e adora ganhar discos de vinil de presente.