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Crítica

Sophia Chablau e Uma Enorme Perda de Tempo

: "Sophia Chablau e Uma Enorme Perda de Tempo"

Ano: 2021

Selo: Risco

Gênero: Indie Rock, Pop Rock, Indie Pop

Para quem gosta de: Ana Frango Elétrico e O Terno

Ouça: Fora do Meu Quarto e Delícia/Luxúria

8.3
8.3

Sophia Chablau e Uma Enorme Perda de Tempo

Ano: 2021

Selo: Risco

Gênero: Indie Rock, Pop Rock, Indie Pop

Para quem gosta de: Ana Frango Elétrico e O Terno

Ouça: Fora do Meu Quarto e Delícia/Luxúria

/ Por: Cleber Facchi 15/04/2021

Nascida da criativa colagem de ideias e referências que apontam para diferentes campos da música, a estreia de Sophia Chablau e Uma Enorme Perda de Tempo é uma obra deliciosamente estranha. São fragmentos de vozes, batidas inexatas, ruídos e captações sujas que se espalham em meio a versos marcados por significados ocultos e indagações feitas para bagunçar a cabeça do ouvinte. “E as brigas dos casais que se unem só pra discutir / Me deixam refletindo se nós somos grandes interruptores de luz / Se sou mais Ravi Shankar ou Jesus“, questiona na introdutória Pop Cabecinha, composição que aponta o caminho torto seguido pelos parceiros Sophia Chablau (voz, guitarra),Téo Serson (baixo), Theo Ceccato (bateria) e Vicente Tassara (guitarra, teclados) até o encerramento do disco.

E é essa mesma imprevisibilidade que torna a experiência de ouvir o trabalho tão satisfatória. Do momento em que tem início, na já citada Pop Cabecinha, até alcançar a derradeira Delícia/Luxúria, canção escolhida para anunciar a chegada do disco, cada composição do álbum funciona como um objeto isolado e curioso. São fragmentos que ora apontam para o pop rock descompromissado de veteranos como Rita Lee e Gang 90 e as Absurdettes, ora fazem lembrar das criações de contemporâneos como O Terno e Ana Frango Elétrico, essa última, convidada a assinar a produção do registro. Instantes de parcial delírio e faixas marcadas pelo completo reducionismo dos arranjos, como uma interpretação ampliada de tudo aquilo que o grupo havia testado durante o lançamento de Idas e Vindas do Amor.

Dividido entre criações radiantes e faixas essencialmente contidas, sempre sensíveis, a homônima estreia do quarteto paulistano vai de um canto a outro sem necessariamente parecer um álbum confuso. Exemplo disso pode ser percebido na própria sequência de abertura do trabalho. São pouco menos de dois minutos em que grupo vai da urgência das batidas e guitarras ao doce recolhimento da Se Você, música adornada pelo uso de temas atmosféricos, mas que cresce na poesia intimista e profunda entrega de Chablau. “Se você / Entendesse o que eu sou / Eu tenho certeza / Cê não ia ficar comigo“, desaba. São versos de essência agridoce, alternando entre o apego doloroso e a busca por libertação, proposta que acaba se refletindo em outros momentos ao longo da obra.

É o caso de Fora do Meu Quarto. Longe da euforia colorida que marca o restante do trabalho, a canção transporta o ouvinte para um território acinzentado, mas não menos detalhista e tocante. Dos pianos e camadas de guitarras assumidas por Tassara às cordas do convidado Fabio Tagliaferri, tudo soa como um complemento ao lirismo entristecido que invade a letra da canção. “Fora do meu quarto você está em qualquer lugar do mundo / Longe do meu peito qualquer canto pode ser melhor / Cada um tem sua maneira de fingir e estar bem“, confessa. Instantes em que Chablau utiliza da própria vulnerabilidade e entrega emocional como um precioso elemento de diálogo com o ouvinte. “Longe perto longe perto / Dentro / Quero você / Dentro / De mim / Assim“, completa.

São justamente esses momentos de maior refinamento que tornam questionáveis algumas das decisões das banda. Canções como Se eu Fiz pra Você uma Não-Canção eu não Podia e Deus Lindo que mais parecem esboços do que versões finalizadas, trazendo uma sensação de vazio ao bloco central do disco. E isso ganha ainda mais força na sequencia final do álbum, quando músicas como Debaixo do Pano e Delícia/Luxúria evidenciam a capacidade do quarteto em testar os próprios limites dentro de estúdio. Experimentações jazzísticas e formas delirantes que refletem o que há de mais inventivo na obra do grupo, conceito reforçado na frenética Moças e Aeromoças, composição que se abre para a chegada da lendária Lucinha Turnbull, colaboradora de nomes como Rita Lee e Gilberto Gil e uma das maiores guitarristas do país.

Entretanto, como apontado logo nos primeiros minutos do trabalho, a grande beleza do som produzido por Sophia Chablau e Uma Enorme Perda de Tempo não está na capacidade do ouvinte em antecipar possíveis movimentos e tendências, mas em se surpreender pela sonoridade inexata do quarteto, mesmo que de maneira desconfortável. Um ziguezaguear de ideias que esbarra em momentos de maior comoção e faixas conceitualmente acessíveis, porém, incapazes de perverter a essência curiosa que embala as criações da banda desde os primeiros minutos da obra. Canções que confessam referências, entortam e crescem de forma sempre irregular, indicativo de um grupo em permanente busca da própria identidade criativa, ainda que seguro do percurso assumido durante toda a execução da registro.

Ouça também:

Jornalista, criador do Música Instantânea e integrante do podcast Vamos Falar Sobre Música. Já passou por diferentes publicações de Editora Abril, foi editor de Cultura e Entretenimento no Huffington Post Brasil, colaborou com a Folha de S. Paulo e trabalhou com Brand Experience e Creative Copywriter em marcas como Itaú e QuintoAndar. Pai do Pudim, “ataca de DJ” nas horas vagas e adora ganhar discos de vinil de presente.

Jornalista, criador do Música Instantânea e integrante do podcast Vamos Falar Sobre Música. Já passou por diferentes publicações de Editora Abril, foi editor de Cultura e Entretenimento no Huffington Post Brasil, colaborou com a Folha de S. Paulo e trabalhou com Brand Experience e Creative Copywriter em marcas como Itaú e QuintoAndar. Pai do Pudim, “ataca de DJ” nas horas vagas e adora ganhar discos de vinil de presente.