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Crítica

Space Afrika

: "Honest Labour"

Ano: 2021

Selo: Dais

Gênero: Experimental, Música Ambiente

Para quem gosta de: Andy Stott, Burial e Lee Gamble

Ouça: Yyyyyy2222, B£E e Lose You Beau

8.0
8.0

Space Afrika: “Honest Labour”

Ano: 2021

Selo: Dais

Gênero: Experimental, Música Ambiente

Para quem gosta de: Andy Stott, Burial e Lee Gamble

Ouça: Yyyyyy2222, B£E e Lose You Beau

/ Por: Cleber Facchi 03/01/2022

Originais da cidade de Manchester, na Inglaterra, porém, descendentes de nigerianos e hoje residentes em Berlim, capital da Alemanha, os parceiros Joshua Inyang e Joshua Reid sempre fizeram desse precioso cruzamento de informações um estímulo para a própria obra. E isso fica bastante evidente nas canções de Somewhere Decent To Live (2018), primeiro registro da dupla a alcançar uma parcela maior do público e uma clara síntese de tudo aquilo que os dois artistas vinham produzindo desde o início da década, vide o material entregue em Above the Concrete​/​Below the Concrete (2014) e Primrose Avenue (2015).

É justamente dentro desse mesmo território criativo, conceitualmente diverso e inexato, porém, partindo de uma medida própria de tempo, sem pressa, que os dois produtores estabelecem as bases de Honest Labour (2021, Dais). Ainda menos urgente em relação ao repertório apresentado em Somewhere Decent To Live, o trabalho, assim como o antecessor hybtwibt? (2020), revelado há poucos meses, estabelece na permanente sobreposição dos elementos a passagem para um território próprio da dupla inglesa. São ruídos urbanos, texturas, batidas eletrônicas e fragmentos de vozes que se espalham em um labirinto de sons e sensações.

E isso fica bem representado na própria imagem de capa do disco, com a fotografia soturna do que parece ser um ponto de ônibus em uma noite chuvosa. É como uma representação visual do repertório impreciso que a dupla busca desenvolver ao longo do trabalho. Canções que partem do lento desvendar de cada elemento de forma a capturar a atenção do ouvinte, jogando com a imprevisibilidade no encaixe dos componentes. Não por acaso, a associação com Untrue (2007), de Burial, surge de maneira quase imediata, como uma interpretação em câmera lenta de tudo aquilo que William Bevan tem explorado criativamente.

A principal diferença em relação a outros nomes da cena inglesa, incluindo o próprio Space Afrika nos trabalhos anteriores, está na forma como Inyang e Reid buscam desenvolver um registro para além do forte aspecto abstrato. São diálogos sobre o real significado do amor e temas existencialistas que escancaram a melancolia vivida pelos indivíduos durante o período de isolamento social. Mesmo a base instrumental do disco, adornada por arranjos de cordas, sintetizadores e guitarras sorumbáticas, garante ao álbum um novo resultado, direcionamento explícito em músicas como a delicada LV e na derradeira faixa-título.

Embora marcado por novas possibilidades e canções que parecem pensadas para estreitar a relação com o ouvinte, Honest Labour em nenhum momento tende ao óbvio, transitando por caminhos pouco usuais. Do momento em que tem início, em yyyyyy2222, com suas ambientações que parecem saídas da trilha sonora de Twin Peaks, passando pelo experimentalismo de músicas como Loose You Beau e Ladybird Drone, evidente é o esforço da dupla inglesa em testar os próprios limites. Mesmo o diálogo com diferentes colaboradores parece contribuir para esse resultado, ampliando o campo de atuação do registro.

Não por acaso, Honest Labour é um trabalho que exige tempo até se revelar por completo para o ouvinte. São canções que ganham forma em meio a ambientações etéreas, vozes tratadas como instrumentos e batidas que mudam de direção a todo instante, fazendo de cada composição apresentada ao longo da obra, mesmo as mais econômicas e efêmeras, um importante exercício criativo. Das rimas que tomam conta de B£E ao experimentalismo macio de Rings, criação que partilha do mesmo pop torto de Tirzah, perceba como Inyang e Reid preservam e pervertem a própria essência durante toda a execução do material.

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Jornalista, criador do Música Instantânea e integrante do podcast Vamos Falar Sobre Música. Já passou por diferentes publicações de Editora Abril, foi editor de Cultura e Entretenimento no Huffington Post Brasil, colaborou com a Folha de S. Paulo e trabalhou com Brand Experience e Creative Copywriter em marcas como Itaú e QuintoAndar. Pai do Pudim, “ataca de DJ” nas horas vagas e adora ganhar discos de vinil de presente.

Jornalista, criador do Música Instantânea e integrante do podcast Vamos Falar Sobre Música. Já passou por diferentes publicações de Editora Abril, foi editor de Cultura e Entretenimento no Huffington Post Brasil, colaborou com a Folha de S. Paulo e trabalhou com Brand Experience e Creative Copywriter em marcas como Itaú e QuintoAndar. Pai do Pudim, “ataca de DJ” nas horas vagas e adora ganhar discos de vinil de presente.