Image
Crítica

Sufjan Stevens

: "Convocations"

Ano: 2021

Selo: Asthmatic Kitty

Gênero: Eletrônica, Música Ambiente

Para quem gosta de: Brian Eno e Stars of The Lid

Ouça: Meditation II e Celebration X

7.5
7.5

Sufjan Stevens: “Convocations”

Ano: 2021

Selo: Asthmatic Kitty

Gênero: Eletrônica, Música Ambiente

Para quem gosta de: Brian Eno e Stars of The Lid

Ouça: Meditation II e Celebration X

/ Por: Cleber Facchi 25/05/2021

Em setembro do último ano, dois dias após o lançamento de The Ascension (2020), primeiro trabalho em carreira solo desde o cultuado Carrie & Lowell (2015), Sufjan Stevens foi pego de surpresa com a notícia do falecimento do próprio pai, Rasjid. Consumido pela dor, o músico decidiu utilizar das angustias e sentimentos vividos durante o período como estímulo para a produção de um extenso repertório em que não apenas explora as diferentes fases do luto, como busca se restabelecer emocionalmente. O resultado desse processo está nas canções do delicado Convocations (2021, Asthmatic Kitty), registro de 49 faixas em que utiliza de melodias atmosféricas e incontáveis camadas de sintetizadores como precioso componente de condução para a montagem das composições.

Dividido em cinco volumes, Convocations estabelece no primeiro deles, Meditations, a passagem para o lado mais doloroso do trabalho. São canções que potencializam o baque sentimental causado pela morte, efeito direto do uso de melodias entristecidas e captações sintéticas que parecem emular outros instrumentos e vozes. Exemplo disso fica bastante evidente em Meditation II, com suas ambientações fúnebres que parecem captadas ao fundo de uma igreja, e Meditation VIII, música de essência cósmica, por vezes íntima do material entregue no etéreo Aporia (2020), porém, adornada pelo uso de sintetizadores que se projetam como coro de vozes. Instantes em que o músico norte-americano estreita a relação com o ouvinte e apresenta parte expressiva do conceito da obra.

Esse mesmo direcionamento criativo, porém, partindo de uma abordagem ainda mais dolorosa, acaba se refletindo na porção seguinte do trabalho, em Lamentations. São inserções minimalistas que se espalham em uma cama de ambientações ruidosas, por vezes sombrias, dialogando diretamente com o título do álbum. Um lento desvendar de cada elemento, estrutura que também parece envolver o ouvinte, mesmo partindo de uma montagem não-linear. E isso fica bastante evidente na atmosfera sufocante de Lamentation VIII, composição que parece trabalhada em reverso, de trás para frente, como se pensada para causar desconforto. Ruídos e maquinações entristecidas que mudam de direção a todo instante, como um preparativo para o material entregue no volume seguinte do disco.

Intitulado Revelations, o repertório de dez faixas alcança um ponto de equilíbrio entre a melancolia explícita no bloco inicial e as canções apresentadas na metade seguinte. E isso fica bastante evidente logo nos primeiros minutos da obra, em Revelation I, são pouco mais de três minutos em que Stevens alterna entre momentos de maior experimentação e melodias aprazíveis, por vezes ensolaradas, como pontos luminosos em um cenário ainda soturno e consumido pela dor. Não por acaso, os minutos finais do registo, como em Revelation VII e Revelation X evidenciam a produção de um material totalmente acolhedor. Nada que prejudique a criação de músicas como Revelation IX, com suas inserções delirantes, ainda íntimas do som explorado pelo artista em The Ascension.

Passada a melancolia que orienta a porção inicial do álbum, Stevens abre passagem para o lado mais acolhedor do disco. Mesmo pontudo por instantes de evidente tristeza, parte expressiva de Celebrations ganha forma na colorida sobreposição de ideias e melodias sempre delicadas, como um precioso exercício criativo que envolve o ouvinte lentamente. É como se o músico fosse de encontro ao mesmo território criativo detalhado nas canções de Planetarium (2017), registro de sonoridade flutuante que conta com a colaboração dos músicos Bryce Dessner, Nico Muhly e James McAlister. A diferença está no andamento rítmico dado ao material, com o compositor utilizando dos próprios sintetizadores como um componente de marcação percussiva, vide a derradeira Celebration X.

Com Incantations como volume de encerramento do trabalho, Stevens imprime com naturalidade uma sensação de recomeço. É como se as memórias e saudade do próprio pai se fizesse presente, contudo, longe da sensação de sufocamento e tom fúnebre que orienta o bloco inicial do projeto. São canções que parecem apontar caminhos, proposta que ora utiliza de uma composição homogênea, como nos temas atmosféricos de Incantation III, ora utiliza de uma abordagem puramente experimental, marca da instável Incantation V. Variações instrumentais que preservam tudo aquilo que o músico busca explorar tão logo o disco tem início, em Meditations, porém, mirando o futuro, como uma passagem conceitual e essencialmente diversa para os próximos lançamentos do artista.

Ouça também:

Jornalista, criador do Música Instantânea e integrante do podcast Vamos Falar Sobre Música. Já passou por diferentes publicações de Editora Abril, foi editor de Cultura e Entretenimento no Huffington Post Brasil, colaborou com a Folha de S. Paulo e trabalhou com Brand Experience e Creative Copywriter em marcas como Itaú e QuintoAndar. Pai do Pudim, “ataca de DJ” nas horas vagas e adora ganhar discos de vinil de presente.

Jornalista, criador do Música Instantânea e integrante do podcast Vamos Falar Sobre Música. Já passou por diferentes publicações de Editora Abril, foi editor de Cultura e Entretenimento no Huffington Post Brasil, colaborou com a Folha de S. Paulo e trabalhou com Brand Experience e Creative Copywriter em marcas como Itaú e QuintoAndar. Pai do Pudim, “ataca de DJ” nas horas vagas e adora ganhar discos de vinil de presente.