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Crítica

Tim Bernardes

: "Mil Coisas Invisíveis"

Ano: 2022

Selo: Coala Records / Psychic Hotline

Gênero: Indie, Folk

Para quem gosta de: O Terno e Rubel

Ouça: Última Vez e Mistificar

8.6
8.6

Tim Bernardes: “Mil Coisas Invisíveis”

Ano: 2022

Selo: Coala Records / Psychic Hotline

Gênero: Indie, Folk

Para quem gosta de: O Terno e Rubel

Ouça: Última Vez e Mistificar

/ Por: Cleber Facchi 22/06/2022

Ouvir as canções de Mil Coisas Invisíveis (2022, Coala Records / Psychic Hotline), segundo álbum de Tim Bernardes em carreira solo, é como folhear as páginas de um livro. São versos autobiográficos, por vezes descritivos, longos e difíceis, como se estruturados para serem desvendados pelo ouvinte. O próprio cantor e compositor paulistano me confidenciou em entrevista que muito do processo de criação da material se assemelhou ao lançamento de um livro. Fragmentos textuais que parecem dançar pelo tempo, como em uma antologia de reminiscências empoeiradas e memórias de um passado ainda recente, remontando experiências sentimentais vividas pelo artista desde o lançamento do disco anterior, Recomeçar (2017).

Sobrevive justamente nesse forte aspecto da temporalidade, uso de questões existenciais e reflexões sobre a inevitabilidade da passagem do tempo um estímulo natural para o fortalecimento da obra. É como se o músico seguisse exatamente de onde parou no registro anterior, porém, livre da linearidade expressa nas canções de Recomeçar e do próprio Atrás / Além (2019), último álbum de estúdio com os parceiros da banda O Terno. “Nascer outra vez bem no meio da vida“, detalha na introdutória Nascer, Viver, Morrer, composição que sintetiza parte dos temas e inquietações exploradas pelo artista ao longo do trabalho.

Parte desse resultado vem do próprio processo de transformação pessoal vivida pelo artista nos últimos anos. Composições que tratam sobre romper com antigos laços, a transição total para a vida adulta e a necessidade de seguir em frente. “Destruí meu velho eu … Matei minha mãe, meu pai / Me perdoei / Seguimos todos vivos“, canta em Fases. Esse mesmo resultado fica ainda mais evidente em Meus 26 (“Presos entre um fim e um recomeço / Ou entre o começo e o fim“) e na nostálgica Velha Amiga (“Há quem diga / Depois de tanta vida / Que o ponto de partida / É quase igual à onde deu no fim“). São canções que, mesmo partindo de experiências pessoais, em nenhum momento deixam de dialogar com o ouvinte.

E isso fica ainda mais explícito nos momentos em que o artista deixa de lado o aspecto existencialista do trabalho para mergulhar em questões sentimentais. É o caso de Última Vez, música que soa como uma continuação do repertório entregue no disco anterior, porém, partindo de uma abordagem sóbria, como um desdobramento totalmente maduro dos temas detalhados em Recomeçar. Mesmo quando se entrega emocionalmente, caso da canção seguinte, Mistificar, prevalece o equilíbrio dado aos versos. “Hora de deixar rolar / De estar desprevenido / Pra o que pode rolar“, detalha em meio a arranjos reducionistas, sempre econômicos, direcionamento que acaba se refletindo da abertura ao fechamento do registro.

Salve exceções, como em Realmente Lindo, completa pela percussão sutil de Biel Basile, e Beleza Eterna, composição adornada pela vozes de Dora Morelenbaum e Zé Ibarra, da Bala Desejo, tudo gira em torno de uma discreta combinação de melodias acústicas e orquestrações sublimes arranjadas pelo músico. É como uma interpretação ainda mais contida e sensível dos temas detalhados por Bernardes em Recomeçar, proposta que potencializa os versos lançados pelo artista, porém, tende a consumir a experiência do ouvinte, como nos momentos de maior verborragia que marcam a segunda metade de Mil Coisas Invisíveis.

Entretanto, Bernardes parece bastante seguro desse resultado. Como indicado logo nos minutos iniciais do disco, na lenta construção de Nascer, Viver, Morrer, Mil Coisas Invisíveis é um registro que encanta muito mais pela jornada e digestão compassada do que pela garantia de respostas imediatas. Claro que isso não interfere na produção de faixas acessíveis, feitas para capturar a atenção do ouvinte em uma primeira audição. São canções como BB (Garupa de Moto Amarela) e Realmente Lindo que funcionam como um contraponto necessário aos momentos de maior recolhimento da obra. Uma delicada combinação de ideias que evidencia o perfeito equilíbrio e direção consciente do artista durante toda a execução do material.

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Jornalista, criador do Música Instantânea e integrante do podcast Vamos Falar Sobre Música. Já passou por diferentes publicações de Editora Abril, foi editor de Cultura e Entretenimento no Huffington Post Brasil, colaborou com a Folha de S. Paulo e trabalhou com Brand Experience e Creative Copywriter em marcas como Itaú e QuintoAndar. Pai do Pudim, “ataca de DJ” nas horas vagas e adora ganhar discos de vinil de presente.

Jornalista, criador do Música Instantânea e integrante do podcast Vamos Falar Sobre Música. Já passou por diferentes publicações de Editora Abril, foi editor de Cultura e Entretenimento no Huffington Post Brasil, colaborou com a Folha de S. Paulo e trabalhou com Brand Experience e Creative Copywriter em marcas como Itaú e QuintoAndar. Pai do Pudim, “ataca de DJ” nas horas vagas e adora ganhar discos de vinil de presente.