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Crítica

Torres

: "What An Enormous Room"

Ano: 2024

Selo: Merge

Gênero: Art Rock

Para quem gosta de: Hand Habits e Waxahatchee

Ouça: Collect e I Got The Fear

5.0
5.0

Torres: “What An Enormous Room”

Ano: 2024

Selo: Merge

Gênero: Art Rock

Para quem gosta de: Hand Habits e Waxahatchee

Ouça: Collect e I Got The Fear

/ Por: Cleber Facchi 06/02/2024

No decorrer da última década, Mackenzie Scott foi de uma abordagem criativa bastante tradicional para a entrega de um repertório cada vez mais provocativo e estruturalmente irregular. Onde antes reinavam guitarras sóbrias, sempre inspiradas pelo cancioneiro norte-americano, hoje percebemos a inserção de bases eletrônicas e momentos de maior experimentação que levam o som da musicista de Orlando para um novo e curioso território. Ideias e sentimentos em permanente processo de desconstrução, conceito que, para o bem ou para o mal, embala o trabalho da artista em What An Enormous Room (2024, Merge).

Sexto e mais recente álbum de estúdio da cantora sob a alcunha de Torres, o sucessor de Thirstier (2021) talvez seja o trabalho que mais se aproxima da corrupção estética proposta em Sprinter (2015) e Three Futures (2017),porém, substitui a permanente sensação de impacto explícita nos registros citados pela entrega de um repertório essencialmente morno. Como indicado durante todo o processo de divulgação do disco, Scott parece simplesmente não saber onde quer chegar. São ideias inconclusivas, experimentos controlados e estruturas que pouco acrescentam quando próximas dos últimos lançamentos da musicista.

A própria faixa de abertura, Happy Man’s Shoes, com suas inserções tímidas e diálogos com a produção eletrônica, funciona como uma boa representação desse resultado. São pouco mais de três minutos em que Torres vaga em meio a abstrações poéticas e ambientações que não levam a lugar algum, como se o trabalho permanecesse em um estado de preparação constante, mas que em nenhum momento fosse capaz de alcançar um ponto de ruptura. Mesmo as canções mais urgentes e dinâmicas, como Life As We Don’t Know It, parecem morrer antes de consolidar uma ideia específica. Falta peso e inspiração ao disco.

Dos poucos momentos em que realmente captura a atenção do público, são os sentimentos abordados e não a base instrumental que convence o ouvinte. É o caso de I Got The Fear, canção em que utiliza de uma estrutura reducionista, alternando entre arranjos acústicos e batidas eletrônicas, mas que sustenta no lirismo angustiado um precioso componente de diálogo. “Você, em pânico / Parado no banheiro público / Seu peito em queda livre / Você não está sozinho aí“, canta em um genuíno ato de acolhimento que traz de volta o mesmo refinamento poético explícito durante todo o autointitulado registro de estreia da carreira.

É como um preparativo para o que se revela de forma ainda mais interessante e liricamente apurada em outras composições ao longo do disco, como em Collect. Enquanto os versos destacam a força de Scott, como um regresso aos antigos trabalhos (“Eu não sou nada que você já viu antes / Eu sou o caminho a seguir / Eu sou a Água da Vida / Eu sou o anjo da morte“), batidas e guitarras rompem com a aparente morosidade da obra e levam o material para outra direção. Pena que tudo isso não passa de um momento de maior exaltação, como se Torres a todo instante regressasse ao mesmo território compacto e tedioso.

Falta ao disco a mesma sensação de impacto explícita em músicas como Don’t Go Puttin Wishes in My Head, Good Grief e demais faixas também posicionadas em meio a criações contemplativas do registros anteriores. É como se Torres tivesse em mãos um repertório melhor aproveitado em um registro menor, como um EP, mas que simplesmente não se sustenta quando observado como uma grande obra. Do ritmo moroso à construção dos arranjos e estruturas bastante similares, Scott faz do álbum um exercício criativo que dialoga com a própria imagem de capa, como um espaço conceitualmente grandioso, porém, vazio.

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Jornalista, criador do Música Instantânea e integrante do podcast Vamos Falar Sobre Música. Já passou por diferentes publicações de Editora Abril, foi editor de Cultura e Entretenimento no Huffington Post Brasil, colaborou com a Folha de S. Paulo e trabalhou com Brand Experience e Creative Copywriter em marcas como Itaú e QuintoAndar. Pai do Pudim, “ataca de DJ” nas horas vagas e adora ganhar discos de vinil de presente.

Jornalista, criador do Música Instantânea e integrante do podcast Vamos Falar Sobre Música. Já passou por diferentes publicações de Editora Abril, foi editor de Cultura e Entretenimento no Huffington Post Brasil, colaborou com a Folha de S. Paulo e trabalhou com Brand Experience e Creative Copywriter em marcas como Itaú e QuintoAndar. Pai do Pudim, “ataca de DJ” nas horas vagas e adora ganhar discos de vinil de presente.