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Crítica

Wednesday

: "Rat Saw God"

Ano: 2023

Selo: Dead Oceans

Gênero: Indie Rock

Para quem gosta de: Big Thief e MJ Lenderman

Ouça: Bull Believer, Turkey Vultures e Chosen to Deserve

8.6
8.6

Wednesday: “Rat Saw God”

Ano: 2023

Selo: Dead Oceans

Gênero: Indie Rock

Para quem gosta de: Big Thief e MJ Lenderman

Ouça: Bull Believer, Turkey Vultures e Chosen to Deserve

/ Por: Cleber Facchi 14/04/2023

Poucas coisas são tão satisfatórias quanto um disco que não te deixa respirar. Um golpe rápido e você é prontamente arremessado para a canção seguinte. Quinto e mais recente trabalho de inéditas da banda norte-americana Wednesday, o intenso Rat Saw God (2023, Dead Oceans) é exatamente esse tipo de obra. Inaugurado pela urgência de Hot Rotten Grass Smell, com pouco mais de um minuto de duração, o registro transporta sem dificuldades o ouvinte para dentro do barulhento território criativo que Karly Hartzman e seus parceiros, Xandy Chelmis (guitarras), Margo Schultz (baixo), Alan Miller (bateria) e MJ Lenderman (guitarras), buscam desenvolver em estúdio até os momentos finais do material, em TV In The Gas Pump.

E se a já citada faixa de abertura for insuficiente para capturar a sua atenção, Bull Believer, vinda logo em sequência, dá conta disso sem dificuldades. Com pouco mais de oito minutos, a composição não apenas evidencia a potência criativa do Wednesday ao longo da obra, como transporta o som produzido pela banda para um ambiente completamente inesperado e caótico. Enquanto os versos tratam sobre vícios, personagens decadentes e memórias empoeiradas da adolescência, batidas tortas mudam de direção a todo instante, soterrando o ouvinte em meio a camadas de guitarras, distorções e vozes sempre berradas.

Parte dessa crueza e força avassaladora das canções vem da escolha de Hartzman em mudar o foco do trabalho em relação aos discos anteriores, investindo menos em conflitos particulares para explorar as rachaduras do modo de vida estadunidense. “Garoto no Condado de Bath, Virgínia / Bebendo uma Fanta amarela com cor de urina brilhante / Soube que alguém morreu no estacionamento do Planet Fitness / Caminhões de bombeiros chegaram e as pessoas ficaram ao redor“, detalha em Bath County, música em que utiliza de pequenas observações para ambientar o ouvinte. São fragmentos de crônicas musicadas, como um produto das vivências da cantora e seus parceiros entre uma apresentação ao vivo e outra.

Mesmo quando investe em temas contemplativos, Hartzman parte sempre do entorno para mergulhar nas próprias inquietações. Exemplo disso fica bastante evidente em Turkey Vultures. Enquanto os versos iniciais detalham um cenário desolador (“Abutres se reúnem no quintal / Com um rosto tão vazio quanto uma pá“), minutos à frente, somos convidados a se perder na mente do eu lírico. “Eu não consigo me diferenciar / À noite não conto estrelas, conto o escuro“, canta em meio a guitarras sempre carregadas de efeitos, como uma tradução ruidosa das experiências sentimentais que invadem a construção da letra.

Vem justamente dessa simbiose entre Hartzman e seus parceiros de banda, principalmente o guitarrista MJ Lenderman, a força de parte expressiva das canções. É como se tudo fosse pensado para potencializar a poesia descritiva e momentos de maior tormento que orientam a formação dos versos. Não por acaso, quando regressa ao mesmo ambiente diminuto que marca o repertório explorado nos antigos trabalhos, como em What’s So Funny e Formula One, o grupo revela algumas de suas canções menos expressivas. São respiros momentâneos e talvez necessários, mas que pouco contribuem para o desenvolvimento da obra.

Ainda assim, Rat Saw God dá um salto gigantesco quando comparado a qualquer outro disco produzido pelo grupo nos últimos anos, caso do ainda recente Twin Plagues (2021). Sem tempo para descanso, cada composição parece servir de passagem para a música seguinte, convidando o ouvinte a se perder em um cenário marcado pela permanente corrupção dos indivíduos. Um grito de dor misturado com libertação, direcionamento explícito na crueza dos arranjos e vozes berradas em canções como Bull Believer e Bath Conty, mas que continua a reverberar na cabeça do ouvinte mesmo após o encerramento do trabalho.

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Jornalista, criador do Música Instantânea e integrante do podcast Vamos Falar Sobre Música. Já passou por diferentes publicações de Editora Abril, foi editor de Cultura e Entretenimento no Huffington Post Brasil, colaborou com a Folha de S. Paulo e trabalhou com Brand Experience e Creative Copywriter em marcas como Itaú e QuintoAndar. Pai do Pudim, “ataca de DJ” nas horas vagas e adora ganhar discos de vinil de presente.

Jornalista, criador do Música Instantânea e integrante do podcast Vamos Falar Sobre Música. Já passou por diferentes publicações de Editora Abril, foi editor de Cultura e Entretenimento no Huffington Post Brasil, colaborou com a Folha de S. Paulo e trabalhou com Brand Experience e Creative Copywriter em marcas como Itaú e QuintoAndar. Pai do Pudim, “ataca de DJ” nas horas vagas e adora ganhar discos de vinil de presente.