Disco: “Animal Nacional”, Vespas Mandarinas

/ Por: Cleber Facchi 15/04/2013

Vespas Mandarinas
Brazilian/Rock/Alternative
http://vespasmandarinas.com.br/

 

Por: Cleber Facchi

Vespas Mandarinas

Existe uma estranha cultura que alimenta boa parte das bandas independentes de que o rock para ser “rock” precisa se livrar de atributos melódicos, do pop ou de aspectos comerciais. Bastam guitarras sujas, doses de batidas ágeis e um discurso (pseudo) politizado para que a boa fase de grupos como Titãs, Ira! e outros representantes do Rock Brazuka seja adaptada para o presente. Um erro. Lidando de forma aberta com os contrastes que marcam a musica nacional – do que foi construído há mais de três décadas ou atualmente -, a banda paulistana Vespas Mandarinas faz do primeiro registro em estúdio um verdadeiro cardápio de sons que dançam pelo tempo. Um tratado que quer ser sujo e politizado, mas que de forma alguma se desprende da dança e dos versos que se acomodam pegajosos nos ouvidos.

Aos comandos experientes de Chuck Hipolitho (guitarra e voz), Thadeu Meneghini (guitarra e voz), André Dea (bateria) e Flavio Guarnieri (baixo), o registro passeia de forma clara pelas referências, primeiro em busca de um resultado particular, depois em necessidade de perverter as próprias origens. Sustentado em cima do trabalho de grupos obscuros da década de 1980, como Picassos Falsos e Fellini, mas sem abandonar a herança acumulada por bandas que alcançaram o grande público, à exemplo de Titãs e Os Paralamas do Sucesso, o quarteto paulistano trata do primeiro álbum como uma ode ao passado – sem jamais se distanciar do presente, claro. Não por acaso o raivoso debut atende pelo título de Animal Nacional (2013, Deckdisc), resultado claro do que o quarteto formou no “cativeiro do inconsciente” e compartilha de forma nostálgica e sempre intensa com o público.

Trabalhado ao longo de 41 minutos e 21 segundos, o álbum pula de galho em galho no que tange o rock nacional, trazendo na presença de Rafael Ramos – produtor que já trabalhou com Los Hermanos, Móveis Coloniais de Acaju e outros grupos nacionais – a força para amarrar tudo dentro de uma proposta que jamais tende ao exagero. São 12 faixas que partilham de um conjunto bem estabelecido e honesto de guitarras, baixo e bateria. Bases mais do que adequada para que os vocais de Hipolitho e Meneghini revelem canções tocadas pelo cotidiano, versos que raspam na saudade, falam sobre o amor e ainda assim conseguem discutir temáticas “adultas” com o mesmo compromisso lírico. Uma massa de sons que parecem deixados de lado nos lançamentos de bandas recentes, ou talvez mal aproveitada por boa parte delas.


[youtube:http://www.youtube.com/watch?v=Be8FMROXi2Y?rel=0]

[youtube:http://www.youtube.com/watch?v=Y1gb3lZbCiY?rel=0]

Talvez por conta das referências confessas e da presença ativa de diversos elementos sonoros que marcaram década de 1980, Animal Nacional seja capaz de ocultar aspectos fundamentais que orientaram o rock brasileiro da segunda metade dos anos 2000. São músicas rápidas como Santa Sampa (uma versão paulistana dos sons proclamados pela carioca Rockz), tratados cotidianos como os de Não Sei O Que Fazer Comigo (que mais parece uma música da extinta Terminal Guadalupe) ou quem sabe Distraídos Venceremos, que bem poderia integrar o trabalho da baiana Cascadura ou da acreana Los Porongas. Referências talvez “simples” aos habituados a discos recentes de grupos como Cambriana ou Silva, mas que lidam com uma sonoridade tão intensa que tampar os ouvidos é simplesmente um erro.

Contrariando boa parte de grupos que exploram aspectos similares com desgaste, o quarteto traz na sonoridade apenas um sustento básico, visto que estão nas letras os principais atributos da obra. Movido pelo jogo rápido de metáforas, trocadilhos, recortes pessoais ou versos que parecem simplesmente feitos para grudar, o álbum incorpora na instrumentação “roqueira” uma forma de ocultar um dos trabalhos que melhor exploram o lado pop da poesia. Longe do banal ou do descartável, a banda dança ao som de músicas que soam políticas e radiofônicas na mesma intensidade. Um efeito que poderia soar de forma instável nas mãos de artistas despreparados, mas resgata de maneira particular a mesma resposta que décadas antes motivou Vivendo e não Aprendendo, Selvagem?, Cabeça Dinossauro e outras obras clássicas do rock nacional que tanto inspiram os Vespas Mandarinas.

Menos colorido que Nevilton em Sacode, e assumindo uma curva nostálgica em relação ao que Seychelles, Andeor e outros grupos paulistanos vêm incorporando com bastante similaridade, Animal Nacional arranja espaço para que o quarteto estabeleça um domínio próprio na cena brasileira. Trata-se de um disco que lida abertamente com velharias e sons há tempos desgastados com nítido teor de novidade – seja ela real ou apenas o resultado de anos de trabalhos redundantes acumulados. Com um texto de apresentação que beira a prepotência, o grupo praticamente se coloca como os novos novos salvadores do rock nacional. Não que o gênero precise mais disso hoje em dia, mas para todos os efeitos, estaria em boas mãos caso fosse aos comandos das Vespas Mandarinas.

 

Animal Nacional

Animal Nacional (2013, Deckdisc)

 

Nota: 8.0
Para quem gosta de: Cascadura, Andeor e Seychelles
Ouça: O Amor e o Ocaso, Cobra de Vidro e Santa Sampa

[soundcloud url=”http://api.soundcloud.com/playlists/4595826″ params=”” width=” 100%” height=”450″ iframe=”true” /]

Jornalista, criador do Música Instantânea e integrante do podcast Vamos Falar Sobre Música. Já passou por diferentes publicações de Editora Abril, foi editor de Cultura e Entretenimento no Huffington Post Brasil, colaborou com a Folha de S. Paulo e trabalhou com Brand Experience e Creative Copywriter em marcas como Itaú e QuintoAndar. Pai do Pudim, “ataca de DJ” nas horas vagas e adora ganhar discos de vinil de presente.

Jornalista, criador do Música Instantânea e integrante do podcast Vamos Falar Sobre Música. Já passou por diferentes publicações de Editora Abril, foi editor de Cultura e Entretenimento no Huffington Post Brasil, colaborou com a Folha de S. Paulo e trabalhou com Brand Experience e Creative Copywriter em marcas como Itaú e QuintoAndar. Pai do Pudim, “ataca de DJ” nas horas vagas e adora ganhar discos de vinil de presente.