Crystal Castles
Canadian/Electronic/Experimental
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Desde o primeiro disco o Crystal Castles parecia uma banda fadada à redundância e a absorção constante da mesma proposta instrumental. A trama de ruídos computadorizados, as vozes sempre maquiadas de Alice Glass, as batidas minimalistas e esquizofrênicas de Ethan Kath, tudo parecia construído dentro de um período curto de validade, como se o suposto castelo de cristais que dá título aos trabalhos da dupla estivesse prestes a desabar. Contudo, quase dez anos depois do surgimento do casal canadense, a banda parece inclinada a tudo, menos a se repetir. Prova clara disso está no lançamento do autointitulado terceiro disco – também definido como III -, registro que perverte a proposta sintética dos anteriores lançamentos, apresentando novos percursos ao trabalho do sempre obscuro casal.
Com uma proposta naturalmente íntima do que o duo vinha desenvolvendo desde o primeiro álbum, em III Kath tira o pé do acelerador, evitando a construção de uma massa eletrônica similar ao composto pulsante que definiu a execução do último disco. Partindo dessa premissa, a dupla incorpora uma tonalidade muito mais densa e consequentemente experimental do que define a sonoridade do casal, rompendo de forma decisiva (e necessária) com o que parecia ser uma maior aproximação com a música pop. Resultado nítido logo na faixa de abertura do trabalho, a atmosférica Plague, quanto mais os canadenses mergulham no cenário sombrio da obra, mais hermética ela se torna, como se as faixas fossem se fechando em meio a volumosas ondas de ruídos.
Tocando de leve no Drone em alguns instantes – imagine uma versão dark dos primeiros lançamentos da dupla Fuck Buttons -, faixa após faixa o álbum segue mergulhando em uma solução fechada de sintetizadores que acabam por decidir de forma definitiva os rumos (quase sempre instáveis) do trabalho. Esqueça os pequenos pontos de distinção que se definiam no decorrer do trabalho anterior, mesmo nos momentos mais “comerciais” da obra, como no decorrer de Violent Youth ou no R&B Affection, há sempre a necessidade da dupla em se enclausurar em um cenário obscuro de vozes remodeladas, batidas não óbvias e teclados que cobrem o álbum como um imenso e abafado cobertor sintético.
Oposto do que o casal propunha até pouco tempo, em III é nítido o esforço em não produzir um registro dançante ou que se prenda aos comandos rítmicos de outrora. A proposta tende ao crescimento de um trabalho muito mais centrado, partidário de uma mesma arquitetura sonora, bem como de uma força instrumental que hipnotiza e mantém o ouvinte atento até o último segundo. A cada nova criação todo detalhe faz a diferença. Enquanto Kerosene faz das batidas matemáticas uma cama para os vocais reformulados que escorrem em doses ao fundo, Child I Will Hurt You, no fecho do álbum, quebra a estrutura natural que acompanha a dupla, arrastando Alice para um mundo de sonhos eletrônicos que contribuiriam e muito para um próximo álbum da também dupla Beach House.
Sem nunca parecer como uma continuação do último disco da dupla – que de uma forma ou outra se estendia como uma sequência do primeiro -, ao pisar no terreno do recente álbum temos de fato novidade. Antes combustível para boa parte das canções, os vocais de Glass assumem uma temática menos orgânica, se misturando aos sons eletrônicos em Pale Flesh ou sendo completamente engolida em meio a avalanche de formas ruidosas que pervertem a rápida Insulin. Nem pense em buscar por algum grande hit ou faixa de maior destaque dentro do álbum, afinal, tudo é pensado de forma similar, como se a dupla firmasse as bases para um disco que mesmo desconcertante, mantém firme a aproximação e o diálogo entre as musicas. Um resultado muito similar ao que define os trabalhos do produtor Oneohtrix Point Never: com um mundo de texturas e formas aparentemente inexatas, mas que se completam ao final.
Assim como no encerramento do disco passado, ao alcançar a última canção do atual registro o Crystal Castles torna imprevisível o que deve ser apresentado em um futuro próximo. Talvez o casal mergulhe ainda mais nos experimentos, quebre os atuais paradigmas e se reinvente mais uma vez. Quem sabe afunde em um lago de emanações coloridas e brinque novamente com a música pop, regressando ao encaminhamento dado ao segundo projeto. Independente dos rumos confiar na proposta da dupla (hoje) parece como uma aposta certa, ou pelo menos a certeza de que ruídos eletrônicos e texturas muitas vezes desgastadas podem se transformar em boa música.
III (2012, Fiction)
Nota: 8.0
Para quem gosta de: Health, Grimes e Kap Bambino
Ouça: Plague, Child I Will Hurt You e Violent Youth
Jornalista, criador do Música Instantânea e integrante do podcast Vamos Falar Sobre Música. Já passou por diferentes publicações de Editora Abril, foi editor de Cultura e Entretenimento no Huffington Post Brasil, colaborou com a Folha de S. Paulo e trabalhou com Brand Experience e Creative Copywriter em marcas como Itaú e QuintoAndar. Pai do Pudim, “ataca de DJ” nas horas vagas e adora ganhar discos de vinil de presente.
Jornalista, criador do Música Instantânea e integrante do podcast Vamos Falar Sobre Música. Já passou por diferentes publicações de Editora Abril, foi editor de Cultura e Entretenimento no Huffington Post Brasil, colaborou com a Folha de S. Paulo e trabalhou com Brand Experience e Creative Copywriter em marcas como Itaú e QuintoAndar. Pai do Pudim, “ataca de DJ” nas horas vagas e adora ganhar discos de vinil de presente.