Peaking Lights
Experimental/Lo-Fi/Dub
http://peakinglights.com/
Por: Cleber Facchi
Em meio ao colosso de beats programados pela crescente cena dubstep, sons lânguidos articulados pelos novos representantes do R&B e até experimentos que redefiniram o Hip-Hop no último ano, o duo californiano Indra Dunis e Aaron Coyes fez da somatória de brandas composições por eles arquitetadas uma espécie de recanto. Em meio a tantas transformações, o casal conseguiu estabelecer um espaço particular e inteiramente ameno, apenas tricotando reverberações caseiras, com pitadas de dub e um toque experimental que praticamente convidava o ouvinte a se aventurar cada vez mais dentro desse policromático território.
Orquestrado pela calmaria, 936 veio como um doce retrato de um casal em plena descoberta. Enquanto Coyes brincava com os sons, combinando colagens, referências e diferentes gêneros em busca de uma massa instrumental densa e hipnótica, Dunis tratou de ocupar as pequenas lacunas do registro com sua voz. Ora límpidos e imaculados, ora ocultos em meio a diversas camadas de distorção e eco, os vocais surgiam como o tempero final ao diversificado registro, que entre aproximações com o drone (Marshmellow Yellow), diálogos com o pop (Hey Sparrow) e brincadeiras com a eletrônica (All The Sun That Shines) trouxe um composto musical tão vasto quanto a colorida capa que definiu o trabalho.
Embora o intervalo entre o primeiro disco e o recente Lucifer (2012, Weird World) seja de fato curto, a perfeita sintonia entre os parceiros acaba servindo como ferramenta para que todos os acertos de outrora voltem a se repetir com o presente álbum. Mais do que um reaproveitamento do que fora testado há pouco mais de um ano, com o atual registro temos uma evolução, com os californianos deixando um pouco de lado os graves ruidosos e a crueza de outrora para investir em um trabalho mais detalhado, diversificado e consequentemente ainda mais rico que os anteriores experimentos por eles testados.
Mesmo concentrando o mesmo número de faixas do disco anterior, oito, Lucifer conta com quase seis minutos a menos que o trabalho de 2011, resultado que propicia o lançamento de um disco ainda mais sutil, adocicado e cuidadoso. Por mais que as conexões com a música Lo-Fi ainda estejam em cada fração do presente registro, o tratado passa longe de ecoar o mesmo toque caseiro de outrora, algo que as canções mais encorpadas e as construções sonoras detalhadas transmitem logo nos minutos iniciais do álbum, em que referências ao trabalho de artistas como Sun Araw, Julia Holter e um Andy Stott mais “ensolarado” se tornam evidentes.
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Enquanto no disco anterior algumas parcas guitarras e batidas mais intensas garantiam ao projeto um caráter ruidoso e deveras terreno, hoje temos um completo oposto disso. Tudo em Lucifer ecoa de forma leve e enevoada, como se o casal flutuasse em uma nuvem aconchegante de teclados e vozes ecoadas. Muito mais calcado no dub e completamente entregue à psicodelia (algo bem evidente em Beautiful Son), o disco e canções como Cosmic Tides ou LO HI parecem se esfarelar nos ouvidos, com a dupla mais uma vez nos arrastando para o mesmo recanto místico-hipnótico do trabalho passado.
Talvez o que mais distancie o primeiro álbum deste segundo registro seja a maneira como as canções parecem estabelecer um rico diálogo entre elas. Enquanto 936 mantinha um toque irregular, como se cada faixa se movimentasse de maneira própria e dentro de uma lógica particular, em Lucifer todas as canções fluem coesas e parecem amarradas dentro de uma mesma proposta. Da curta faixa de abertura, passando pela extensa e sintetizada Live Love, até chegar ao encerramento com a delicada Morning Star, todas as canções mantém um mesmo toque conceitual.
É visível uma aproximação tanto entre as harmonias dos teclados como samples que passeiam pelo disco, percepção que acaba por delimitar a obra dentro de uma estrutura fechada, mas que em nenhum momento prejudica o rendimento do disco. Ao mesmo tempo em que surge como um trabalho “fechado”, o registro utiliza dessa atmosfera de proximidade para que algumas tendências já exploradas no anterior álbum sejam melhor aproveitadas, algo que as predisposições ao pop, bem aplicadas em Beautiful Son ou a conexão com a New Age e o jazz em LO HI representam de forma marcante e bem resolvida.
Elemento de condução dentro do álbum, os vocais de Indra Dunis (mesmo carregados de efeitos) parecem guiar o espectador por entre formas ambientais abstratas e encantadores experimentos. Espécie de linha invisível que corta o disco, a voz parece ser o único mecanismo que mantém a aproximação do ouvinte com a realidade, um tracejado consciente capaz de impedir que o espectador e o próprio disco se percam em exageros ou emanações instrumentais pretensiosas. Lucifer é um adorável e distinto passeio musical que felizmente sabe o momento certo de chegar ao fim, logo, é praticamente impossível passear pelas composições do álbum sem não se encantar por elas.
Lucifer (2012, Weird World)
Nota: 8.3
Para quem gosta de: Sun Arraw, Andy Stott e Forest Swords
Ouça: Lo Hi, Beautiful Son e Cosmic Tides
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Jornalista, criador do Música Instantânea e integrante do podcast Vamos Falar Sobre Música. Já passou por diferentes publicações de Editora Abril, foi editor de Cultura e Entretenimento no Huffington Post Brasil, colaborou com a Folha de S. Paulo e trabalhou com Brand Experience e Creative Copywriter em marcas como Itaú e QuintoAndar. Pai do Pudim, “ataca de DJ” nas horas vagas e adora ganhar discos de vinil de presente.
Jornalista, criador do Música Instantânea e integrante do podcast Vamos Falar Sobre Música. Já passou por diferentes publicações de Editora Abril, foi editor de Cultura e Entretenimento no Huffington Post Brasil, colaborou com a Folha de S. Paulo e trabalhou com Brand Experience e Creative Copywriter em marcas como Itaú e QuintoAndar. Pai do Pudim, “ataca de DJ” nas horas vagas e adora ganhar discos de vinil de presente.