Disco: “Wolf”, Tyler, The Creator

/ Por: Cleber Facchi 02/04/2013

Tyler, The Creator
Hip-Hop/Rap/Alternative
http://www.oddfuture.com/

 

Por: Cleber Facchi

Tyler, The Creator

A máscara irônica e (por vezes) excessivamente dramática de Tyler, The Creator esconde um dos retratos mais sinceros da juventude norte-americana e, por que não, do resto do mundo. Autor de faixas consumidas pelo vazio, desespero, futilidade e abusos, a cada novo lançamento o rapper californiano mergulha o ouvinte de forma intencional em um universo de sorrisos forçados, instabilidade emocional e loucura. Não diferente parece ser a proposta que alimenta Wolf (2013, Odd Future), terceiro registro em estúdio do líder do coletivo Odd Future Wolf Gang Kill Them All (OFWGKTA) e obra que finaliza o arco sombrio iniciado em 2010 com o lançamento do quase desconhecido, porém, não menos inventivo Bastard.

Se há pouco menos de dois anos a esquizofrenia impulsionava o rapper a construir sua maior obra, Goblin (2011), com o novo álbum Tyler deixa crescer um cenário paralelo, garantindo continuidade aos mesmos temas sombrios/exitenciais que o acompanham desde o primeiro disco solo. São faixas musicalmente “alegres” (vide o caráter comercial do single Domo 23), porém, planejadas em cima de temáticas essencialmente obscuras e não convencionais para o gênero. Versos que circulam abertamente pela ausência paterna, o uso exagerado de drogas, agressão, medo, homofobia, morte e, pela primeira vez, as transformações impulsionadas pela fama.

Longe do ambiente claustrofóbico que se estende nos dois primeiros álbuns – cenário também compartilhado pelos demais integrantes do Odd Future -, Tyler parece lidar de forma decidida com o grande público, tudo isso sem abandonar as marcas que o tornaram conhecido. Influenciado de forma visível pela repercussão em torno Frank Ocean e do bem sucedido Channel Orange (2012), o rapper passeia pelo disco sem deixar de tratar sobre as críticas que recebeu da comunidade LGBT e em alguns instantes acuado com tamanha repercussão em torno de sua obra. Ao lançar o novo disco, Tyler parece pela primeira vez abandonar a sala cinza de psicanálise que firmou estrategicamente em Goblin para caminhar pelo “mundo real”.


[youtube:http://www.youtube.com/watch?v=o4OD3IHs5jU?rel=0]

[youtube:http://www.youtube.com/watch?v=3lDqMx4rmFU?rel=0]

Enquanto no primeiro álbum fomos apresentados ao Dr. TC e posteriormente imersos nos pesadelos confessos do “paciente” Goblin, hoje Tyler se apresenta sob a forma versátil de Wolf, também paciente de sua persona inicial. A proposta lírica que acompanha o rapper desde o primeiro álbum perde força no decorrer da presente obra, resultado que contraria a atuação prévia do californiano e se revela como um acerto para o conjunto de inéditas composições que surgem pelo disco. De maneira intencional ou não, “O Criador” deixa de se manifestar como um personagem único, transformando Wolf (o personagem) na manifestação sonora de inúmeras versões de si próprio, e não em apenas um, resultado que até “irrita” o analista na faixa de encerramento, Lone.

Pela necessidade em atender uma demanda maior do público, Tyler usa do álbum como um mecanismo de aproximação – tanto para novos como para velhos seguidores. Não por acaso Wolf é o trabalho que conta com o maior número de colaborações alheias ao Odd Future (incluindo Lætitia Sadier e Erykah Badu), produção assertiva, além de faixas comercialmente viáveis. Tyler quase deixa fluir um trabalho alheio à trilogia que vinha solidificando. Entretanto, é preciso notar que mesmo o caráter “pop” do disco não exclui o rapper de construir composições tão amargas quanto as que habitavam os trabalhos passados, caso de Rusty, Trashwang e boa parte das faixas posicionadas na segunda metade da obra. A proposta parece firmar uma ordem natural ao álbum, como se Tyler desse as boas vindas de forma comportada no eixo inicial do disco, para lentamente sufocar e até assassinar o ouvinte com o passar das canções.

De maneira bastante óbvia, Wolf não possui o mesmo impacto e tampouco as polêmicas que se manifestavam no interior de Goblin. Trata-se de uma obra que sobrevive de acordo com regras próprias, muitas delas mutáveis, rompendo de forma nítida com o que fora conquistado de forma conceitual desde o lançamento de Bastard. Independente dos percursos e temáticas assumidas, com o recente trabalho Tyler, The Creator conclui o que parecia propor desde o primeiro disco: transformar cada novo álbum solo em uma manifestação (real ou fictícia) de sua própria insanidade.

Tyler, The Creator

Wolf (2013, Odd Future)

Nota: 8.0
Para quem gosta de: OFWGKTA, Earl Sweatshirt e MellowHype
Ouça: Trashwang, Treehome 95 e Answer

[soundcloud url=”http://api.soundcloud.com/tracks/79418420″ params=”” width=” 100%” height=”166″ iframe=”true” /]

[soundcloud url=”http://api.soundcloud.com/tracks/79346207″ params=”” width=” 100%” height=”166″ iframe=”true” /]

Jornalista, criador do Música Instantânea e integrante do podcast Vamos Falar Sobre Música. Já passou por diferentes publicações de Editora Abril, foi editor de Cultura e Entretenimento no Huffington Post Brasil, colaborou com a Folha de S. Paulo e trabalhou com Brand Experience e Creative Copywriter em marcas como Itaú e QuintoAndar. Pai do Pudim, “ataca de DJ” nas horas vagas e adora ganhar discos de vinil de presente.

Jornalista, criador do Música Instantânea e integrante do podcast Vamos Falar Sobre Música. Já passou por diferentes publicações de Editora Abril, foi editor de Cultura e Entretenimento no Huffington Post Brasil, colaborou com a Folha de S. Paulo e trabalhou com Brand Experience e Creative Copywriter em marcas como Itaú e QuintoAndar. Pai do Pudim, “ataca de DJ” nas horas vagas e adora ganhar discos de vinil de presente.