Por: Cleber Facchi
Dez anos se passaram desde que o produtor norte-americano Diplo – orientado pelo brasileiro DJ Marlboro -, se aproveitou das batidas do Funk Carioca para lançar o trabalho da rapper M.I.A.. Ainda que o sucesso da artista britânica só fosse confirmado um ano mais tarde, com o lançamento do disco Arular, é com a mixtape Piracy Funds Terrorism, distribuída em 2004, que o filho favelado do Miami Bass foi “oficialmente” apresentado ao mundo.
Trampolim para que nomes como Deize Tigrona – “matéria-prima” do hit Bucky Done Gun -, Tati Quebra-Barraco e posteriormente os curitibanos do Bonde do Rolê encontrassem o público estrangeiro, o gênero parcialmente esquecido volta a ocupar um lugar de destaque dentro da música internacional. Contudo, enquanto na última década o ritmo dos morros foi encarado como um som exótico, uma espécie de produto tropical emanada das “selvas” brasileiras, hoje ele ressurge sob parcial culto e evidente adoração.
Dissolvido como um complemento leve, o estilo transita com liberdade por entre novatos da música eletrônica e pequenos notáveis da cena independente. Enquanto o canadense Ryan Hemsworth reconfigurou o gênero à sua maneira, acrescentando temas orientais e artifícios doces para o nascimento de dois bons registros – Guilt Trips e o EP Still Awake -, a sueca Mapei fez das batidas uma ponte para o R&B. O resultado está na formação de Don’t Wait, uma melancólica declaração de amor que rebola de forma letárgica, quase como uma versão preguiçosa do Funk Melody que ocupa a música brasileira. Sobram grupos como o norte-americano Misun, e o hit Travel With Me, a sueca Elliphant, com Make It Juicy, além de todo um catálogo de artistas que brincam de forma entusiasmada com o estilo.
É justamente esse mesmo fascínio pelo Funk que fez o selo britânico Bolabo Records investir no trio Pearls Negras. Formado no Morro do Vidigal, Rio de Janeiro, o projeto composto por Alice Coelho, Mariana Feitosa e Jennifer Loiola é tudo aquilo que a conterrânea Anitta tentou no primeiro disco, mas não conseguiu. Impulsionado pelo hit Pensando Em Você – produzido pelo inglês David Alexander -, o trio ultrapassa os limites do Melody, anexando na leveza típica do pop um produto acessível ao mercado estrangeiro – que já reserva uma série de apresentações do grupo fora do país.
Mesmo o louvor dos estrangeiros parece incapaz de mudar a opinião de parte dos brasileiros, que mantêm o gênero sob parcial desprezo. Até mesmo os “monstros sagrados da MPB” já se curvaram perante o estilo, caso de Gal Costa, em Recanto (2011), e o parceiro Caetano Veloso, na escancarada Funk Melódico, do disco Abraçaço (2012).
Não importa. O olhar torto, ou melhor, o recalque da “elite cultural” parece bater no ombro de gigantes como Valesca Popozuda e se desfazer instantaneamente. Com Beijinho No Ombro, mais recente criação da cantora, alcançando a marca de 7 milhões de visualizações no Youtube, Valesca desfila poderosa com uma agenda de shows lotados e um cachê que iguala o de grandes nomes da música brasileira tradicional. Mesmo a marginalidade do funk parece desaparecer em meio aos luxos bem aplicados da artista, afinal, que outro cantor brasileiro consegue desembolsar quase meio milhão de reais para a gravação de um clipe?
Talvez apenas Naldo Benny. Com uma agenda tão disputada quanto a de Valesca e participação no dominical Sai do Chão, da Rede Globo, o autor de Amor de Chocolate e Exagerado ocupa territórios e domina o público manuseando o estilo à seu favor. Ainda que o detalhamento melódico encontrado pelo cantor perverta a estética original do gênero, a recepção favorável das massas parece se reverter em boas quantias de dinheiro.
Há também o versátil João Brasil, que ao mergulhar no estilo pré-Furacão 2000 transformou o Rio Shock (parceria com Dannie, Júnior Teixeira e MC Sabará) em um dos projetos mais inventivos do gênero. Bastam os poucos minutos do hit Moleque Transante para ser hipnotizado pelo tempero nostálgico lançado pelo produtor.
No fim das contas, prevalece o teor glorioso dos versos de Valesca Popozuda, que suplanta o desprezo do “gosto refinado”, fatura (muito) e ainda serve para dançar: “Desejo a todas inimigas vida longa/ Pra que elas vejam a cada dia mais nossa vitória“.
Jornalista, criador do Música Instantânea e integrante do podcast Vamos Falar Sobre Música. Já passou por diferentes publicações de Editora Abril, foi editor de Cultura e Entretenimento no Huffington Post Brasil, colaborou com a Folha de S. Paulo e trabalhou com Brand Experience e Creative Copywriter em marcas como Itaú e QuintoAndar. Pai do Pudim, “ataca de DJ” nas horas vagas e adora ganhar discos de vinil de presente.
Jornalista, criador do Música Instantânea e integrante do podcast Vamos Falar Sobre Música. Já passou por diferentes publicações de Editora Abril, foi editor de Cultura e Entretenimento no Huffington Post Brasil, colaborou com a Folha de S. Paulo e trabalhou com Brand Experience e Creative Copywriter em marcas como Itaú e QuintoAndar. Pai do Pudim, “ataca de DJ” nas horas vagas e adora ganhar discos de vinil de presente.