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Críticas

Teto Preto

: "Pedra Preta"

Ano: 2018

Selo: Mamba Recs

Gênero: Eletrônica, Techno, Pós-Industrial

Para quem gosta de: L_Cio, Linn da Quebrada e ^L_

Ouça: Bate Mais, Gasolina Aditivada e D+Ìvidas

8.7
8.7

Resenha: “Pedra Preta”, Teto Preto

Ano: 2018

Selo: Mamba Recs

Gênero: Eletrônica, Techno, Pós-Industrial

Para quem gosta de: L_Cio, Linn da Quebrada e ^L_

Ouça: Bate Mais, Gasolina Aditivada e D+Ìvidas

/ Por: Cleber Facchi 14/11/2018

Como transportar para dentro de estúdio a mesma força e atmosfera caótica que embala as apresentações da Teto Preto? Ponto central do imenso turbilhão criativo que vem movimentando a cidade de São Paulo desde o início da presente década – vide diferentes festas de rua e eventos de ocupação do centro, como a Mamba Negra –, a performance do coletivo paulistano assume nova formatação em cada uma das oito faixas que marcam o primeiro álbum de estúdio do grupo, Pedra Preta (2018, Mamba Rec). Uma interpretação polida, mas não menos significativa de tudo aquilo que sintetiza a estranheza e o caráter contestador do projeto comandado por Laura Diaz (CarneOsso).

Consumido pela força das batidas, vozes berradas e ruídos eletrônicos que encolhem e crescem a todo instantes, Pedra Preta reflete com naturalidade a atmosfera delirante da capital paulista, porém, sempre apontando para fora, como uma fuga desse mesmo universo. São colagens e ambientações estéticas que acabam valorizando a presença de cada integrante relacionado ao projeto, além de Diaz, completo pela presença de Loic Koutana (performance), Pedro Zopelar (sintetizadores, bateria eletrônica), Savio de Queiroz (sintetizadores, bateria eletrônica) e William Bica (percussão, trombone).

Exemplo disso está na composição turbulenta que ganha forma na terceira faixa do disco, Em D+Ìvidas. Entre sintetizadores e batidas cíclicas, a voz instável de Diaz se projeta de forma provocativa: “Vocês reclamam / Mas ainda não viram nada / Não é a vaidade / É sobre um vazio de ausência / Num profundo pesar / Vocês estão perdidos“. Versos que discutem a incerteza dos relacionamentos, caos econômico, medo e conflitos que invadem a mente de qualquer indivíduo. Um misto de desespero e aceitação, direcionamento também explícito na música de abertura do disco, a crescente Safo (“Não minto, eu me queria morta / Deixava-me desfeita em lágrimas“). Nada que se compare ao material entregue pelo grupo em Gasolina Aditivada.

Originalmente apresentada ao público no homônimo EP de 2016, a canção passa agora por um novo tratamento em estúdio, reforçando não apenas a poesia de Diaz, mas, principalmente, o rico alicerce eletrônico e base metálica que serve de sustento à faixa. “Eu sou o pão vivo que desceu do céu / E quem comer desse pão, para sempre viverá … E quem come da minha carne / E bebe do meu sangue / Permanece em mim / E eu nele“, canta enquanto sintetizadores e batidas descompassadas revisitam o industrial techno da década de 1990. Uma avalanche de ruídos e versos soltos que ganha ainda mais destaque na derradeira Bate Mais, composição de essência política que carrega nos versos um importante debate sobre os recentes assassinatos da vereadora Marielle Franco e da estudante Matheusa.

Uma vez dentro desse ambiente sombrio, curioso perceber como o coletivo estabelece pequenos respiros criativos, confortando o ouvinte. É o caso de Bica, música que soa como uma releitura autoral dos encontros esporádicos entre e Marcos Vale e Azymuth, e, principalmente, a faixa-título do disco. Entre sintetizadores marcados pelos detalhes, a poesia livre de Diaz vai de encontro ao som jazzístico dos anos 1970 e 1980, como uma fuga leve da composição ruidosa que ganha forma tão logo disco tem início, em Safo.

Pensado para além das pistas, Pedra Preta perverte a eletrônica tradicional em uma linguagem própria do coletivo paulistano. São ambientações tribais, vozes ritualísticas e inserções eletrônicas que arrastam o ouvinte para dentro de um território marcado pela incerteza. Instantes em que Diaz e os parceiros de grupo confessam algumas de suas principais influências, porém, de forma autoral, jogando com as possibilidades. Versos guiados pela fúria, paixão, desejo e revolta política, estímulo para o ambiente de formas abstratas e incontáveis variações rítmicas que orientam a experiência do ouvinte até o último fragmento da obra.

 

Jornalista, criador do Música Instantânea e integrante do podcast Vamos Falar Sobre Música. Já passou por diferentes publicações de Editora Abril, foi editor de Cultura e Entretenimento no Huffington Post Brasil, colaborou com a Folha de S. Paulo e trabalhou com Brand Experience e Creative Copywriter em marcas como Itaú e QuintoAndar. Pai do Pudim, “ataca de DJ” nas horas vagas e adora ganhar discos de vinil de presente.

Jornalista, criador do Música Instantânea e integrante do podcast Vamos Falar Sobre Música. Já passou por diferentes publicações de Editora Abril, foi editor de Cultura e Entretenimento no Huffington Post Brasil, colaborou com a Folha de S. Paulo e trabalhou com Brand Experience e Creative Copywriter em marcas como Itaú e QuintoAndar. Pai do Pudim, “ataca de DJ” nas horas vagas e adora ganhar discos de vinil de presente.