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Críticas

Potyguara Bardo

: "Simulacre"

Ano: 2018

Selo: DoSol

Gênero: Pop, Alternativa, Indie

Para quem gosta de: Pabllo Vittar e Urias

Ouça: Karamba, Plene e Lambada do Flop

7.7
7.7

Resenha: “Simulacre”, Potyguara Bardo

Ano: 2018

Selo: DoSol

Gênero: Pop, Alternativa, Indie

Para quem gosta de: Pabllo Vittar e Urias

Ouça: Karamba, Plene e Lambada do Flop

/ Por: Cleber Facchi 12/12/2018

Simulacre (2018, DoSol) é uma obra estranha. Fuga declarada do som plástico que parece orientar o trabalho de outros tantos representantes do pop nacional, a estreia da drag queen norte-riograndense Potyguara Bardo dança pelo campo do incerto de forma a estimular a fragmentação das ideias. Retalhos poéticos, instrumentais e estéticos que se entrelaçam sem ordem aparente, ponto de partida para cada uma das nove faixas que brincam com interpretação do ouvinte durante toda a execução do álbum.

Produto da colaboração entre os músicos Walter Nazário (Mahmed), Dante Augusto, Mateus Tinôco e José Aquilino, esse último, compositor e grande responsável pela personagem holística que dá título à obra, Simulacre encontra na perversão de velhos conceitos o principal componente criativo para o fortalecimento das faixas. São variações rítmicas que atravessam o pop radiofônico de Pabllo Vittar para dialogar com elementos do reggae, brega e música eletrônica de forma propositadamente incerta, torta.

De essência lisérgica, tema reforçado logo nos primeiros minutos do disco, na divertida narrativa entre Bardo e a gerente de um restaurante, Simulacre sustenta no lirismo cômico o principal elemento de conexão entre as faixas. Da busca por um novo romance, em Karamba, colaboração com Kaya Conky (“Que delícia / É da minha cidade / Acho que encontrei meu amor de verdade / Pai dos meus filhos / Deu uma vontade / Ascendente de sarrar“), à completa desilusão que invade Balada do Flop, música que utiliza trechos do viral Será Que Eu Estou Na Lagoinha?, perceba como Aquilino mantém firme a poesia bem-humorada durante toda a execução da obra.

São letras marcadas pela temática existencialista, como na derradeira Você Não Existe (“Você não existe / E eu também não / Tudo que tem nessa vida é fruto da imaginação“); o lirismo explícito, em Mamma Mia (“Sou uma peça rara de uma leva especial / No meio das minhas coxas guardo algo colossal … Não contemplo a existência nem penso na depressão / Eureca de cu é pica vem sentar no cabeção“), além, claro, de versos que parecem pensados para grudar na cabeça do ouvinte, conceito explícito na já citada Karamba (“Com esse rostinho / Teu olhar me faz pleno / Boy eu quero te add / E eu fico tipo / Kaka,kaka,kaka,kaka,kaka,kaka,kaka, ka karamba!“).

Claro que nem todas as músicas do disco parecem seguir a mesma trilha cômica. É o caso do pop romântico que invade a agridoce Oasis (“Mas eu sei que você não me quer / Me afobei quando meu beijo retribuiu / Não faz mal, benzinho não vou lhe incomodar / 1001 rejeições já precisei encarar“), uma das canções mais preciosas do disco. O mesmo acontece no encontro com Luisa e os Alquimistas, em Plene, composição marcada pelo forte aspecto contemplativo dos versos (“Foi libertador poder me enxergar / Depois que desliguei a lanterna da culpa / E vi meu reflexo se desintegrar / Virando uma serpente segurando uma fruta“).

Passagem direta para um universo próprio da artista norte-riograndense, direcionamento explícito logo na imagem de capa do disco, Simulacre se divide a todo momento entre a realidade e o delírio. O próprio título da obra — um neologismo formado a partir das palavras “simulacro” e “lacre” —, diz muito sobre o conceito desbravado no decorrer da obra. Composições que transitam entre crises existenciais e a necessidade do eu lírico em se encontrar criativamente, proposta que faz da estreia de Potyguara Bardo uma das obras mais inventivas (e loucas) que surgiram nos últimos meses.


Jornalista, criador do Música Instantânea e integrante do podcast Vamos Falar Sobre Música. Já passou por diferentes publicações de Editora Abril, foi editor de Cultura e Entretenimento no Huffington Post Brasil, colaborou com a Folha de S. Paulo e trabalhou com Brand Experience e Creative Copywriter em marcas como Itaú e QuintoAndar. Pai do Pudim, “ataca de DJ” nas horas vagas e adora ganhar discos de vinil de presente.

Jornalista, criador do Música Instantânea e integrante do podcast Vamos Falar Sobre Música. Já passou por diferentes publicações de Editora Abril, foi editor de Cultura e Entretenimento no Huffington Post Brasil, colaborou com a Folha de S. Paulo e trabalhou com Brand Experience e Creative Copywriter em marcas como Itaú e QuintoAndar. Pai do Pudim, “ataca de DJ” nas horas vagas e adora ganhar discos de vinil de presente.