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Crítica

Sleater-Kinney

: "Little Rope"

Ano: 2024

Selo: Loma Vista

Gênero: Rock

Para quem gosta de: The Julie Ruin e The Breeders

Ouça: Say It Like You Mean It e Hell

7.8
7.8

Sleater-Kinney: “Little Rope”

Ano: 2024

Selo: Loma Vista

Gênero: Rock

Para quem gosta de: The Julie Ruin e The Breeders

Ouça: Say It Like You Mean It e Hell

/ Por: Cleber Facchi 24/01/2024

Como é bom ouvir o Sleater-Kinney novamente fazendo aquilo que sabe de melhor. Depois de dois registros bastante confusos, caso de The Center Won’t Hold (2019), disco que resultou na saída de Janet Weiss, baterista que acompanhou o grupo durante mais de uma década, e Path of Wellness (2021), material que evidencia a tentativa de reorganização por parte das duas integrantes remanescentes, Little Rope (2024, Loma Vista) traz a dupla formada pelas guitarristas Carrie Brownstein e Corin Tucker de volta aos eixos e se revela como o trabalho mais potente da banda desde o regresso com No Cities to Love (2015).

Parte dessa mudança de direção em relação aos dois últimos trabalhos da banda não se dá por acaso. Em meados de 2022, logo nas primeiras semanas de gravação do novo disco, Tucker recebeu uma ligação da embaixada dos Estados Unidos na Itália tentando localizar Brownstein para informar que um acidente de trânsito havia ceifado a vida da mãe e do padrasto da artista enquanto desfrutavam de suas férias no país. A notícia, obviamente, caiu como uma bomba e acabou mudando os rumos da obra que estabelece em temas como o luto e a efemeridade da vida um estímulo natural para a construção dos versos e arranjos.

Diga como se quisesse, eu preciso ouvir antes de partir / Diga com sinceridade / Esse adeus dói quando você se vai“, canta em Say It Like You Mean It, música em que trata sobre os sentimentos não ditos em vida e que se transformam em dor após a morte de um ente querido. É como um delicado exercício poético de exposição emocional. Instantes em que Brownstein traz de volta a mesma vulnerabilidade destacada em obras como Dig Me Out (1997), porém, partindo de um novo e delicado enquadramento. Claro que nem todas as canções do registro partilham da mesma sobriedade. Algumas simplesmente parecem explodir.

Composição de abertura do trabalho, Hell talvez seja o exemplo máximo disso. “O inferno não tem futuro / O inferno não tem dúvidas / O inferno é apenas um lugar onde / Parece que não conseguimos viver sem eu me despedaçar“, canta Brownstein em uma clara reflexão sobre o período vivido nos momentos iniciais de luto, mas que parece aplicável a outros instantes de maior instabilidade emocional ao longo da vida. Esse mesmo lirismo angustiado acaba se refletindo em outras canções de Little Rope. São faixas como Hunt You Down e Don’t Feel Right que transportam para dentro de estúdio parte das angústias vividas pela artista.

E não são apenas os versos que destacam os tormentos sentidos no decorrer do registro, mas a imposição dos instrumentos. Diferente dos lançamentos anteriores, quando a banda, estimulada pela produção de St. Vincent, decidiu investir no uso dos sintetizadores e programações eletrônicas, Little Rope mais uma vez posiciona as guitarras e batidas em primeiro plano, destacando a produção carregada de John Congleton. O resultado desse processo está na entrega de faixas que parecem pesar sobre o ouvinte. Composições como a ruidosa Six Mistakes e Untidy Creature que resgatam a essência de obras como The Woods (2005).

Naturalmente, essa forte similaridade e crueza explícita na construção dos arranjos resulta na formação de um material excessivamente íntimo dos antigos trabalhos do grupo. É como um regresso talvez confortável para Brownstein e Tucker, mas que sustenta na força avassaladora dos versos um precioso componente de transformação. Para além das indagações e temas políticos que historicamente orientaram as criações do Sleater-Kinney ao longo da carreira, o registro de dez faixas chama a atenção pela sensibilidade dos versos, evidenciando uma fragilidade sentimental poucas vezes antes percebida dentro da discografia da banda.

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Jornalista, criador do Música Instantânea e integrante do podcast Vamos Falar Sobre Música. Já passou por diferentes publicações de Editora Abril, foi editor de Cultura e Entretenimento no Huffington Post Brasil, colaborou com a Folha de S. Paulo e trabalhou com Brand Experience e Creative Copywriter em marcas como Itaú e QuintoAndar. Pai do Pudim, “ataca de DJ” nas horas vagas e adora ganhar discos de vinil de presente.

Jornalista, criador do Música Instantânea e integrante do podcast Vamos Falar Sobre Música. Já passou por diferentes publicações de Editora Abril, foi editor de Cultura e Entretenimento no Huffington Post Brasil, colaborou com a Folha de S. Paulo e trabalhou com Brand Experience e Creative Copywriter em marcas como Itaú e QuintoAndar. Pai do Pudim, “ataca de DJ” nas horas vagas e adora ganhar discos de vinil de presente.