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Crítica

Besouro Mulher

: "Volto Amanhã"

Ano: 2023

Selo: Rockambole

Gênero: Indie Rock

Para quem gosta de: Pelados e Ana Frango Elétrico

Ouça: Carótida, Torresmo e Seus Vazios

8.3
8.3

Besouro Mulher: “Volto Amanhã”

Ano: 2023

Selo: Rockambole

Gênero: Indie Rock

Para quem gosta de: Pelados e Ana Frango Elétrico

Ouça: Carótida, Torresmo e Seus Vazios

/ Por: Cleber Facchi 21/07/2023

Os versos detalhados por Sophia Chablau nos minutos finais de Carótida, composição de abertura de Volto Amanhã (2023, Rockambole), ajudam a entender parte do caos particular que orienta o primeiro trabalho de estúdio do quarteto paulistano Besouro Mulher. “Viver é uma pequena parte / De um grande universo chamado eu“, canta a artista. É partindo justamente desse olhar para as próprias inquietações e conflitos internalizados que a banda, completa pelos músicos Arthur Merlino (baixo), Bento Pestana (guitarra) e Vitor Park (bateria), aponta a direção seguida até os últimos segundos do turbulento registro de estreia.

São canções que encolhem e crescem a todo instante, assumindo percursos pouco usuais que arremessam o ouvinte de um canto a outro. E isso fica ainda mais evidente com a chegada de Torresmo. Originalmente apresentada por Juliana Perdigão e Arnaldo Antunes no álbum Folhuda (2019), a faixa reaparece de forma totalmente transformada pelo quarteto que não economiza na potência das guitarras e batidas sempre destacadas. Mesmo quando desacelera momentaneamente, como em Alguma Coisa, música que parece saída de algum disco de Mac DeMarco, há sempre um componente de ruptura que bagunça e amplia os rumos da obra, como a mudança no andamento da composição que se projeta de forma quebradiça, torta.

Nada que impossibilite a construção de faixas deliciosamente acessíveis e capazes de dialogar com uma parcela ainda maior de ouvintes. É o caso de Pão Francês. Mesmo que estruturalmente a canção pareça ancorada na proposta dos amores linguísticos explorada por Chablau em Hello, parte do primeiro álbum com os parceiros da banda Uma Enorme Perda de Tempo, difícil não se deixar seduzir pela poesia radiante da composição. “O dia acaba com bonsoir / E começa com bonjour / Ela me diz je t’aime / Eu só sei I love you“, brinca. Esse mesmo caráter sentimental, porém, partindo e uma abordagem diferente, pode ser percebido em Curto/Tempo, delicada criação que trata sobre os encontros e desencontros de um casal.

O mais interessante talvez seja perceber a forma como o grupo alterna momentos de maior sensibilidade com canções marcadas pelo aspecto celebrativo. Exemplo disso fica bastante evidente em Vamos Indo, música substitui o recolhimento de Curto/Tempo pela atmosfera ensolarada que vai do violão ao coro de vozes. É como um chamado para a euforia e riqueza de detalhes que se apodera da segunda metade do disco, como na imprevisível Música 7. Em um intervalo de poucos minutos, a faixa adornada pelo uso de metais, cordas e entalhes percussivos rompe com qualquer traço de conforto em uma insana combinação de elementos que muda de direção a todo momento, reforçando o caráter exploratório do quarteto.

Tudo é tratado de maneira tão grandiosa que Pele, vinda logo em sequência, é praticamente engolida. Entretanto, por trás da faixa de base econômica, se esconde uma das composições mais tocantes do disco. “Seus olhos vermelhos me pedem consolo / Meus olhos pretos, perdão / As nuvens sustentam nossas lágrimas / Suas omoplatas não“, canta Chablau em um exercício tão descritivo e intimista que o ouvinte é praticamente transportado para dentro da canção. São criações em que a artista posiciona uma lupa sobre relacionamentos e cenas simples do cotidiano, direcionamento que se reflete na também contida Dia Útil, música que ganha forma e cresce aos poucos, sem pressa, estreitando laços emocionais com o ouvinte.

Vem desse forte aspecto sentimental a passagem para a canção seguinte, Seus Vazios. Entretanto, diferente das composições que a antecedem, a derradeira criação de Volto Amanhã rompe com a economia dos elementos em favor de um fechamento totalmente grandioso. “Me sinto pronto pra morrer“, repete Chablau em meio a guitarras ascendentes, batidas e vozes que evidenciam a potência do som produzido pelo grupo. São fragmentos instrumentais, poéticos e emocionais que, uma vez organizados em estúdio, funcionam como uma representação de tudo aquilo que o quarteto busca desenvolver do início ao fim do material.

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Jornalista, criador do Música Instantânea e integrante do podcast Vamos Falar Sobre Música. Já passou por diferentes publicações de Editora Abril, foi editor de Cultura e Entretenimento no Huffington Post Brasil, colaborou com a Folha de S. Paulo e trabalhou com Brand Experience e Creative Copywriter em marcas como Itaú e QuintoAndar. Pai do Pudim, “ataca de DJ” nas horas vagas e adora ganhar discos de vinil de presente.

Jornalista, criador do Música Instantânea e integrante do podcast Vamos Falar Sobre Música. Já passou por diferentes publicações de Editora Abril, foi editor de Cultura e Entretenimento no Huffington Post Brasil, colaborou com a Folha de S. Paulo e trabalhou com Brand Experience e Creative Copywriter em marcas como Itaú e QuintoAndar. Pai do Pudim, “ataca de DJ” nas horas vagas e adora ganhar discos de vinil de presente.