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Crítica

Carla Boregas

: "Pena Ao Mar"

Ano: 2023

Selo: iDEAL

Gênero: Experimental, Drone

Para quem gosta de: Mariá Portugal e Mari Herzer

Ouça: Pena Ao Mar e A Cidade Dos Outros

8.4
8.4

Carla Boregas: “Pena Ao Mar”

Ano: 2023

Selo: iDEAL

Gênero: Experimental, Drone

Para quem gosta de: Mariá Portugal e Mari Herzer

Ouça: Pena Ao Mar e A Cidade Dos Outros

/ Por: Cleber Facchi 09/06/2023

Os caminhos percorridos por Carla Boregas nem sempre são os mais acessíveis, mas com certeza são os mais interessantes. Conhecida pelo trabalho como integrante do Rakta, com quem lançou há quatro anos Falha Comum (2019), além de colaborações eventuais com músico Maurício Takara e as criações no Fronte Violeta, a multi-instrumentista paulistana que hoje reside em Berlim, na Alemanha, parece brincar com as possibilidades em Pena Ao Mar (2023, iDEAL). Estreia em carreira solo, o registro de oito faixas funciona como um acumulo natural de tudo aquilo que Boregas tem produzido em mais de uma década de atuação, porém, estabelece na lenta e permanente desconstrução dos elementos seu principal componente criativo.

Concebido em um processo de residência artística em Zurique, na Suíça, durante o ano de 2020, Pena Ao Mar avança em uma medida própria de tempo. Com Ações Em Paralelo como canção de abertura, Boregas apresenta parte dos elementos que serão incorporados e melhor explorados ao longo do trabalho. São ambientações acinzentadas que se completam pelo uso de texturas ocasionais, efeitos e captações de campo que garantem maior profundidade ao material. Sedimentações sintéticas que se revelam ao público em pequenas doses, formatando paisagens sonoras de maneira sempre granulada na cabeça do ouvinte.

Vem justamente dessa ausência de certeza e pequenas flutuações durante toda a execução do trabalho a real beleza de Pena Ao Mar. Composições geradas a partir de partículas sonoras que pouco a pouco se convertem em um emaranhado cósmico. Exemplo disso fica bastante evidente na própria faixa-título do disco. Pouco mais de cinco minutos em que Boregas utiliza da lenta sobreposição dos elementos para capturar a atenção do ouvinte e finalizar a canção em uma abordagem quase transcendental. E ela está longe de ser a única a causar o mesmo efeito, vide a riqueza de detalhes explícita em A Cidade Dos Outros.

Claro que nem todas as canções partilham do mesmo direcionamento. Em Grafia do Invisível, por exemplo, são os sintetizadores drone e ambientações enevoadas que orientam o desenvolvimento do material. É como se Boregas fosse de encontro ao mesmo território criativo de nomes como Kali Malone e William Basinski, porém, partindo de uma abordagem resumida. O mesmo acontece na faixa seguinte, Suprime o Exterior, música que chama a atenção pela arquitetura minimalista, rompendo com a imprevisibilidade tão caracteriza do repertório de Pena Ao Mar, mas que em nenhum momento deixa de hipnotizar o ouvinte.

Parte desse resultado vem do esforço da musicista em utilizar de uma abordagem exploratória, porém, preservando a consistência e homogeneidade do registro. Seja pela escolha dos timbres ou o tratamento dado aos sintetizadores, tudo parece contribuir para a formação de uma atmosfera própria do trabalho. Mais do que garantir respostas, Boregas parece interessada nas perguntas, mergulhando na construção de faixas marcadas pelo direcionamento labiríntico, delicadas camadas instrumentais e até mesmo pelo misterioso uso das vozes, marca de Sopro, canção que faz lembrar das criações empoeiradas de Grouper.

Com todas essas particularidades, não é necessário dizer que Pena Ao Mar exige tempo e certa dose de dedicação por parte do público. São inserções sempre minuciosas e detalhes que dependem de uma audição atenta a fim de saborear todas as nuances do repertório concebido por Boregas. Claro que o ouvinte é recompensado durante toda a execução do material. Dividido entre momentos de maior contemplação e movimentos ascendentes, o registro funciona como uma jornada onde cada mínimo componente abre passagem para um universo de novas possibilidades, pequenas rupturas e sensações.

Ouça também:

Jornalista, criador do Música Instantânea e integrante do podcast Vamos Falar Sobre Música. Já passou por diferentes publicações de Editora Abril, foi editor de Cultura e Entretenimento no Huffington Post Brasil, colaborou com a Folha de S. Paulo e trabalhou com Brand Experience e Creative Copywriter em marcas como Itaú e QuintoAndar. Pai do Pudim, “ataca de DJ” nas horas vagas e adora ganhar discos de vinil de presente.

Jornalista, criador do Música Instantânea e integrante do podcast Vamos Falar Sobre Música. Já passou por diferentes publicações de Editora Abril, foi editor de Cultura e Entretenimento no Huffington Post Brasil, colaborou com a Folha de S. Paulo e trabalhou com Brand Experience e Creative Copywriter em marcas como Itaú e QuintoAndar. Pai do Pudim, “ataca de DJ” nas horas vagas e adora ganhar discos de vinil de presente.