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Crítica

Kim Gordon

: "The Collective"

Ano: 2024

Selo: Matador

Gênero: Rock, Experimental

Para quem gosta de: Body/Head e Sonic Youth

Ouça: Bye Bye, I'm a Man e The Believers

8.5
8.5

Kim Gordon: “The Collective”

Ano: 2024

Selo: Matador

Gênero: Rock, Experimental

Para quem gosta de: Body/Head e Sonic Youth

Ouça: Bye Bye, I'm a Man e The Believers

/ Por: Cleber Facchi 15/03/2024

Aos 70 anos, Kim Gordon segue tão provocativa e consciente do cenário que a cerca quanto em início de carreira. Primeiro trabalho de estúdio da cantora e compositora norte-americana após um intervalo de cinco anos, The Collective (2023, Matador) nasce como um acumulo das experiências e observações da artista sobre a nossa sociedade. Canções que partem da exposição excessiva nas redes sociais para jogar luz sobre outros comportamentos meticulosamente interpretados e dissolvidos em camadas de distorção.

Mais uma vez acompanhada pelo produtor Justin Raisen, com quem havia colaborado no disco anterior, No Home Record (2019), a artista estabelece um ponto de equilíbrio entre o experimentalismo proposto há mais de quatro décadas, quando deu vida aos primeiros registros do Sonic Youth, com o que se entende hoje como música pop. Das batidas sujas que bebem do mesmo soundcloud rap de Playboi Carti e Lil Uzi Vert, passando pelo uso da vozes que apontam diretamente para Charli XCX, parceira de longa data de Raisen, Gordon parece dançar pelo tempo enquanto aporta em temáticas e conceitos bastante específicos.

Música de abertura do disco, Bye Bye talvez seja a melhore representação disso. Enquanto as batidas e bases carregadas de efeitos parecem saídas de qualquer disco recente de rap, Gordon passeia em meio excessos, marcas de luxo e rotinas livres de qualquer propósito que escancaram a realidade forjada de milhares de influenciadores digitais. Essa mesma reflexão sobre o culto às celebridades acontece em Psychedelic Orgasm, com uma análise atualizada sobre a cidade de Los Angeles, onde a artista cresceu.

A diferença em relação a outros exemplares do gênero, quase sempre marcados pelo julgamento moral e impossibilidade de reflexão, está na forma como Gordon apresenta as peças e deixa que ouvinte monte a própria interpretação. Assim como em No Home Record, a voz cantada mais uma vez dá lugar à poesia falada. São versos descritivos que detalham cenas, diferentes personagens e acontecimentos em meio a blocos de ruídos quase intransponíveis. Arte em seu estado mais puro, feita para tensionar a experiência.

Perfeita representação desse resultado pode ser percebido em I’m a Man, canção em que utiliza de frases tipicamente utilizadas para exaltar homens conservadores, mas que acabam revelando a imagem de uma figura totalmente ignorante e desprezível. É como se cada nova criação assumisse uma função específica, revelando desde tensões poéticas que destacam a acidez de Gordon, como composições em que a artista se desfia criativamente, vide The Believers, em que partilha do mesmo hyperpop de nomes como SOPHIE.

Propositadamente irregular e pontuado pela inserção de composições que soam ainda incompletas, como a esquelética e esquecível Trophies, uma das menos impactantes do trabalho, The Collective naturalmente exige um regresso por parte do ouvinte até que seja totalmente absorvido, porém, talvez seja o trabalho mais imediato de Gordon desde o encerramento das atividades do Sonic Youth. Enquanto os versos continuam a reverberar para além dos limites da obra, criando diferentes reflexões a cada nova audição, batidas e bases se conectam de maneira quase instantânea. É como uma estranha interpretação sobre a música pop, estímulo para um desconcertante exercício criativo que seduz e provoca na mesma medida.

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Jornalista, criador do Música Instantânea e integrante do podcast Vamos Falar Sobre Música. Já passou por diferentes publicações de Editora Abril, foi editor de Cultura e Entretenimento no Huffington Post Brasil, colaborou com a Folha de S. Paulo e trabalhou com Brand Experience e Creative Copywriter em marcas como Itaú e QuintoAndar. Pai do Pudim, “ataca de DJ” nas horas vagas e adora ganhar discos de vinil de presente.

Jornalista, criador do Música Instantânea e integrante do podcast Vamos Falar Sobre Música. Já passou por diferentes publicações de Editora Abril, foi editor de Cultura e Entretenimento no Huffington Post Brasil, colaborou com a Folha de S. Paulo e trabalhou com Brand Experience e Creative Copywriter em marcas como Itaú e QuintoAndar. Pai do Pudim, “ataca de DJ” nas horas vagas e adora ganhar discos de vinil de presente.