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Crítica

MIKE

: "Burnng Desire"

Ano: 2023

Selo: 10k

Gênero: Hip-Hop, Rap

Para quem gosta de: Earl Sweatshirt e Billy Woods

Ouça: Plz don’t cut my wings e U think Maybe?

8.0
8.0

MIKE: “Burning Desire”

Ano: 2023

Selo: 10k

Gênero: Hip-Hop, Rap

Para quem gosta de: Earl Sweatshirt e Billy Woods

Ouça: Plz don’t cut my wings e U think Maybe?

/ Por: Cleber Facchi 01/11/2023

Burning Desire (2023, 10k), como tudo aquilo que tem sido revelado por MIKE nos últimos meses, nasce como um produto da mente inquieta do rapper de Nova Jersey, se projeta de maneira totalmente incerta, mas em nenhum momento deixa de encantar o ouvinte. São diferentes estudos transformados em obras que se aprofundam em crises existenciais, reflexões sobre o núcleo familiar do próprio artista e questões raciais que vão de análises historiográficas ao presente cenário de forma provocativa. Composições que partilham de uma abordagem bastante característica, porém, liricamente livres de possíveis repetições.

Sequência ao material entregue no ainda recente Faith Is a Rock (2023), trabalho assinado em parceria com Wiki e The Alchemist, e primeiro lançamento em carreira solo desde Beware of the Monkey (2022), o registro de 24 composições, todas bastante curtas, evidencia uma transformação na postura de MIKE. Ainda que a voz murmurante e monocórdica se faça evidente durante toda a execução do material, o que se percebe é uma maior imposição do artista que deixa de lado a atmosfera soturna de algumas de suas principais obras, como May God Bless Your Hustle (2017) e Disco! (2021), para trilhar um novo percurso.

Parte desse resultado vem do esforço do artista em mergulhar em novas temáticas. Como indicado logo nos minutos iniciais, no texto lido pela britânica Klein, MIKE busca agora inspiração nas histórias e mitos do continente africano. É como uma interpretação sobre a própria ancestralidade e herança cultural, mas que em nenhum momento rompe laços com o presente. Instantes em que o rapper vai de encontro ao mesmo território criativo explorado por Billy Woods no bem-sucedido Aethiopes (2022), porém, partindo de um direcionamento totalmente retorcido e particular, íntimo das experiências vividas pelo norte-americano.

São canções que tratam de conflitos pessoais, medos, conquistas e momentos de maior vulnerabilidade que posicionam MIKE sempre em primeiro plano. “Alguém me lembre que há um propósito nesta vida“, rima na densa faixa-título, música que funciona como um passeio atormentado pela mente do próprio rapper. Claro que esse tipo de abordagem está longe de parecer uma novidade para quem há tempos acompanha as criações do artista. A diferença está na forma como a busca por antigas respostas hoje abre passagem para algumas certezas, conceito que acaba se refletindo até os minutos finais do trabalho, em Let’s Have a Ball.

Embora parta de um universo bastante particular, interessante perceber em Burning Desire o esforço de MIKE em dialogar com diferentes parceiros criativos durante toda a execução do material. Alguns, como Earl Sweatshirt, com quem divide a labiríntica Plz Don’t Cut My Wings, são colaboradores de longa data e parecem seguir a trilha apontada pelo rapper. Já outros, como a cantora Liv.e, dona das vozes em U Think Maybe?, acabam levando o registro para um novo território. São composições que preservam o habitual experimentalismo do artista na mesma medida em que ampliam o próprio campo de atuação em estúdio.

Partindo dessa intensa movimentação, diálogos com diferentes parceiros criativos e permanente busca por novas possibilidades, MIKE garante ao público uma de suas criações mais complexas e musicalmente diversas. Mesmo que alguns excessos sejam percebidos no decorrer do trabalho, efeito do exagerado número de canções, tudo se articula de maneira tão dinâmica que Burning Desire se encerra tão rápido quanto tem início. Composições essencialmente curtas, sempre resolvidas em um intervalo de poucos minutos, porém, marcadas pela riqueza de ideias, diferentes vozes e atravessamentos de informações.

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Jornalista, criador do Música Instantânea e integrante do podcast Vamos Falar Sobre Música. Já passou por diferentes publicações de Editora Abril, foi editor de Cultura e Entretenimento no Huffington Post Brasil, colaborou com a Folha de S. Paulo e trabalhou com Brand Experience e Creative Copywriter em marcas como Itaú e QuintoAndar. Pai do Pudim, “ataca de DJ” nas horas vagas e adora ganhar discos de vinil de presente.

Jornalista, criador do Música Instantânea e integrante do podcast Vamos Falar Sobre Música. Já passou por diferentes publicações de Editora Abril, foi editor de Cultura e Entretenimento no Huffington Post Brasil, colaborou com a Folha de S. Paulo e trabalhou com Brand Experience e Creative Copywriter em marcas como Itaú e QuintoAndar. Pai do Pudim, “ataca de DJ” nas horas vagas e adora ganhar discos de vinil de presente.