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Crítica

Mustafa

: "Dunya"

Ano: 2024

Selo: Jagjaguwar

Gênero: Soul

Para quem gosta de: Sampha e serpentwithfeet

Ouça: Gaza is Calling, Imaan e Name of God

8.0
8.0

Mustafa: “Dunya”

Ano: 2024

Selo: Jagjaguwar

Gênero: Soul

Para quem gosta de: Sampha e serpentwithfeet

Ouça: Gaza is Calling, Imaan e Name of God

/ Por: Cleber Facchi 10/10/2024

Há quatro anos, desde que foi oficialmente apresentado com o lançamento da música Come Back, delicada parceria com o britânico James Blake, Mustafa sempre deixou bastante claro o universo temático que viria a explorar em seus trabalhos. São composições que discutem a vida em comunidade, conflitos pessoais e, principalmente, a relação do artista canadense, que é descendente de sudaneses muçulmanos, com a fé islâmica, o que o próprio cantor descreve como “o relacionamento mais longo e peculiar da minha vida”.

Vem justamente dessa relação com a fé e o cenário ao redor o estímulo para o primeiro trabalho de estúdio do canadense, Dunya (2024, Jagjaguwar). Sequência ao material entregue no EP When Smoke Rises (2021), o registro, que em árabe significa “o mundo em todas as suas falhas”, chama a atenção pela maneira como Mustafa trata com extrema delicadeza questões sempre complexas. Composições geradas em um ambiente de dor, ainda que profundamente acolhedoras, como um alentador diálogo do poeta com o próprio ouvinte.

A própria escolha de Name of God como composição de abertura do trabalho funciona como uma delicada representação desse resultado. Enquanto arranjos acústicos e vozes macias, lembrando a obra de Bon Iver, ganham forma aos poucos, versos entristecidos discutem a efemeridade da vida e o luto a partir da morte precoce do irmão do artista. “Nossos olhos estão vermelhos / Mas você está chapado / Eu estou chorando / Você está tentando esquecer”, confessa o poeta em um sempre precioso exercício de exposição emocional.

São composições que partem de cenas simples do cotidiano e reflexões de Mustafa sobre a vida dentro da comunidade muçulmana em que cresceu, porém, capazes de dialogar com todo e qualquer ouvinte. É o caso de Imaan. Completa pelas vozes de Snoh Aalegra, a música trata sobre o amor proibido entre duas pessoas, a busca por Deus e todo um universo de questões culturais, ideológicas e pessoais que atravessam essa relação. “Eu sei que nossas famílias nunca encontrarão o caminho para a mesma sala de estar”, canta.

É como a passagem para um universo particular, totalmente íntimo de Mustafa, porém nunca inacessível e sempre convidativo. Não por acaso, o poeta canadense fez do trabalho um campo aberto para a chegada de diferentes parceiros criativos. Alguns são mais discretos, como os produtores Aaron Dessner e Rodaidh McDonald, além, claro, da espanhola Rosalía, dona das vozes de apoio em I’ll Go Anywhere. Já outros, como o conterrâneo Daniel Caesar, parceiro do artista na música Leaving Toronto, surge com evidente destaque.

Ainda assim, é quando caminha solitário pelo interior do trabalho que o artista garante ao público algumas das composições mais impactantes do registro. Perfeita representação desse resultado pode ser percebida em Gaza Is Calling, música em que usa do confronto entre Israel e Palestina para discutir uma conflituosa relação de amizade vivida na infância. São canções que partem de uma abordagem tradicional, por vezes contidas em excesso, mas que ganham outro significado a partir do olhar de Mustafa sobre a realidade.

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Jornalista, criador do Música Instantânea e integrante do podcast Vamos Falar Sobre Música. Já passou por diferentes publicações de Editora Abril, foi editor de Cultura e Entretenimento no Huffington Post Brasil, colaborou com a Folha de S. Paulo e trabalhou com Brand Experience e Creative Copywriter em marcas como Itaú e QuintoAndar. Pai do Pudim, “ataca de DJ” nas horas vagas e adora ganhar discos de vinil de presente.

Jornalista, criador do Música Instantânea e integrante do podcast Vamos Falar Sobre Música. Já passou por diferentes publicações de Editora Abril, foi editor de Cultura e Entretenimento no Huffington Post Brasil, colaborou com a Folha de S. Paulo e trabalhou com Brand Experience e Creative Copywriter em marcas como Itaú e QuintoAndar. Pai do Pudim, “ataca de DJ” nas horas vagas e adora ganhar discos de vinil de presente.