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Crítica

N.I.N.A

: "Pele"

Ano: 2022

Selo: Independente

Gênero: Rap, Grime, Drill

Para quem gosta de: SD9 e Tasha & Tracie

Ouça: Luxúria e Oi, Sumido

8.3
8.3

N.I.N.A: “Pele”

Ano: 2022

Selo: Independente

Gênero: Rap, Grime, Drill

Para quem gosta de: SD9 e Tasha & Tracie

Ouça: Luxúria e Oi, Sumido

/ Por: Cleber Facchi 02/05/2022

Mesmo em um curto intervalo de atuação, Anna Ruth Ferreira, a N.I.N.A, acabou se transformando em um dos nomes mais importantes do grime/drill produzido no Brasil. Da boa repercussão em torno das próprias composições, caso de A Bruta, A Braba, A Forte, música incorporada como assinatura pela compositora fluminense, passando pelo diálogo com diferentes colaboradores, como SD9, no excelente 40°.40 (2020), sobram momentos em que a rapper assume uma posição de destaque em relação a outros nomes do meio. Talvez por isso, seja tão estranho pensar em Pele (2022) como o primeiro trabalho de estúdio da artista.

Na contramão de outros artistas do gênero, ainda em busca da própria identidade, N.I.N.A se apresenta ao público com uma obra madura e conceitualmente homogênea. São canções que orbitam um universo bastante particular, fazendo das emoções e evidente vulnerabilidade expressa nos versos um importante componente de aproximação entre as faixas. “Tentando não brigar comigo / Entender o perigo / Do peso que é as magoas que eu carrego / E hoje fazem meu abrigo“, reflete logo nos minutos iniciais, em Anna, música que sintetiza parte dos sentimentos explorados pela rapper durante toda a execução do trabalho.

Dentro desse cenário em que sonhos e desilusões se confundem a todo instante, N.I.N.A passeia em meio tormentos pessoais, conquistas e relacionamentos conturbados. Composições que se distanciam de possíveis malabarismos poéticos para tratar dos sentimentos e vivências expressas pela artista de forma sempre realista, crua. “O teto girando, a cama vomitada / Quem são essas duas doidas na minha sala? / Esse cara na cama, nunca vi na vida / Roubaram minha bolsa com 10k de hash“, detalha na descritiva Luxúria, música que evidencia a potência dos versos e ainda abre passagem para o lado mais sombrio do disco.

Essa mesma crueza no processo de composição acaba se refletindo até os minutos finais do trabalho, na música que leva o nome da própria artista. “Acha que é fácil ser preta? / Tenta ser visto como só uma buceta / Te arrastam pra trampo / Nem curto ir de treta“, dispara. É como um passeio tumultuado pela mente, traumas e inquietações da rapper. Instantes em que N.I.N.A parece dar voltas em torno de um mesmo conjunto de ideias, afundada em questões há muito detalhadas em faixas como Stephen King, mas que assumem pequenas curvas e quebras conceituais que invariavelmente mudam os rumos da obra.

Embora guiado pela força das rimas e versos atrelados às emoções de N.I.N.A, importante ressaltar o papel de Matheus Terra como produtor do trabalho. Parceiro de longa data da rapper, o artista que já colaborou com nomes como Mahmundi e BK se concentra na montagem de um repertório marcado pelo refinamento das bases e uso sempre calculado das batidas. Exemplo disso fica bastante evidente na já conhecida Oi, Sumido, música que ganha forma em meio a fragmentos de vozes e ruídos sintéticos. O mesmo acontece na canção seguinte, Matemática, precioso exercício criativo que cresce no reducionismo dos elementos.

Mesmo resolvido em um intervalo de apenas 20 minutos de duração, Pele é o típico caso de uma obra que exige uma escuta atenciosa e revela diferentes nuances a cada nova audição. Enquanto Terra se concentra na produção de uma base deliciosamente labiríntica, feita para que o ouvinte se perca dentro do trabalho, os versos detalhados por N.I.N.A funcionam como um elemento de condução, estreitando a relação com o público de forma sempre sensível. Composições que partem de experiências traumáticas, dores e conflitos pessoais, íntimas da artista, porém, capazes de estabelecer pequenas conexões de forma quase imediata.

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Jornalista, criador do Música Instantânea e integrante do podcast Vamos Falar Sobre Música. Já passou por diferentes publicações de Editora Abril, foi editor de Cultura e Entretenimento no Huffington Post Brasil, colaborou com a Folha de S. Paulo e trabalhou com Brand Experience e Creative Copywriter em marcas como Itaú e QuintoAndar. Pai do Pudim, “ataca de DJ” nas horas vagas e adora ganhar discos de vinil de presente.

Jornalista, criador do Música Instantânea e integrante do podcast Vamos Falar Sobre Música. Já passou por diferentes publicações de Editora Abril, foi editor de Cultura e Entretenimento no Huffington Post Brasil, colaborou com a Folha de S. Paulo e trabalhou com Brand Experience e Creative Copywriter em marcas como Itaú e QuintoAndar. Pai do Pudim, “ataca de DJ” nas horas vagas e adora ganhar discos de vinil de presente.