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Crítica

Rashid

: "Movimento Rápido Dos Olhos"

Ano: 2022

Selo: Sony Music

Gênero: Hip-Hop, Rap, R&B

Para quem gosta de: Emicida e Rodrigo Ogi

Ouça: Linha de Frente e Jogo Sério

8.0
8.0

Rashid: “Movimento Rápido Dos Olhos”

Ano: 2022

Selo: Sony Music

Gênero: Hip-Hop, Rap, R&B

Para quem gosta de: Emicida e Rodrigo Ogi

Ouça: Linha de Frente e Jogo Sério

/ Por: Cleber Facchi 25/11/2022

O olhar para a cultura asiática sempre foi encarado como parte substancial no processo de criação de diferentes nomes do rap. Está na arquitetura criativa do Wu-Tang Clan, na estética de gigantes como Kanye West e Nicki Minaj, e na infinidade de citações a animes como Dragon Ball, Cowboy Bebop e Naruto. Nascido no final dos anos 1980 e criado na década de 1990, Michel Dias Costa, o Rashid, é apenas mais dos inúmeros espectadores que foram bombardeados por estímulos visuais e referências transmitidas pela Terra do Sol Nascente. Um permanente cruzamento de informações que abastece parte expressiva da obra do rapper, mas que alcança melhor resultado em Movimento Rápido Dos Olhos (2022, Sony Music).

Conceitualmente inspirado pelos mitos de samurais e a filosofia de Miyamoto Musashi, o disco pontuado por audiodramas dublados por Guilherme Briggs, Adriana Couto e Rodrigo Carneiro adapta para um futuro próximo a história de um espadachim que busca se reerguer contra um tirano nomeado “O Patriarca”. Entre paralelos com a história recente do Brasil governado por Jair Bolsonaro, Rashid detalha a construção de uma narrativa talvez previsível, íntima de outras tantas obras da cultura pop, como Os Sete Samurais (1956), de Akira Kurosawa, mas que sustenta na construção dos versos seu componente central.

E isso fica mais do que claro logo nos minutos iniciais da obra. Passada a introdutória Oráculo e o canto melancólico de Macedo Bellini, Deixai Toda Esperança arremessa o ouvinte dentro do trabalho e ainda aponta a direção seguida no restante do disco. “Realidade funesta, sequestra o sonho / Então segura a palestra, é meu testemunho / O seu olhar me contesta, já pressuponho / Minha paciência é modesta, não testa o punho“, dispara. É nesse misto de fúria e fino toque de contemplação, como um acumulo natural de mais de uma década de carreira, que o artista se articula criativamente do início ao fim do repertório.

Longe do conforto, Rashid busca tensionar os limites da própria obra. De fato, algumas das principais composições do disco são assumidas individualmente pelo artista. É o caso de Pílula Vermelha, Pílula Azul, faixa inaugurada em meio a trechos de Banditismo Por Uma Questão De Classe, música lançada por Chico Science & Nação Zumbi em Da Lama ao Caos (1994), mas que sustenta nos versos uma visão futurística e amarga sobre a vida nas periferias. Mesmo quando se volta para as próprias inquietações, como no debate sobre saúde mental, em Tem Dias Que, prevalece a potência das rimas e domínio criativo do rapper. “Ninguém tá todo o tempo pra cima, cem por cento / Imagina um terremoto e você no epicentro“, reflete.

Partindo desse intenso processo criativo, Rashid mais uma vez estreita relações com diferentes nomes da música brasileira. São artistas como Liniker, em Ver Em Cores, Curumin, na derradeira Ao Subir Das Letrinhas, e a dobradinha composta por BK e Marissol Mwaba, em Jogo Sério, uma das criações mais complexas do disco. Nada que prepare o ouvinte para o espetáculo que é Linha de Frente. Livre de possíveis distrações, a canção assumida em colaboração com Don L e Amiri valoriza o que há de melhor em Movimento Rápido Dos Olhos: as rimas. Pouco mais de cinco minutos em que o trio parte de conflitos pessoais, discute diferentes aspectos do movimento e crises existenciais de forma sempre provocativa.

Imaginativo e sóbrio durante toda sua execução, Movimento Rápido Dos Olhos traz de volta o equilíbrio e propósito que marca alguns dos principais trabalhos do artista paulistano em início de carreira, entre eles, o excelente Confundindo Sábios (2013). São canções que partem de um universo ficcional, por vezes consumidas por atravessamentos e diferentes interlúdios que prejudicam o andamento da obra, mas que em nenhum momento rompem com a realidade. Dessa forma, Rashid se permite brincar em estúdio com a própria identidade criativa, porém, preservando na construção dos versos a clareza da mensagem.

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Jornalista, criador do Música Instantânea e integrante do podcast Vamos Falar Sobre Música. Já passou por diferentes publicações de Editora Abril, foi editor de Cultura e Entretenimento no Huffington Post Brasil, colaborou com a Folha de S. Paulo e trabalhou com Brand Experience e Creative Copywriter em marcas como Itaú e QuintoAndar. Pai do Pudim, “ataca de DJ” nas horas vagas e adora ganhar discos de vinil de presente.

Jornalista, criador do Música Instantânea e integrante do podcast Vamos Falar Sobre Música. Já passou por diferentes publicações de Editora Abril, foi editor de Cultura e Entretenimento no Huffington Post Brasil, colaborou com a Folha de S. Paulo e trabalhou com Brand Experience e Creative Copywriter em marcas como Itaú e QuintoAndar. Pai do Pudim, “ataca de DJ” nas horas vagas e adora ganhar discos de vinil de presente.