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Crítica

Tagore

: "Maya"

Ano: 2021

Selo: Estelita

Gênero: Rock Psicodélico

Para quem gosta de: Maglore e Boogarins

Ouça: Capricorniana e Drama

7.8
7.8

Tagore: “Maya”

Ano: 2021

Selo: Estelita

Gênero: Rock Psicodélico

Para quem gosta de: Maglore e Boogarins

Ouça: Capricorniana e Drama

/ Por: Cleber Facchi 28/09/2021

Maya (2021, Estelita) é um disco sobre saudade. Do momento em que tem início, na autointitulado música de abertura (“Dá um trabalho danado fingir que eu não me importo / Fingir que eu não sou louco por você“), até alcançar a derradeira Espaço Tempo (“Foi-se o tempo sem você / Me dissolvo em solidão“), cada mínimo fragmento do terceiro e mais recente trabalho de estúdio de Tagore Suassuna gira em torno de romances fracassados, confissões intimistas e memórias de um passado ainda recente. É como se o cantor e compositor pernambucano mirasse o futuro, porém, ainda preso e sufocado pelo próprio passado.

Entretanto, diferente de outros trabalhos dotados de uma temática bastante similar, sempre contemplativos, densos, Tagore estabelece na própria melancolia o estímulo para um álbum marcado pelo dinamismo dos elementos. São movimentos rápidos de guitarras, sintetizadores destacados e a bateria que dita com eficiência o ritmo da obra. Parte desse resultado vem da interferência direta do produtor Pupillo Oliveira, ex-integrante da Nação Zumbi e artista que já colaborou com nomes como Céu, Gal Costa e Erasmo Carlos. Junto do multi-instrumentista João Cavalcanti, a tríade entrega ao público um registro em que cada composição serve de passagem para a música seguinte, capturando a atenção do ouvinte sem dificuldade.

E isso fica bastante evidente na dobradinha composta por Tatu e Areias de Jeri. São pouco mais de cinco minutos em que Suassuna vai de uma divertida homenagem a Tom Zé, no cacofônico jogo de palavras (“Ai, Tatu, tá tudo muito louco / Todo desmantelo é pouco“), ao uso de versos que costuram paisagens regionais, memórias e sentimentos de forma sempre detalhista. “Peguei-me confuso / Sem ter pra onde ir / Lhe procurei de São Paulo às areias de Jeri“, detalha o músico pernambucano, sempre em busca da mulher amada, como um personagem conceitual que surge em desaparece durante toda a execução da obra.

Exemplo disso acontece na divertida Capricorniana. Feita para grudar na cabeça do ouvinte, a faixa de essência radiofônica estabelece na temática astrológica uma representação das diferentes mulheres que marcaram a vida sentimental do eu lírico. “Se é de aquário é dura como um pé de cana / Se de libra, é curva como serpentina / Se o beijo é ferrão, é de escorpião / Se não diz que me ama é capricorniana“, brinca. Essa mesma fluidez e entrega, porém, partindo de um novo direcionamento criativo, acaba se refletindo minutos à frente, em Drama, parceria com Dinho Almeida, da Boogarins. “Tou começando a enlouquecer / Tou esquecendo de me amar / Meu coração vai endurecer / Ou me entortar“, confessa.

Mesmo quando desacelera, como na delicada Samba Coração, Tagore mantém firme o refinamento e evidente caráter sentimental da obra. São melodias, batidas e vozes que se revelam ao público em pequenas doses, sem pressa. Um misto de dor e doce acolhimento, conceito reforçado na construção dos versos. “Bobeira é tentar não cantar que te amo / Bobeira é tentar não pensar em você“, canta. A própria faixa de encerramento, com seus sintetizadores cósmicos, falsetes e ambientações etéreas, lembrando o Tame Impala em Currents (2015), transporta o ouvinte para um novo e delirante território criativo.

Ao final dessa jornada sentimental, lírica e instrumental, Tagore entrega uma obra essencialmente equilibrada. Ainda que parte expressiva dos arranjos e temas incorporados ao longo do disco preservem muito do material apresentado no antecessor Pineal (2016), sobrevive na poesia confessional do artista pernambucano um precioso componente de renovação. São momentos de maior vulnerabilidade, entrega e dor, estrutura que funciona como um registro particular das experiências vividas pelo compositor, mas que em nenhum momento deixa de dialogar com o ouvinte, seduzido durante toda a execução do álbum.

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Jornalista, criador do Música Instantânea e integrante do podcast Vamos Falar Sobre Música. Já passou por diferentes publicações de Editora Abril, foi editor de Cultura e Entretenimento no Huffington Post Brasil, colaborou com a Folha de S. Paulo e trabalhou com Brand Experience e Creative Copywriter em marcas como Itaú e QuintoAndar. Pai do Pudim, “ataca de DJ” nas horas vagas e adora ganhar discos de vinil de presente.

Jornalista, criador do Música Instantânea e integrante do podcast Vamos Falar Sobre Música. Já passou por diferentes publicações de Editora Abril, foi editor de Cultura e Entretenimento no Huffington Post Brasil, colaborou com a Folha de S. Paulo e trabalhou com Brand Experience e Creative Copywriter em marcas como Itaú e QuintoAndar. Pai do Pudim, “ataca de DJ” nas horas vagas e adora ganhar discos de vinil de presente.