10 discos de 1967

/ Por: Cleber Facchi 03/06/2013

10 discos de 1967

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Visitar o passado e encontrar as referências que abastecem a música atual, esta é a proposta da seção 10 Discos no Miojo Indie. A ideia é que os leitores do blog utilizem os comentários do post, indicando um ano específico, bem como alguns registros que gostariam de ter expostos ao final da seleção. A equipe e convidados do blog auxiliam na escolha dos trabalhos e textos para finalizar dez grandes lançamentos de cada ano. Não precisam ser apenas os melhores, mas registros obscuros ou que talvez acabaram de fora de listas do gênero. Com a segunda edição viajamos até 1967, diretamente para o “Verão do Amor”, resgatando 10 obras clássicas – da música nacional ou estrangeira – que ainda hoje servem como referência para grande parte dos novos artistas. Menção honrosa para Forever Changes do Love, I Never Loved A Man The Way I Love You de Aretha Franklin, Goodbye And Hello de Tim Buckley e a estreia de Caetano Veloso – que convenhamos, tem discos muito melhores. Desfrute da seleção e não esqueça de usar os comentários para escolher qual o próximo ano a ser listado na seção.

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Wave

Antonio Carlos Jobim
Wave (A&M)

Quando lançou Wave em Setembro de 1967, a bossa nova e as experiências jazzísticas que apresentaram o trabalho de Tom Jobim soavam desgastadas – pelo menos no Brasil. Longe da crescente Tropicália e habitante de um universo que destoava da real situação do país, o músico encontrou uma recepção muito maior nos Estados Unido. Talvez por isso a relação com o compositor e arranjador Claus Ogerman, as paisagens norte-americanas (bem expressas em Mojave) e todo um arsenal de referências externas façam com que a obra-prima do compositor flutue entre Nova York (onde foi gravado) e recordações do Rio de Janeiro. Ambientado dentro de um cenário marcado pela sutileza dos arranjos, Jobim passeia ao lado de 27 instrumentistas em uma obra pontuada pela saudade. Estão lá músicas como Triste, Look To The Sky, além da própria faixa-título, eternizada nas trilhas sonoras das novelas de Manoel Carlos, mas que corresponde com nostalgia toda a proposta do músico naquele instante.

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Safe As milk

Captain Beefheart & his Magic Band
Safe as Milk (Buddah)

Influência para artistas veteranos (Roxy Music e The Sex Pistols) ou mesmo bandas recentes (como Franz Ferdinand e Unknown Mortal Ochestra), Don Glen Vliet, o Captain Beefheart passou boa parte da carreira brincando com os experimentos e uma visão muito específica do rock. Ainda que a inventividade do músico esteja registrada com perfeição em Trout Mask Replica (1969), ao estrear em 1967 com Safe as Milk o artista deu formas a uma das obras mais criativas da música naquele instante. Mergulhado em ruídos, vocais ásperos e todo um jogo de referências ambientadas em um composto próprio, o músico e os parceiros da Magic Band passeiam pelos inventos nas 12 faixas que acomodam o primeiro disco. Acompanhado de um inspiradíssimo Ry Cooder (que posteriormente viria a colaborar com Eric Clapton e The Rolling Stones) e da dupla de produtores formada por Richard Perry e Bob Krasnow, Beefheart faz de cada faixa do álbum uma aproximação inevitável entre o Blues e a lisergia psicodélica que tomava conta da música naquele instante. .

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Jimi Hendrix

Jimi Hendrix
Are You Experienced (Track)

Bastaria ao desconhecido Johnny Allen Hendrix o lançamento de Are You Experienced para que diferentes gerações de artistas e ouvintes fossem influenciados por sua música. Obra de estreia do guitarrista Jimi Hendrix ao lado dos parceiros Mitch Mitchell e Noel Redding, o registro é um curioso e hipnótico exercício para as guitarras, que passeiam tanto pela agressividade de Foxy Lady, como o toque sensual da música negra em Red House. Tomado pela lisergia e ruídos, o disco se abre para aquilo que o guitarrista viria a aprimorar em 1968 com Electric Ladyland ou ao final do mesmo ano com a quase continuação Axis: Bold as Love. Originalmente lançado em duas diferentes versões – uma britânica e a outra estadunidense -, o álbum teve faixas como Purple Haze, Remember e Hey Joe dividida entre as diferentes versões, sendo que apenas na década de 1990, durante o relançamento do disco, tiveram suas presenças garantidas em ambas as edições.

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Leonard Cohen

Leonard Cohen
Songs of Leonard Cohen (Columbia)

Na contramão do que parecia abastecer a música em 1967, o canadense Leonard Cohen fez da bem sucedida estreia com Songs of Leonard Cohen, uma massa de sons acinzentados e naturalmente sombrios. Contrário aos inventos coloridos que tingiam com psicodelia a música daquele instante, o trabalho é a mais pura manifestação das melancolias e da poesia sóbria do cantor em um plano instrumental orquestrado pela sutileza dos elementos. Conduzido quase inteiramente pela presença intimista dos violões e arranjos de cordas compactos, o trabalho cresce por conta dos versos confessionais de Cohen. Catálogo doloroso que inclui clássicos como Suzzane, Winter Lady e So Long, Marianne, o registro apresenta em cada porção instrumental e lírica uma representação do que viria a guiar toda a carreira do compositor, na época com 33 anos e afundado em uma depressão que o acompanhava desde a infância.

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NIco

Nico
Chelsea Girl (Verve)

Mesmo depois de ter sido expulsa do The Velvet Underground – muito mais pelos desentendimentos entre Lou Reed e Andy Warhol do que pela própria atuação em si -, Nico manteve firme a relação com os integrantes da banda nova-iorquina. Melhor reflexo disso está na construção de Chelsea Girl, registro de estreia da artista germânica. Extensão natural daquilo que a cantora havia manifestado em faixas como Femme Fatale e I’ll Be Your Mirror, o álbum cresce em meio a versos soturnos, boa parte deles assinados por Reed e instrumentalmente regidos por John Cale. Extensão daquilo que a artista havia promovido um ano antes, no filme de mesmo nome dirigido por Warhol, o disco cresce em meio aos vocais particulares da cantora, revelando uma sutileza por vezes limitada no projeto anterior. Morada para músicas como These Days e Little Sister, o trabalho cresce em meio a experimentos calcados levemente no Baroque Pop, abrindo espaço para o que a artista viria a aprimorar em 1970 com Desertshore

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Pink Floyd

Pink Floyd
The Piper At The Gates Of Dawn (EMI)

Se o acaso tivesse impedido o Pink Floyd de alcançar The Dark Side of the Moon (1973), The Wall (1979) ou qualquer grande álbum assinado pela banda na década de 1970, a coesa relação do grupo com o trabalho de estreia, The Piper At The Gates Of Dawn, já seria o suficiente para eternizar as experiências do grupo com destaque. Único trabalho dos ingleses sob os comandos de Syd Barrett, o registro brinca com a psicodelia dentro de uma sonoridade própria, mágica. Alimentado por versos carregados de misticismo, passagens literárias (expressas logo no título), manifestações oníricas e uma abertura para um cenário descoberto apenas pela banda, o disco traz em cada uma das 10 faixas a manifestação do que parece uma imensa obra única, apenas dividida em pequenos atos. Enquanto a primeira metade do trabalho é expressa em meio ao uso de samples e paisagens sonoras tratadas de forma atmosférica, do meio para o final o disco revela sua porção mais comercial, porém, não menos delicada e inventiva.

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Roberto Carlos

Roberto Carlos
Roberto Carlos em Ritmo de Aventura (CBS)

A jovem guarda vivia seu ápice em 1967. Mesmo que a Tropicália lentamente ampliasse os próprios domínios, a representação de Roberto Carlos como grande nome da música pop naquele instante era clara e incontestável. Inspirado pela relação dos Beatles com o cinema, o músico viria a lançar em 1968 sua primeira obra cinematográfica: Roberto Carlos em Ritmo de Aventura. Com direção de Roberto Farias e uma clara nescessidade em transformar o músico em uma espécie de novo herói nacional, o filme trouxe na trilha-sonora seu principal atrativo. Lançado um ano antes, o registro incorpora na presença de Renato e Seus Blue Caps, além do tecladista Lafayette a base instrumental para que Roberto desfile com algumas de suas mais importantes composições. Seja no romantismo expresso de Como É Grande O Meu Amor Por Você ou na aceleração dançante de Quando e Por Isso Corro Demais, cada instante do registro reflete uma das fases mais criativas do cantor.

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The Doors

The Doors
The Doors (Elektra)

Exageradamente aclamado pela multidão de fãs que crescem ano após ano, a estreia do The Doors é ainda hoje um dos registros mais significativos e comercialmente acessíveis da década de 1960. Tendo na poesia de Jim Morrison seu principal sustento, o disco cresce em uma mistura bem trabalhada de rock, psicodelia, doses confortáveis de melacolia, álcool e, claro, os teclados frenéticos de Ray Manzarek. Acumulando clássicos como Twentieth Century Fox, Back Door Men, The End e a obra-prima Light My Fire, o álbum se resolve em uma proposta instrumental ascendente, tanto na maneira como Morrison despeja seus versos, como na forma em que a instrumentação é coerentemente esculpida. Gravado em seis dias e com produção assinada por Paul A. Rothchild, o disco se transformaria em um sucesso imediato, catapultando a carreira da iniciante banda e transformando o grupo em um dos mais queridos do rock norte-americano. Aproveitando do sucesso e a inspiração, no mesmo ano a banda ainda viria a lançar o bem sucedido Strange Days.

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The Beatles

The Beatles
Sgt. Pepper’s Lonely Hearts Club Band (Parlophone)

Desde o lançamento de Rubber Soul, em 1965, a maturidade era visível dentro do trabalho do The Beatles, cada vez mais distante do propósito excessivamente jovial apresentado em 1963 no debut Please Please Me. Com a chegada de Revolver (1966), as experiências lisérgicas do quarteto e uma necessidade natural em se reinventar, era apenas questão de tempo até que o grupo apresentasse algum registro de maior destaque, feito alcançado com louvor em junho de 1967, com o lançamento do icônico Sgt. Pepper’s Lonely Hearts Club Band. Da capa carregada de cores e referências ao propósito conceitual que se instala logo na abertura do disco, cada faixa do álbum não representa apenas uma transformação na carreira da banda, mas para a música de forma geral. Princípio para aquilo que o grupo e uma centena de outros artistas viriam a desenvolver, o registro se divide em instantes de plena descoberta instrumental (Lucy in the Sky with Diamonds) e poética (A Day in the Life), abastecendo um dos catálogos mais ricos de toda a história da música.

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The Velvet Underground

The Velvet Underground
The Velvet Underground & Nico (Verve)

Facilmente um dos registros mais influentes da história da música, a estreia do The Velvet Underground ainda hoje reverbera no trabalho de uma centena de novas bandas. Base para aquilo Joy Division, Television, The Strokes e tantos outros artistas trouxeram em suas próprias obras, o álbum faz do encontro entre a poesia de Lou Reed e a instrumentação experimental de John Cale um alimento para a construção de cada etapa do álbum. Enquanto Reed descreve passagens carregadas de erotismo (Venus In Furs) e abusos com as drogas (I’m Waiting for the Man e Heroin), além referências claras à cidade de Nova York, Cale vai de encontro aos ruídos e métricas instrumentais próprias, fazendo do registro um princípio para aquilo que a banda ou mesmo outros artistas viriam a aprimorar posteriormente. Conceitualmente orientado por Andy Warhol (que assina a peculiar capa do registro), o álbum traz na presença da cantora alemã Nico um complemento natural ao disco. Fracasso de venda e crítica na época de seu lançamento, o álbum levaria algumas décadas até ser redescoberto e definido com unanimidade como um dos registros mais importantes do século XX.

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Jornalista, criador do Música Instantânea e integrante do podcast Vamos Falar Sobre Música. Já passou por diferentes publicações de Editora Abril, foi editor de Cultura e Entretenimento no Huffington Post Brasil, colaborou com a Folha de S. Paulo e trabalhou com Brand Experience e Creative Copywriter em marcas como Itaú e QuintoAndar. Pai do Pudim, “ataca de DJ” nas horas vagas e adora ganhar discos de vinil de presente.

Jornalista, criador do Música Instantânea e integrante do podcast Vamos Falar Sobre Música. Já passou por diferentes publicações de Editora Abril, foi editor de Cultura e Entretenimento no Huffington Post Brasil, colaborou com a Folha de S. Paulo e trabalhou com Brand Experience e Creative Copywriter em marcas como Itaú e QuintoAndar. Pai do Pudim, “ataca de DJ” nas horas vagas e adora ganhar discos de vinil de presente.